terça-feira, 30 de março de 2010

Empregados são demitidos e processados por uso indevido de blogs e redes sociais

Mau uso da internet gera ação judicial

Laura Ignacio, de São Paulo
30/03/2010

Um empregado de uma empresa do setor financeiro criou um blog. E, desavisado, colocou informações sobre o balanço da companhia que, recentemente, havia aberto seu capital. O problema é que os dados eram diferentes dos enviados à Comissão de Valores Mobiliários (CVM). A empresa recebeu uma advertência formal do órgão fiscalizador e demitiu por justa causa o profissional. Cada vez mais as empresas têm enfrentado problemas devido ao mau uso da internet por seus funcionários. Muitos casos envolvem o MSN e redes sociais - Facebook, Twitter, Orkut e You Tube - e acabam gerando ações na Justiça.

Nos processos, as companhias buscam indenizações de seus ex-funcionários ou de concorrentes que a teriam prejudicado por meio da internet. O crescente volume de casos têm movimentado os escritórios especializados em direito digital. "Estamos indicando às empresas, principalmente aquelas com capital aberto, que atualizem seus códigos de ética em relação aos ambientes digitais", diz a advogada Patricia Peck, do escritório Patricia Peck Pinheiro Advogados, que ressalta o risco que muitas companhias de capital aberto estão correndo com a manutenção de páginas no Twitter para comunicação entre investidores e diretores "O risco é enorme."

Em alguns casos, a internet acaba servindo de prova para a demissão por justa causa. Em um deles, o funcionário descreveu em sua página no Orkut que estava furtando notas fiscais da empresa onde trabalhava, vangloriando-se do feito. Em ação trabalhista, ele não só pediu reintegração ao emprego, como indenização por danos morais. A decisão do Tribunal Regional do Trabalho (TRT) da 15ª Região, com relatoria da desembargadora Edna Pedroso Romanini, rejeitou ambos os pedidos. Em outro caso, um funcionário foi demitido por justa causa após ser flagrado, em vídeo postado no You Tube, dando cavalo de pau com a empilhadeira da empresa têxtil onde trabalhava. A partir do vídeo, a juíza Elizabeth Priscila Satake Sato, da 1ª Vara do Trabalho de Piracicaba, em São Paulo, negou o pedido de reintegração ao emprego. A magistrada considerou que o ex-funcionário usou a máquina de forma indevida durante o horário de trabalho.

Geralmente, as empresas se contentam com a demissão por justa causa do funcionário imprudente, segundo Peck. Com exemplo, ela cita um caso patrocinado por seu escritório envolvendo um profissional de uma empresa de call center. Ele criou um blog em que, encerrado o expediente, publicava as perguntas consideradas por ele mais idiotas dos "clientes mais burros do dia" e os colegas votavam nas melhores da semana e do mês. Após reclamação feita por uma das empresas clientes do call center, o blogueiro foi demitido por justa causa. "Geralmente, pedidos de indenização só envolvem profissionais de alto escalão, como conselheiros, diretores e executivos", afirma Peck. Esses profissionais, segundo ela, se sentem impunes e acabam prejudicando a imagem das companhias. "É como se as informações publicadas fossem do executivo e não da empresa."

A advogada diz que essas situações ficaram mais comuns a partir do ano passado, quando ocorreram muitas demissões com o crescimento no número de fusões - o que coincidiu com a época do lançamento do Twitter. Um dos casos envolve um pedido de indenização de uma pizzaria americana a dois ex-funcionários que disponibilizaram no You Tube as supostas más condições de higiene na empresa. A ação tramita na Justiça americana.

Os casos de concorrência desleal também levam ao pedido de indenização, segundo o advogado Rony Vainzof, do escritório Opice Blum Advogados. Recentemente, uma empresa acionou a concorrente porque um ex-funcionário levou com ele contatos que conquistou no antigo emprego e o manteve na sua lista do MSN. A ação ainda tramita na Justiça. Em outro caso, a 10ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) condenou ex-funcionários que usaram o Google para roubar clientes da companhia onde trabalharam. Eles cadastraram o nome da empresa no Google. Assim, sempre que algum usuário do Google procurava pelo nome da companhia, aparecia o link da concorrente, onde foram trabalhar. "Ainda cabe recurso. Mas, com isso, eles foram condenados, em segunda instância, a pagar multa à antiga empresa", diz o advogado.

O prejuízo das empresas com o mau uso da internet pode, inclusive, ser dimensionado. Uma empresa com 50 funcionários que utilizem a internet para resolver problemas pessoais como pagar contas e bater papo com amigos pelo período de uma hora por dia, pode sofrer um prejuízo de quase R$ 35 mil por mês em termos de produtividade dos empregados. "Claro que essa uma hora na internet geralmente é fracionada de 15 em 15 minutos, por exemplo", afirma o perito digital Wanderson Castilho.

O cálculo dele, levando em consideração um salário mensal médio de R$ 1.250, foi realizado a partir de um programa disponível no site www.brc.com.br. Por meio da ferramenta, as empresas podem calcular qual é o prejuízo causado pelo mau uso da internet por seus funcionários. Castilho usa o programa nos processos relacionados às redes sociais. "Com ela, o empregador pode deixar claro a relação direta entre a produtividade e o mau uso da internet porque o empregado não é dono do tempo dele quando está na empresa", afirma.

Cresce número de processos contra empresas de auditoria

Jane Croft, Financial Times
30/03/2010

O número de ações ajuizadas no Reino Unido contra auditorias, por negligência profissional, superou em 2009 o total alcançado nos cinco anos anteriores. Pesquisa realizada pelo escritório de advocacia Reynolds Porter Chamberlain (RPC) mostra que 13 ações foram apresentadas na Suprema Corte, no ano passado. Entre 2004 e 2007, apenas quatro processos foram abertos.

Advogados estavam prevendo uma enorme onda de processos judiciais decorrentes da crise econômica. "A pesquisa mostra que as ações judiciais relativas à crise no crédito começaram a chegar aos tribunais", diz Jane Howard, sócia do escritório. "Ocorreram algumas fraudes de grande repercussão nesse período de recessão, como o esquema de pirâmide financeira de Bernard Madoff. Contadores que trabalharam nesses casos enfrentam processos na Justiça. Mas aconteceram também fraudes de menor escala, que estão gerando ações por negligência contra contadores."

Grandes empresas de auditoria já esperavam ser processadas, à medida que investidores saem em busca de bodes expiatórios que possam incriminar pela onda de falências de bancos e de fraudes em investimentos internacionais - como o esquema de pirâmide de Madoff. Os processos levam em consideração o custo total da falência de uma companhia, independente do tamanho da participação da empresa de auditoria no caso.

No ano passado, a Câmara dos Lordes decidiu limitar a responsabilidade das auditorias nos casos de fraude. Ela negou provimento a uma ação apresentada contra a Moore Stephens, auditoria do centro financeiro de Londres, por supostamente não ter conseguido detectar uma fraude gigantesca na Stone & Rolls, uma empresa comercial que faliu no fim da década de 1990.

O número de ações levadas à Corte Suprema no ano passado, porém, ainda está abaixo dos 37 processos ajuizados contra firmas de auditoria em 2002, em meio ao efeito colateral adverso provocado por escândalos financeiros, como as falências da Enron e da WorldCom.

