sexta-feira, 5 de março de 2010

Trabalhador busca dano moral por atraso de salário

Empregados alegam na Justiça que sofreram transtornos emocionais com problemas financeiros

Adriana Aguiar, de São Paulo
05/03/2010

O ex-funcionário de uma empresa de engenharia agrícola, no Rio Grande do Sul, em 2006, ficou cinco meses sem receber o pagamento de seus salários. O atraso gerou uma série de transtornos para a sua vida financeira, como a inclusão de seu nome em cadastros de negativação de crédito e uma intimação da Justiça para dar explicações sobre o motivo do atraso no pagamento de pensão alimentícia. O trabalhador entrou na Justiça e conseguiu, por determinação do Regional do Trabalho (TRT) do Estado, uma indenização de R$ 5 mil por danos morais da empresa onde trabalhava. Em Santa Catarina, o ex-empregado de uma tecelagem também tentou ter reconhecido na Justiça o direito de receber danos morais pelos dois meses de atrasos salariais sofridos. O pedido foi justificado pelas dívidas contraídas no período em que ficou sem receber.

Duas situações parecidas, mas que resultaram em entendimentos diferentes na Justiça do Trabalho. No primeiro caso, julgado pelo Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região, a Corte considerou que o trabalhador sofreu um abalo emocional inquestionável em razão das dificuldades financeiras. Já o TRT da 12ª Região, de Santa Catarina, não atendeu o pedido do trabalhador. Para a Corte, ele não teria sofrido danos em razão dos transtornos financeiros. Desde que passou a julgar processos que envolvem indenizações por danos morais, a partir de 2005, a Justiça do Trabalho não chegou a um consenso sobre o tema. Nos TRTs, há ainda muita divergência sobre a discussão. Já no Tribunal Superior do Trabalho (TST), nos três casos já divulgados pela corte, as indenizações foram negadas.

Ainda que a indenização por dano moral obedeça a critérios subjetivos, que variam de acordo com a avaliação de cada juiz do sofrimento e da situação particular enfrentada pelo autor da ação, o advogado André Brito, responsável pela área trabalhista do Junqueira de Carvalho, Murgel & Brito Advogados e Consultores, acredita que já exista uma corrente majoritária na Justiça trabalhista em favor dos trabalhadores. Segundo ele, quando se trata de indenização por atrasos reiterados de salários, a maioria tem entendido que só cabe indenização se houver comprovação do dano sofrido. E apenas para uma minoria bastaria a simples ocorrência do atraso salarial para configurar o dano moral.

Dos quatro casos encontrados pelo advogado no TRT de Minas Gerais, três rejeitaram o pedido de indenização. Em dois deles, os juízes entenderam que o simples atraso do salário não seria motivo para gerar indenização. Em outro, que não haveria relação direta da dívida do trabalhador com a inscrição na Serasa. Isso porque o valor inscrito era muito superior ao salário atrasado. No único caso aceito pelo TRT-MG, o tribunal considerou que o atraso salarial foi o causador da inscrição no nome do trabalhador no serviço de proteção ao crédito.

Já no TRT paulista, há diversos ações pelas quais os trabalhadores obtiveram indenização apenas pelo abalo sofrido com o atraso salarial. Em uma decisão recente da 12ª Turma, os magistrados entenderam que "não há dúvidas sobre a angustia do trabalhador que ficou impossibilitado, por culpa de outrem, a quitar a tempo os seus compromissos financeiros", sem que houvesse a menção sobre uma comprovação direta dos prejuízos causados ao trabalhador. Para a advogada Daniela Beteto , do Trevisioli Advogados Associados, que atua em São Paulo, não seria necessária uma prova direta do dano para se obter a indenização. "O dano moral vai muito além de uma prova concreta. Ele está intimamente ligado com o abalo moral sofrido pelo trabalhador", afirma.

O juiz trabalhista Rogério Neiva, que atua em Brasília, discorda dessa tese. Ele afirma que é necessário distinguir as obrigações contratuais entre empregados e trabalhadores, das obrigações civis. Como o salário seria uma obrigação contratual, Neiva acredita que isso só poderia gerar um dano moral na esfera civil se houver a prova direta de algum dano. " O atraso no salário por si só não caracteriza dano moral". Neiva já decidiu sobre o tema ao tratar de ações movidas por empregados de terceirizadas que faliram diante da crise financeira de 2009. Nos casos analisados, ele não concedeu a indenização, já que não houve a comprovação do dano sofrido. " Essas empresas não tinham outro meio para buscar esse dinheiro e fazer os pagamentos", afirma.

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