"Mesmo com o aumento do ano passado, o número de demandas que tramitam na Justiça ainda é consideravelmente menor do que o verificado após o estouro da bolha das pontocom", disse Jane Howard. Para a advogada, ficou difícil afirmar, no entanto, se o volume de ações judiciais contra auditores vai continuar crescendo nos próximos anos.

Conselho analisa recurso apresentado fora do prazo

Luiza de Carvalho, de Brasília
30/03/2010

Os contribuintes conquistaram um importante precedente no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), última instância administrativa para discussão de autuações ficais federais. A 2ª Turma da 3ª Seção do conselho analisou um recurso intempestivo - ajuizado fora do prazo - e cancelou parte de um auto de infração.

Os conselheiros entenderam que, apesar de o recurso ser intempestivo, o órgão administrativo não poderia deixar de analisar o caso e aplicar a Súmula Vinculante nº 8 do Supremo Tribunal Federal (STF), que declarou a inconstitucionalidade dos artigos 45 e 46 da Lei nº 8.212, de 1991, e do parágrafo único do artigo 5º do Decreto-Lei nº 1.569, de 1977 - reduzindo os prazos de prescrição e decadência das contribuições previdenciárias de dez para cinco anos.

O caso gerou um debate de quase duas horas no Carf. No auto de infração, referente ao débito de PIS, da Cofins e contribuições previdenciárias, a Receita Federal buscava o pagamento referente aos últimos dez anos. Parte dos conselheiros defendia que o recurso estaria fora do prazo e que não deveria ser analisado. Outra parte argumentava que o Carf não poderia negar a vigência ou contrariar o cumprimento de súmulas do Supremo, como dispõe o artigo 103-A da Constituição Federal.

O impasse foi resolvido com uma solução favorável ao contribuinte. Apesar de a turma não conhecer o recurso - por estar fora do prazo -, a maioria dos conselheiros votou também por anular metade do auto de infração do Fisco, levando em consideração a Súmula nº 8 do Supremo. Na avaliação da advogada Adriene Miranda, do escritório Advocacia Adriene Miranda & Associados, o precedente é importante e mostrou um Carf mais flexível para o contribuinte. "Os conselheiros foram além do mero costume de não conhecer um recurso intempestivo", afirma a advogada.

Cetelem lucra após encolher carteira

Financeira reverte prejuízo de 2008 e nega venda de fatia do capital no Brasil

Adriana Cotias, de São Paulo
30/03/2010
Davilym Dourado/Valor

Depois de fechar 2008 com um prejuízo de R$ 33,8 milhões, a Cetelem Brasil voltou ao azul em 2009, com um lucro líquido de R$ 3,4 milhões. Num período em que a carteira de crédito encolheu em R$ 480 milhões, para R$ 3,5 bilhões, foi a melhora na originação das operações e o foco em linhas com margens mais interessantes que permitiram a virada, segundo o diretor financeiro, Franck Vignard-Rosez. O resultado operacional chegou a R$ 15,2 milhões, em comparação ao R$ 65 milhões negativos do exercício anterior.

Ao ter completado dez anos de atividade no mercado brasileiro, o braço de financiamento ao consumo do grupo francês BNP Paribas no Brasil tem como meta fechar 2010 com uma carteira de mais de R$ 6 bilhões. Os números já consideram as operações do Banco BGN - com um portfólio de R$ 1,6 bilhão ao fim de 2009 -, instituição especializada em crédito consignado comprada em 2008. De acordo com o diretor geral da Cetelem Brasil, Marcos Etchegoyen, a financeira não cogita se desfazer de parcela do capital no país, conforme noticiado pelo Valor em meados de março, e adianta que duas novas parcerias com o varejo devem ser anunciadas nas próximas semanas. "A carteira está crescendo, a ideia não é diminuir a exposição no Brasil, só neste primeiro trimestre a expansão chega a 31%", afirma. "Estamos criando envergadura para a maratona dos próximos dez anos."

Em 2009, a financeira reduziu o tamanho dos seus ativos na maioria das linhas, como empréstimo pessoal, cartões e crediário ou mesmo a aquisição de carteiras de terceiros. Zerou completamente a destinação ao "middle market", de capital de giro a pequenas e médias empresas, segmentação considerada fora do "core", aumentando, porém, o financiamento de faturas de cartões.

"Em vez de ofertar muito sem juros ou deixar o cliente no rotativo, vendemos o parcelamento a taxas mais competitivas, reequilibramos o portfólio em produtos intermediários, com bom 'spread' (a diferença entre a taxa de captação e o custo cobrado nos empréstimos), o que permitiu que a margem financeira aumentasse", diz Vignard-Rosez. Nesse trabalho de cruzamento de vendas, a eficiência da operação aumentou, com 2,07 produtos por cliente, em comparação à média de 1,6 produto em 2008, afirma. As provisões para créditos de difícil liquidação foram reduzidas em R$ 33,2 milhões entre um exercício e outro, para R$ 167,1 milhões.

A conversão dos "private label" em cartões híbridos foi outra frente que a Cetelem avançou no ano passado. Com 3,3 milhões de plásticos emitidos com o selo Aura, a financeira migrou 450 mil unidades para a bandeira MasterCard em varejistas parceiros como Submarino, Telha Norte e Armarinhos Fernando. Em maio vai começar a trabalhar na base de clientes da Fnac. "Assim qualificamos a concessão de crédito e a também aquisição de clientes porque temos mais a oferecer", diz Etchegoyen. Como a maioria dos modelos híbridos, no lojista que empresta o nome ao plástico o limite de crédito é maior, preservando a relação de fidelidade original. A partir de 2011, a intenção da Cetelem é também passar a emitir Visa.

Laser Eletro e Eletroshopping vão às compras

Murillo Camarotto, do Recife
30/03/2010

O processo de consolidação do varejo de móveis e eletrodomésticos, que já limitou sensivelmente o número de concorrentes no Centro-Sul do país, começa a se tornar realidade também na região Nordeste, onde estão as vendas no varejo crescem acima da média nacional. Além da baiana Insinuante, que se uniu à mineira Ricardo Eletro, outras redes nordestinas estão se mexendo para sobreviver a um mercado de competidores cada vez maiores e mais agressivos.

A pernambucana Laser Eletro fechou na semana passada a aquisição das 59 lojas da rede Armazém Nordestino, com sede no Piauí, por valores não divulgados. Com o negócio, a Laser estendeu sua atuação aos Estados do Piauí e do Maranhão, passando a atender toda a região Nordeste. O número de lojas passou de 87 para 146.

"Estamos nos movimentando para fazer frente a essa forte tendência de fusões", informou o gerente de Compras da empresa, Marcelo Branco Coutinho.

Na mesma direção, a também pernambucana Eletroshopping sacramentou há poucos dias a compra de 31 lojas da concorrente Hermol, que estava em recuperação judicial.

Principal concorrente da Insinuante em Pernambuco, a Eletroshopping passou a contar com 140 lojas, espalhadas em seis Estados do Nordeste.

Segundo Coutinho, gerente de Compras da Laser Eletro, o empresariado do setor trabalha e se planeja considerando a possibilidade de que outros grandes negócios possam ser fechados no médio prazo, como, por exemplo, uma eventual compra da operação brasileira do Carrefour pelo Walmart - operação já negada pela rede francesa. "Imagino que não pare por aí", afirmou Coutinho, ao ser questionado sobre a fusão entre Insinuante e Ricardo Eletro.

Segundo o diretor-comercial da Eletroshopping, Cristiano Vilar, outras oportunidades de aquisições estão sendo avaliadas na região, onde devem ser abertas pelo menos 19 novas lojas até o fim deste ano, além das que foram adquiridas da Hermol.

Para Vilar, a fusão entre Insinuante e Ricardo Eletro é uma forma de enfrentar a provável "invasão" da Casas Bahia no mercado nordestino. Esta varejista paulista, que faz parte do grupo Pão de Açúcar há quase quatro meses, estimava em junho de 2009 que chegaria a 49 lojas na Bahia no primeiro semestre de 2010.

Apesar de inevitável, o processo de consolidação irá se deparar com empresas locais tradicionais e bem capitalizadas, dizem alguns fornecedores. Estes alegam que não são poucas as redes com cerca de 50 lojas que ainda têm fôlego de sobra para continuar crescendo.

"Os últimos anos foram muito bons para os empresários daqui. Se precisar, saem comprando (concorrentes)", disse ontem uma fonte de uma grande marca de eletrodomésticos.

Além das estratégias de defesa, as redes baseadas no Nordeste têm em comum a preocupação com o poder de barganha de uma Insinuante fortalecida. "Nosso maior receio é com as negociações privilegiadas que eles podem ter com os fornecedores, o que resultará em preços e condições diferenciados", disse Marcos Antonio de Souza, diretor da Credimóveis Novolar, rede pernambucana com 39 lojas.

No que depender dos fornecedores, entretanto, essa equação não será tão simples. "As grandes redes já contam com condições bastante favoráveis. Em muitos casos, não cabe mais queda de preços, porque senão fica inviável pra nós. Também vamos nos mobilizar, por meio das nossas entidades representativas para conseguirmos a melhor condição possível", disse um fornecedor.

Ricardo Eletro e Insinuante se juntam

Vice-líder, Máquina de Vendas estuda aquisições

Daniele Madureira, de São Paulo
30/03/2010

O mineiro Ricardo Nunes está em um ritmo mais acelerado que o de costume. Depois de virar a madrugada de sexta para sábado fechando a fusão da rede Ricardo Eletro com a concorrente baiana Insinuante, de Luiz Carlos Batista; juntar as famílias Batista e Nunes para um jantar no domingo em São Paulo, onde anunciou, na segunda-feira, o novo negócio; ele corre para se reunir com as equipes de compras das duas redes.

Viajou ontem mesmo para Minas Gerais como presidente da nova Máquina de Vendas, a holding que passa a reunir as operações de Ricardo Eletro e Insinuante. Batista, agora presidente do conselho da companhia, e o irmão, Rodrigo Nunes, que assume o posto de vice-presidente administrativo da Máquina, viajaram com ele.

A empresa nasce como a segunda maior rede de varejo de eletrodomésticos e móveis do país, só perdendo para o grupo Pão de Açúcar, dono da Ponto Frio e das Casas Bahia. A Máquina é dona de vendas anuais de mais de R$ 4 bilhões, tem 15 mil funcionários e 528 lojas em 16 Estados e no Distrito Federal. Fatura R$ 1,2 milhão ao dia no comércio eletrônico e nenhum tempo a perder. "A meta é reorganizar toda a equipe de compras até quarta-feira (dia 31), não sou a favor desse pessoal que passa dois, três meses pensando em estratégia", diz Nunes, um ex-vendedor ambulante de mexericas e apaixonado por marketing.

A holding planeja dobrar de tamanho até 2014, quando pretende somar 1 mil lojas e 30 mil funcionários, parte disso com aquisições de redes pequenas e médias. O avanço seria bancado pela geração de caixa da companhia, que nasce com endividamento zero, e pela possibilidade de transformar ativos financeiros em caixa, com os contratos a serem renovados com as financeiras. "Estimamos que o acordo com as financeiras gire entre R$ 400 milhões e R$ 500 milhões. Agora, com a fusão, temos maior poder de barganha", diz Nunes, que mantém acordo com a HSBC Losango. "Com esse capital, já poderíamos abrir mais 30 lojas".

Se atingir a sua meta em quatro anos, a participação da Máquina de Vendas no varejo nacional de móveis, eletroeletrônicos e eletrodomésticos, que hoje é de 8%, passaria a ser então de 15%. Mas ainda se manteria distante do líder Pão de Açúcar-Casas Bahia, dona atualmente de 30% do mercado.

A grande força da Máquina de Vendas é a sua presença na região Nordeste do país, onde a agora terceira colocada no ranking, a Magazine Luiza, não está presente.

Só na Bahia, a Insinuante é dona de 70 lojas e, a Ricardo Eletro, de 60. Para se ter uma ideia da força do consumo de eletrodomésticos na região, por exemplo, entre março de 2009 e fevereiro de 2010, enquanto a venda de linha branca no país cresceu 26,5% em volume, no Nordeste disparou 77%, em relação a igual período anterior, segundo levantamento da Nielsen para o Valor .

O Nordeste e, em especial, a Bahia, é tão importante para a nova empresa, que esta praça será a única a manter as duas bandeiras. Ficou decidido que a Máquina de Vendas vai dividir o Brasil em duas partes, cada uma com uma bandeira: Norte e Nordeste ficam com Insinuante, enquanto Centro-Oeste, Sudeste e Sul são da Ricardo Eletro. As lojas de uma que estiverem no território da outra trocarão de nome. A exceção fica por conta da Bahia, onde Nunes desembarcou há cinco anos e já investiu muito em marketing.

"Mas podemos valorizar as promoções de móveis na Insinuante, por exemplo, que tem uma variedade maior que a nossa nessa categoria, enquanto chamamos mais a atenção para o mix de eletroeletrônicos ou de eletrodomésticos da Ricardo no Estado", diz Nunes, que vai se dedicar pessoalmente a uma maratona de visitas às lojas da Insinuante no Nordeste, ao lado do irmão Rodrigo, para injetar novo ânimo aos vendedores.

"Adoro vendas e essa será a minha especialidade", disse ontem o empresário de 40 anos, que não pensa duas vezes em ficar do lado de trás do balcão.

Dono de um estilo agressivo, Nunes chega a concorrer consigo mesmo. Abriu quatro lojas na rua Curitiba, na região central da capital mineira, praticamente vizinhas: nos números 618, 631, 723 e 760. Em Goiânia, a mesma estratégia: quatro lojas na avenida Anhanguera, uma perto da outra - sem espaço para a concorrência.

Pouco mais velho que Nunes - e aparentando um perfil bem menos acelerado -, Batista, de 45 anos, vai se dedicar à estratégia de expansão da empresa. Para começar, serão R$ 50 milhões investidos este ano para aumentar em 43% o número de pontos da rede Ricardo Eletro no Rio de Janeiro, chegando a 100 lojas, para fazer frente ao Ponto Frio, que tem maior força no mercado fluminense. Também planeja a abertura de mais dois centros de distribuição no Nordeste - em Recife (PE) e em Fortaleza (CE), para se unir ao único CD existente, em Salvador (BA) - e assim atingir a meta de entregar na região em até 24 horas. "Parte do capital poderá servir ainda como expansão de lojas em outras praças", diz Batista, lembrando que a holding planeja comprar redes menores.

As duas empresas decidiram unir-se há três meses, por iniciativa de Nunes, como reação ao gigante do varejo de eletroeletrônicos, eletrodomésticos e móveis criado com a união de Pão de Açúcar e Casas Bahia. Desde então, as negociações não pararam, tendo como base um flat na região dos Jardins, bairro nobre da capital paulista.

Nunes está convicto de que o grande diferencial da nova rede será o poder de barganha com fornecedores. "Vamos redefinir a função da nossa equipe [de compras] de 12 pessoas, para que cada uma se torne muito mais focada em categorias de produtos", diz ele. Sendo assim, se havia duas ou três pessoas para comprar produtos de tecnologia, por exemplo, agora a Máquina terá uma só pessoa para computadores, outra para celulares, outra para acessórios de informática e assim por diante. Por outro lado, áreas como recursos humanos continuarão descentralizadas. As sinergias geradas em propaganda, compras e logística devem gerar uma economia equivalente a 3% do faturamento, ou R$ 150 milhões ao ano.

Outra força da nova empresa está no varejo on-line, que oferece mais de 20 mil itens e tem vendas diárias de R$ 1 milhão (só a Ricardo Eletro). "Vender na internet é uma maravilha, posso oferecer o que eu quiser", diz Nunes que, nas lojas físicas, conta com um mix de cinco mil produtos. No on-line, por sua vez, vende até cadeira de rodas.(Com César Felicio, de Belo Horizonte, e Vanessa Dezem, de São Paulo).

segunda-feira, 29 de março de 2010

Novas oportunidades em logística

Crescimento do setor aquece procura por profissionais especializados.

Por Jacilio Saraiva, para o Valor, de São Paulo
29/03/2010

Silvia Costanti/Valor

Nem mesmo a recente crise internacional foi capaz de frear o crescimento da demanda por profissionais na área de logística nos últimos anos. O perfil de quem atua na área, no entanto, mudou. Até pouco tempo, os maiores cargos ocupados por executivos do setor estavam limitados à gerência. Agora, o mercado já aloca especialistas em funções de direção ou nas cadeiras de vice-presidente ou presidente. "Em momentos de crise, as empresas saem em busca de novas soluções para reduzir custos, exigindo todo o conhecimento de especialistas nesse setor", garante Maurício Lima, diretor da área de capacitação do Instituto Ilos, que atua na área de geração de conhecimento e soluções em logística.

A prova desse bom momento para os profissionais é que quatro grandes empresas ouvidas pela reportagem oferecem vagas em mais de 10 cidades, além de colocações nos Estados Unidos, México e Argentina. "Por ser uma carreira relativamente nova, ainda há um grande potencial de crescimento", analisa Lima. Há oportunidades de trabalho para recém-formados, que ocupam cargos de analista e participam de atividades de planejamento, além de gerentes e diretores.

Para o especialista, a tendência é um reflexo do aumento da importância da logística nas empresas, observado desde o início da década de 1990, quando a eficiência operacional passou a ser decisiva na indústria e no varejo - até então, o estoque era considerado uma reserva de valor e alvo de especulação. "Hoje, o excesso de armazenamento é visto como uma ineficiência. Ao trabalhar com um baixo nível de estoque, a empresa fica mais suscetível a erros e exige uma rotina de alta confiabilidade, o que demanda uma logística muito mais complexa e sofisticada", afirma.

O Valor teve acesso a uma pesquisa inédita realizada pelo Ilos com 104 profissionais de logística no Brasil. O estudo revela que as mulheres estão ganhando mais espaço em um mercado tradicionalmente masculino e que experiências internacionais pesam na hora da promoção. Entre os gerentes, 46% dos profissionais recebem entre R$ 50 mil e R$ 150 mil, e 42% deles ganham entre R$ 150 mil e R$ 300 mil por ano. Nos cargos de presidente e diretor, 57% dos executivos abrem holerites que passam dos R$ 300 mil anuais.

Mas na hora de reivindicar melhores salários, a experiência internacional do profissional de logística parece ser decisiva. O estudo mostra que 56% dos empregados que ganham acima de R$ 300 mil por ano já trabalharam ou estudaram fora do país. São eles que, geralmente, estão em cargos mais elevados, como presidente ou diretor. O Ilos também observou que, nos últimos dois anos, as executivas ganharam mais posições e melhores salários em um segmento dominado pelos homens. Em 2008, 66% das mulheres ocupavam funções de analista. Já em 2009, 48% delas aparecem em postos mais graduados, como gerente (38%), presidente ou diretor (10%). A mudança também respingou nos salários. No ano passado, 59% das profissionais passaram a receber entre R$ 50 mil e R$ 150 mil anuais - em 2008, apenas 40% delas ocupavam essa faixa.

Coordenadora do departamento de transporte da Aliança Navegação e Logística em Santos (SP), a executiva Juliana Latorraca entrou na empresa como estagiária, em abril de 2005. "Fui contratada oito meses depois, quando terminei a graduação", lembra. Juliana é engenheira de produção mecânica e fez um MBA em gestão empresarial, com ênfase em logística, na Fundação Getúlio Vargas (FGV). Hoje, é responsável pelo departamento de multimodal da Aliança, que gerencia o transporte terrestre de contêineres depois da chegada ao porto. "A atividade exige a contratação, monitoramento e controle de serviços de transporte rodoviário, ferroviário, terminais de contêineres, além de fornecedores de serviços e de mão de obra para a movimentação das cargas."

Juliana já coordenou operações delicadas, como o transporte de plasma sanguíneo em contêineres com temperatura controlada, e o atendimento a uma grande empresa de eletroeletrônicos que incluiu a contratação de veículos com dispositivos de segurança, disponibilidade de equipes 24 horas por dia e informações em tempo real para o cliente. Para ela, o segredo da profissão é atender a exigência do contratante no menor prazo e com o menor custo. "Além de raciocínio lógico, o profissional deve ser dinâmico, tomar decisões rapidamente e sob pressão."

A atualização também é um forte requisito para se manter no cargo. Além do MBA, a engenheira fez curso de inglês no Brasil e nos Estados Unidos e participa de treinamentos internos na companhia. Em 2010, pretende se inscrever em uma especialização em finanças, controladoria e gerenciamento de processos. Segundo a pesquisa, 96% dos profissionais da área afirmaram ter investido na própria capacitação durante o ano. As aulas de logística integrada, custos logísticos e de cadeias de suprimentos foram as mais procuradas pelos profissionais. Nos próximos anos, por conta de necessidades do mercado, os treinamentos mais comuns devem ser de logística tributária e planejamento de redes logísticas.

Segundo Hugo Yoshizaki, coordenador da Fundação Vanzolini e do curso de pós-graduação em logística empresarial da Universidade de São Paulo (USP), a maioria dos alunos dos cursos de especialização tem formação em engenharia e administração de empresas e idades entre 25 e 35 anos. O curso de pós-graduação em logística empresarial da Fundação Vanzolini, oferecido em convênio com a USP, foi lançado em 2005 e já formou sete turmas, com quase 200 alunos. "São oferecidas duas turmas por ano com 35 vagas cada uma. A procura oscila entre 3 e 4 candidatos por vaga", diz. Em maio, a fundação lança um novo curso, de capacitação em gestão de operações logísticas para profissionais com ou sem experiência na área.

Para Maurício Lima, além de conhecimento técnico, o profissional também deve ter grande habilidade analítica. "O custo dessa atividade para as empresas é alto e representa mais de 8% da receita líquida das companhias no Brasil." Segundo o diretor do Ilos, a maioria dos profissionais do mercado é formada em engenharia e administração e direciona a formação acadêmica para logística durante a pós-graduação. Nas empresas do setor, o profissional tem de conhecer operações de comércio exterior e dominar o idioma inglês. "Além do lado técnico, é preciso saber lidar com o inesperado. O transporte internacional marítimo, aéreo e terrestre envolve alfândegas, documentação e conformidades legais, e exige a gestão de um profissional que não seja acomodado", diz Fábio Bermúdez, diretor de logística internacional da Tito Global Trade Services, especializada em logística e gestão aduaneira.

A companhia tem 400 funcionários, escritórios em 11 cidades brasileiras e unidades em três países. Para selecionar candidatos, Bermúdez recebe indicações, vai às universidades e usa recrutadores profissionais. No ano passado, a empresa, dona de um faturamento de US$ 24,4 milhões, contratou 75 pessoas. "Três foram para cargos de gerência", diz. Em 2010, espera-se um crescimento de 24% nos negócios e a criação de 50 posições para as áreas de gestão e operação de projetos. As vagas abertas estarão em Porto Alegre (RS), São Caetano do Sul e São Paulo (SP), além de Buenos Aires, Cidade do México e Miami. A empresa também vai investir US$ 600 mil no fortalecimento de equipes comerciais - quer criar times de vendas locais em todos os países de atuação.

Na Brasilmaxi, com 370 funcionários e unidades em seis cidades, a previsão é contratar 50 profissionais para cargos operacionais, técnicos e de supervisão. "Eles devem atuar na Grande São Paulo, Rio de Janeiro e no Espírito Santo", afirma Uguslete Zanardi, responsável pela área de RH. A empresa atende clientes como Semp Toshiba, LG e Honda e planeja engordar os contratos em 17%, até dezembro. No ano passado, contratou 120 pessoas e cinco delas foram para posições de comando.

"Queremos profissionais com curso superior e preferencialmente com uma pós-graduação em logística", adianta José Luiz Pereira, diretor operacional da Golden Cargo, especializada em transportes e armazenagem de produtos ligados à cadeia do agronegócio. A empresa, com um faturamento de R$ 100 milhões, tem centros de armazenagem e distribuição em sete Estados e coleciona clientes como Dow e Basf. Com mais de 300 colaboradores, contratou quatro gerentes em 2009 e vai fazer novas contratações este ano. Há vagas abertas também na Exata Logística, que faturou R$ 80 milhões em 2009 e atende a Vivo e a Masterfoods, do setor alimentício. No ano passado, a companhia de 500 funcionários admitiu 80 colaboradores e dez foram para posições de gerente ou superior. "Os profissionais vieram de Minas Gerais, São Paulo e do Distrito Federal", diz o diretor Mauricio Pastorello.

O mundo agora pertence à geração do Facebook

Lucy Kellaway
29/03/2010

No café da manhã da última quarta-feira, minha geração descobriu que já era. Estava me inteirando do noticiário da terça-feira pelo computador, mas assim como a maior parte das pessoas da minha idade, nunca acredito totalmente em uma coisa enquanto não a vejo impressa em uma grande folha de papel, que de uma maneira antiquada é deixada na porta de minha casa pelo entregador. Portanto, para mim a ficha só foi cair na quarta-feira: o mundo agora pertence à geração que veio depois da minha.

No pé da primeira página do "Financial Times" estava um texto dizendo que o Facebook agora é maior que o Google. Nos Estados Unidos, mais pessoas visitam hoje o site de relacionamentos, para conversar umas com as outras e trocar fotografias e piadas de bêbados em festas, do que recorrem ao Google em busca de roteiros de viagens, averiguar a ortografia de uma palavra ou procurar pornografia na internet.

Para mim, as redes de relacionamentos são a coisa que mais separa os jovens dos não tão jovens. Na maior parte dos outros assuntos, não há tanto a escolher entre pessoas de 50 anos e as de 15, além de um pouco de experiência e muitas rugas. Todo mundo usa jeans. Mas os jovens de 15 anos vivem no Facebook, enquanto os cinquentões não o entendem.

Isso não é pouca coisa: é um gigantesco abismo de mentes entre duas gerações sobre o que é não só uma maneira diferente de se comunicar, como também uma maneira diferente de viver.

O Google é uma coisa natural para as pessoas mais velhas porque fomos ensinados a procurar as coisas no ensino primário. É como uma biblioteca, só que melhor: você não precisa entrar num ônibus e a coisa que você quer nunca está emprestada para outra pessoa. O e-mail também é uma coisa natural para nós. Podemos ainda brigar com os floreios estilísticos dessa mídia monótona, mas entendemos perfeitamente o princípio. Uma pessoa se comunica com outra, só que com uma rapidez muito maior com que o carteiro deposita uma carta sob nossa porta.

Minha geração pode até usar o Twitter, em último caso. Ele é um tipo de exibição, e somos tão bons nisso quando qualquer um nascido uma década ou duas depois.

Mas o Facebook continua sendo uma coisa muito estranha. Para nós, o sentido da comunicação é que ela é uma atividade consensual entre duas pessoas. Gosto de conversar com um amigo de cada vez, o que sempre nos permite variar o tom e o conteúdo para que eles se adequem à pessoa com quem estamos conversando. Quando lidamos com mais de um ou dois amigos de uma só vez, ficamos travados. Pense na perturbação que é decidir quem você vai convidar para ir com quem em um jantar.

Por outro lado, a ideia de que a comunicação se tornou uma transmissão aleatória para 500 "amigos", quando o assunto é o lugar onde você esteve na noite passada, é uma coisa completamente incompreensível. Assim como a ideia de você ficar parado horas e horas diante da tela do computador, pasmado com as mensagens aleatórias de um grupo de amigos tão grande que você não consegue dar conta de todos.

Esse abismo entre as gerações Facebook e a não-Facebook é maior que o que existia entre a minha geração e a de meus pais. Meu pai gostava de Verdi, eu gostava dos Rolling Stones. Ele achava que a minha música era apenas barulho, eu achava a dele esquisita. Mas no fim era a mesma bolacha de vinil de 12 polegadas que rodava no toca-discos, e ouvir a música envolvia sentar-se no mesmo sofá. Minha mãe nunca jogava comida fora, e embora eu não gostasse de ver uma batata comida pela metade dentro da geladeira, eu entendia que ela havia passado por racionamentos (durante a Segunda Guerra Mundial) e desse modo era constitucionalmente incapaz de jogar comida fora.

Pedi aos meus filhos que me explicassem o Facebook, mas não sou nada esperta. Eles não conseguem explicar porque não entendem o que estou perguntando. O tamanho da minha perplexidade não faz sentido para eles.

Quer ou não entendamos o significado disso, minha geração terá que aderir logo. Recentemente uma amiga de minha filha reclamou que uma vez que seu avô não está no Facebook, ela não conseguiu desejar feliz aniversário a ele. O pensamento de pegar um telefone -quanto mais comprar um cartão- não passou pela sua cabeça. A notícia da semana passada deixa a coisa clara. Se no futuro quisermos receber cartões de feliz aniversário (ou entrar em contato com qualquer pessoa com menos de 40 anos), teremos que entrar para o Facebook, quer o entendamos ou não.

Até onde consigo ver, há apenas um risco para o site. Na semana passada, li que 36 milhões de mães americanas aderiram ao site para ficar de olho nos filhos. Ter sua mãe como "amiga" no Facebook certamente é uma coisa tão deprimente quando era na nossa época ir a uma discoteca acompanhada pelo pai.

Lucy Kellaway é colunista do "Financial Times". Sua coluna é publicada às segundas-feiras na editoria de Carreira

Tributo dos últimos dez anos pode ser recuperado

Prazo para ajuizar ações termina no dia 8 de junho

Laura Ignacio, de São Paulo
29/03/2010

Os contribuintes têm até o dia 8 de junho para tentar recuperar na Justiça tributo pago indevidamente nos últimos dez anos - o que inclui os cinco anos anteriores à vigência da Lei Complementar nº 118, de 2005. Em abril de 2007, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que o prazo prescricional para buscar a restituição de valores recolhidos antes da norma continuava a ser de dez anos - tese dos cinco mais cinco. Para pagamentos realizados após a entrada em vigor da lei, em 8 de junho de 2005, o prazo passou a ser de cinco anos. Com isso, a prescrição dos recolhimentos efetuados entre junho de 2000 e junho de 2005 ocorrerá no dia 8 de junho, segundo advogados tributaristas, cinco anos após a entrada em vigor da lei complementar.

"Muitos empresários só estão percebendo o fim do prazo agora", diz o advogado Alexandre Coutinho da Silveira, do escritório Silveira, Athias, Soriano de Mello, Guimarães, Pinheiro & Scaff Advogados, acrescentando que o contribuinte pode recuperar qualquer imposto pago indevidamente. "Há uma série de teses debatidas no Judiciário, como a inclusão do ICMS na base de cálculo do PIS e da Cofins, que tem grande repercussão econômica. Nesses casos, os contribuintes podem buscar os últimos dez anos."

Os grandes contribuintes, em sua maioria, já fizeram esse pedido nas ações. Mas algumas empresas, mais conservadoras, que aguardavam o julgamento de um recurso da União contra a decisão do STJ que tramita no Supremo Tribunal Federal (STF), decidiram agora ir à Justiça para aproveitar o prazo. "Existem empresas de alto faturamento que, em uma posição muito cautelosa, aguardavam posicionamento do STF. Mas com a proximidade do fim do prazo, desistiram de esperar", afirma Silveira.

Ainda têm chegado ações na Justiça com base na decisão do STJ, segundo o procurador-adjunto da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) Fabrício da Soller. "Mas, até o julgamento do nosso recurso pelo STF, continuamos a defender que se o pagamento do tributo foi feito antes ou depois da entrada em vigor da lei complementar, a ação para pedir a devolução só pode ser ajuizada até cinco anos depois desse pagamento", diz. A procuradoria defende que a Lei Complementar nº 118 é uma norma interpretativa e que, de acordo com o Código Tributário Nacional (CTN), os efeitos desse tipo de norma se aplicam ao passado.

O escritório Machado Associados Advogados e Consultores vêm recebendo consultas a respeito do prazo de dez anos, segundo o advogado da banca Júlio de Oliveira. "Há sentenças finais favoráveis à tese dos dez anos nas instâncias inferiores da Justiça", afirma. Mas o advogado pondera que ministros do Supremo já se manifestaram em sentido contrário em outros processos, corroborando com a tese da Fazenda.

O tributarista Luiz Roberto Peroba Barbosa, do escritório Pinheiro Neto Advogados, já atendeu empresas que esperavam pelo julgamento e decidiram correr para aproveitar o prazo. O advogado lembra que há discussão semelhante sobre o prazo prescricional no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), órgão que julga os recursos dos contribuintes contra as autuações fiscais federais. "No Carf, a tendência é de aplicação do texto da lei. Pelo menos até que o STF julgue o recurso da União", diz.

A advogada Ana Utumi, do escritório TozziniFreire, diz que muitas empresas nunca haviam pensado em brigar pela contribuição ao Fundo de Assistência ao Trabalhador Rural (Funrural) até que o Supremo decidiu, em fevereiro, que a sua cobrança é inconstitucional. "Agora, quem pensa em entrar com ação na Justiça para recuperar o que foi pago não deve perder o prazo para fazer valer a regra dos dez anos", afirma.

O que é melhor no mercado: o "timing" ou a tendência?

Alexandre E. Santo
Economista da Way Investimentos e diretor do curso de Relações Internacionais da ESPM-RJ
E-mail: aesanto@wayinvestimentos. com.br

29/03/2010

Ser professor universitário exige um comprometimento enorme! Tudo que dizemos em sala de aula é passível de cobrança a qualquer momento pelos alunos. Eles estão sempre atentos, muitas vezes querendo nos colocar em situações embaraçosas.

Assim sendo, é preciso ter muita responsabilidade com o que se diz, pois eles serão imperdoáveis com possíveis erros. A situação é ainda pior quando o professor possui experiência profissional na matéria em que leciona, o que é meu caso.

Recentemente, encontrei um ex-aluno, do semestre passado, que me questionou: "Professor, no dia 9 de outubro de 2009 fiz questão de anotar no meu caderno que o senhor sugeriu que a bolsa estava cara e era preciso cuidado. Naquele dia o Ibovespa estava em 64 mil pontos. Estamos, hoje, em torno de 70 mil (9% a mais). E agora?"

Primeiramente, meu ex-aluno está correto, pois em 64 mil pontos eu efetivamente acreditava que o mercado já estava bem precificado. O ponto é que, na maioria das vezes, os investidores estão de olho no "timing" e não nas tendências. Em outras palavras, querem comprar na mínima e vender na máxima, como se tivessem bola de cristal e a clarividência para entrar e sair no momento mais apropriado.

Daí, por exemplo, a escola gráfica ser tão cultuada pela grande maioria dos participantes do mercado. Nela, os investidores buscam acertar o melhor momento para operar determinada ação ou mesmo o mercado em geral, enquanto na escola fundamentalista está-se analisando as perspectivas futuras da empresa, seus números contábeis, múltiplos etc.

Evidentemente que o "timing" é importante, mas é dificílimo estar com ele do seu lado a todo o tempo. Quando o referido aluno cobrou pelo meu "erro", fui pesquisar o comportamento da bolsa nesse período. Sempre admitindo que estatisticamente a média é um bom estimador, constatei que do dia 09 de outubro de 2009, até o dia 18 de março (cinco meses), a média do Ibovespa diário médio foi de 67.068 pontos.

Nesse mesmo período o CDI rendeu 3,65%, sem risco algum. Igualmente no mesmo período, o Ibovespa oscilou entre uma mínima de 60.166 e uma máxima de 71.068, uma amplitude de variação de 18%.


Voltando um pouco no tempo, recordo que, em setembro de 2005, já alertava aos clientes da asset em que trabalhava que o mercado imobiliário americano tinha toda a característica de estar formando uma bolha de preços insustentável e que era preciso atenção, pois à hora em que as condições normais fossem restabelecidas as consequências sobre a economia global seriam imprevisíveis. Dois anos depois vieram os primeiros sinais da crise dos subprimes. Acertei a tendência, errei o "timing".

Em minha visão, buscar os movimentos mais longos (a tendência) é muito mais importante do que viver o estresse diário, o sobe e desce frenético das ações, especialmente para alguém que busca focar o mercado como investidor de longo prazo e não um especulador, que só está interessado em tirar proveito da volatilidade do curto prazo. Acredito que as chances de voltarmos a verificar novas quedas mais à frente nas bolsas não são desprezíveis, daí aconselhar muita cautela.

Sou da opinião de que não é interessante correr o risco da bolsa em troca de ganhos pouco expressivos, especialmente em horizontes temporais inferiores a três anos. Se fosse para mencionar um número, pelo menos 30% acima do CDI. Ou seja, se esse ano de 2010 espera-se uma Selic média de 10%, o Ibovespa teria de se valorizar pelo menos 13% para que o risco compense as possíveis noites insones. Lembremo-nos de que a teoria clássica das finanças defende a tese da relação risco x retorno. Assim sendo, não se deve avaliar um investimento somente pela rentabilidade proporcionada.

Minha resposta ao aluno é: se corrigirmos os 64 mil pontos do dia 09 de outubro pelo CDI de 3,65% encontraremos 66.330 pontos, muito próximo da média do Ibovespa nesse período (67.068 pontos). Em outras palavras, será que valeu a pena correr o risco de estar posicionado? Se formos analisar pelo ganho adicional (738 pontos) não me parece compensador ter passado pela montanha russa dos preços.

Se formos avaliar pelo "timing", talvez sim, talvez não, depende do momento de entrada e saída de cada um. Para alguns pode ter sido muito ruim, caso de quem vendeu nos 60 mil. Para outros, caso de quem comprou a 64 mil e vendeu a 71 mil pontos, certamente foi bom. Mas isso só deve ter ocorrido para aqueles que possuem dons mediúnicos...

Na favela, seguro para casa de tijolo

Bradesco identificou imóveis legalizados e de alvenaria que podem ser segurados

Janes Rocha, do Rio
29/03/2010

Claudio Belli/Valor

O seguro residencial está chegando às favelas. A Bradesco Seguros começou este mês a vender apólices de seguros residenciais nas comunidades de Heliópolis, em São Paulo, e da Rocinha, no Rio de Janeiro.

As seguradoras que operam seguro residencial têm se mantido distante das favelas. Além do risco alto no sentido da precariedade das construções, instalações e infraestrutura, a própria legislação e a burocracia da regulamentação impedem o seguro de casas instaladas em áreas de risco, ocupações ilegais e sem um mínimo de proteção contra danos.

Mas a Bradesco identificou muitas residências que poderiam ser seguradas naqueles locais. "Podemos fazer o seguro desde que a casa seja de alvenaria, legalizada e tenha um endereço definido", explica Marco Antonio Rossi, presidente do grupo de seguros e previdência do Bradesco. A agência de Heliópolis é a segunda do Bradesco em uma favela. A primeira foi a da Rocinha, onde o Bradesco já tem 2.500 clientes, sendo 15% de empresas.

Rossi informa que a companhia atingiu um milhão de seguros residenciais vendidos. Mas diz que isso não é nada perto do potencial percebido pela empresa: só na própria "casa" - ou seja, entre os 20 milhões de correntistas do banco - há oito milhões de pessoas identificadas como potenciais clientes do seguro residencial. Além disso, no Brasil existem 51 milhões de residências, das quais só 10% têm seguro, lembra Marco Antonio Gonçalves, diretor da área de ramos elementares da companhia.

O seguro residencial é um dos produtos de um pacote que a Bradesco Seguros preparou e já está vendendo para o público com renda de até três salários mínimos, nos moldes do microsseguro que aguarda regulamentação do Congresso (veja texto abaixo). Outros são seguro de vida, auxílio funeral, acidentes pessoais e títulos de capitalização. "Estamos apostando muito no microsseguro", diz Rossi.

Segundo o executivo, a seguradora já oferece seguros a R$ 3,70 por mês, valor que está permitindo acessar um público que nunca havia comprado seguros antes. "Podemos oferecer auxílio funeral mais acidentes pessoais e sorteio de prêmios (capitalização) a R$ 9,90 com cobertura (indenização) de R$ 5 mil a R$ 25 mil, dependendo da idade do segurado."

Em seguros de tão baixo valor, o custo operacional e de distribuição é "crítico" na definição de Rossi. "Tem que ter um agente (de venda) e não pode ser muito burocrático." Para ele, nesse ponto a Bradesco leva vantagem sobre seus concorrentes porque pode aproveitar a capilaridade do banco, com seus 35 mil pontos de atendimento em todos os 5.564 municípios brasileiros.

Impulsionada pela base de clientes do banco, a massa de segurados de vida saiu de cinco milhões para 18 milhões nos últimos cinco anos. "De outubro para cá, entraram 60 mil novos CPF (Cadastro de Pessoa Física na Receita Federal) na nossa carteira", afirma Rossi.

Questionado se a estratégia de expansão inclui aquisição de outras empresas, Rossi responde que a companhia está satisfeita com os resultados da última compra (parte do capital da Odontoprev) e muito focada no crescimento orgânico, já que a carteira de apólices residenciais mostra como há um enorme espaço para crescer internamente. "Temos uma Bradesco Seguros dentro do Bradesco para crescer", costuma dizer. No entanto, garantiu que "estamos abertos a qualquer bom negócio que apareça."

Caso Lehman traz de volta lembranças sombrias da Enron

Jennifer Hughes, Financial Times, de Londres
29/03/2010
Daniel Acker/Bloomberg

Um executivo veterano de uma firma de auditoria entra para uma companhia auditada por seu empregador anterior. Ele sobe na hierarquia financeira da nova companhia, que continua com a mesma firma de auditoria, com a qual trabalha há muito tempo. Então, alguma coisa dá errado nessa companhia, levantando dúvidas sobre o que os auditores deveriam ter feito.

Esse tipo de relação é normal, provoca algumas dúvidas ou é completamente errado?

A perícia feita por Anton Valukas sobre o colapso do Lehman Brothers arrastou a atividade de auditoria de volta ao tipo de holofote que não se voltava para ela desde a Enron e a Andersen.

Uma das maiores revelações sobre o colapso da Enron foi o relacionamento excessivamente próximo que ela tinha com seus auditores. Isso não ocorria apenas em razão dos honorários que o grupo de energia gerava para a firma, mas também porque muitos funcionários da Andersen haviam saído da companhia para trabalhar na Enron, aproximando ainda mais os dois grupos.

Desde então, as regras a que auditores e seus clientes estão sujeitos mudaram drasticamente. Mas o questionamento que o relatório de Valukas faz do papel da Ernst & Young na quebra do Lehman Brothers, embora não esteja concentrado nessa área, levantou a questão de conflito de interesses mais uma vez.

A E&Y auditou o Lehman desde que ele foi desmembrado da America Express em 1994. O diretor financeiro do Lehman Chris O'Meara e seu antecessor David Goldfarb vieram da E&Y.

Goldfarb foi sócio sênior da área de serviços financeiros da E&Y e trabalhou na firma por 14 anos, indo para o Lehman Brothers em 1993. Ele foi nomeado diretor financeiro do banco em 2000 e foi sob sua supervisão que o banco desenvolveu a política contábil que usou para criar as hoje infames transações "Repo 105". O'Meara era um gerente sênior da área de serviços financeiros da E&Y quando entrou para o Lehman em 1994. Alí, ele foi diretor financeiro de 2004 a 2007.

Uma carreira desse tipo não é nada incomum. É difícil conseguir dados mais amplos nos Estados Unidos, mas uma pesquisa feita em 2008 entre diretores financeiros europeus mostrou que mais de um terço deles começava a carreira em firmas de contabilidade.

No Reino Unido, as quatro maiores firmas de auditoria e contabilidade produziram diretores financeiros para dois terços das empresas que faziam parte do índice de ações FTSE 100 em 2008, segundo um estudo feito para a revista "Accountancy". Dessas 66 empresas, um terço foi auditada pela alma mater de seus diretores financeiros.

Talvez o melhor exemplo seja o Barclays, concorrente do Lehman, que nomeou Chris Lucas como diretor financeiro em 2007. Antes disso, Lucas foi diretor da equipe de serviços financeiros da PwC e foi o encarregado das relações da firma com o Barclays, incluindo a auditoria, de 1999 a 2004.

A razão da contratação de contadores é evidente. Num mundo em que a contabilidade é cada vez mais complexa, ter alguém com experiência comprovada em detalhes complicadíssimos é no geral algo bom. A tese é que é mais difícil enganar os diretores financeiros que conseguem acompanhar passo a passo seus subordinados nos assuntos mais complexos.

As potenciais desvantagens são igualmente óbvias. Um ex-funcionário sabe como sua firma pensa e terá uma facilidade maior em identificar qualquer ponto fraco em seu processo de auditoria.

Com exceção das eventuais "maçãs podres", especialistas em contabilidade e governança acreditam que esse tipo de movimentação é no geral positiva. "Qualquer um pode, ao mudar de emprego, ser influenciado por seu novo ambiente. Isso é da natureza humana. Mas no cômputo geral, provavelmente há mais benefícios que custos", afirma Michael Young da firma de advocacia americana Wilkie Farr and Gallagher, que concentra suas atividades em irregularidades contábeis.

Depois da Enron, muitos países tornaram suas regras mais rígidas. Os Estados Unidos e o Reino Unido exige que as firmas façam um rodízio no principal sócio de uma auditoria a cada cinco anos. Os dois países também definiram períodos de "esfriamento" para qualquer um que se juntar a um cliente de auditoria. Alguns países impõem limites ao tempo de duração do contrato de uma firma de auditoria, como a Itália, que limita esse período a nove anos. (Nota da redação: no Brasil, o rodízio de firmas é a cada cinco anos, mas está suspenso.)

Além disso, apesar do exemplo da Enron, estudos acadêmicos sobre o assunto constataram pouca ou nenhuma ligação consistentemente clara entre a auditoria, ou o período de contrato de uma auditoria, e a qualidade do trabalho.

Os laços entre os auditores e os auditados podem provocar dúvidas. Mas há poucos sinais desta vez das revelações de cair o queixo que a fraude contábil da Enron trouxe à tona. (Jennifer Hughes é jornalista do Financial Times.)

sexta-feira, 26 de março de 2010

Projeto de lei cria certidão negativa de débitos trabalhistas

Luiza de Carvalho, de Brasília
26/03/2010

A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados aprovou um projeto de lei que prevê como exigência para participação em licitações públicas a apresentação de certidão negativa de débitos trabalhistas (CNDT). A certidão seria emitida pela Justiça do Trabalho a fim de comprovar que a empresa não descumpriu nenhuma condenação trabalhista que já tenha transitado em julgado. Pelo projeto, o documento também será necessário para o recebimento de benefícios ou incentivos fiscais concedidos pelo Poder Público. Agora, o projeto retorna ao Senado para que sejam analisadas modificações feitas pela Câmara.

A exigência se somaria à necessidade de apresentação da certidão negativa de débitos fiscais e seria incluída na Lei nº 8.666, de 1993. O projeto de lei nº 7.077, de 2002, de autoria do senador Moreira Mendes, prevê que a prova de inexistência de débito trabalhista será exigida em relação a todos os estabelecimentos, agências, filiais ou obras de construção civil da empresa, independentemente do local onde se encontrem. "O projeto vai evitar a eternização das dívidas trabalhistas e pode gerar um grande aborrecimento para as empresas", diz o advogado Marcel Cordeiro, do Neumann, Salusse, Marangoni Advogados. Segundo ele, muitas vezes, quando não é possível localizar bens, os processos trabalhistas acabam arquivados e caem no esquecimento.

A certidão deve ter validade de 90 dias. O projeto determina que o documento seja expedido por meio de um sistema de integração dos bancos de dados de todos os órgãos da Justiça do Trabalho. Será considerado débito trabalhista o não pagamento de sentença transitada em julgado, assim como acordos judiciais, termos de ajustamento de conduta firmados com o Ministério Público do Trabalho e termo de acordo estabelecido perante comissão de conciliação prévia descumpridos. De acordo com o advogado Rui Meier, do Tostes e Associados Advogados, o que preocupa é como será definida a situação de inadimplência. "Muitas vezes, a empresa recorre de eventual abuso no valor de uma condenação e, nesse caso, a ação ainda está em julgamento", diz.

STJ é favorável ao Fisco na maioria dos recursos repetitivos julgados

Pesquisa mostra vitória em 59,76% dos processos tributários analisados pelos ministros

Laura Ignacio, de São Paulo
26/03/2010

Um levantamento sobre os recursos repetitivos, relativos à área tributária, julgados pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) mostra que em 59,76% dos casos há vitória do Fisco. A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), em razão deste resultado, tem analisado todos os casos que foram objeto de recursos repetitivos na Corte para decidir, em breve, quais temas os procuradores regionais serão dispensados de recorrer.

Os recursos repetitivos estão previstos na Lei nº 11.672, de 2008. A norma permite que o STJ, ao constatar a existência de inúmeros recursos sobre um mesmo tema na Corte, eleja um deles para servir de parâmetro para os demais casos. O assunto, ao ser qualificado dessa forma, paralisa os demais processos que tratam do mesmo tema. O resultado desse julgamento deve ser seguido por todos os tribunais de segunda instância - o que evita a subida desses processos ao STJ.

A pesquisa avaliou 82 decisões tributárias já proferidas pelo STJ, pelo rito repetitivo. O advogado responsável pelo levantamento, Diogo Ferraz, tributarista do escritório Avvad, Osorio Advogados, afirma que, mesmo com a ferramenta em vigor, o entendimento da Corte continua oscilando muito. "Às vezes, o STJ dá indício de que vai seguir uma direção e depois segue outra, sem qualquer fato novo que motive isso", diz o advogado. Como exemplo, ele cita a discussão judicial do ICMS incidente sobre a demanda de energia elétrica.

Essa demanda é contratada entre as grandes indústrias e concessionárias de energia para garantir que, em caso de necessidade, a empresa possa consumir energia extra. Os contribuintes defendem que o ICMS deve incidir sobre o valor da energia efetivamente consumida. Já os Estados argumentam que o imposto deve ser regularmente cobrado porque a demanda fica disponível para ser consumida. "O STJ vinha proferindo decisões favoráveis ao contribuinte, desde 2002", diz o advogado. "Ao julgar o recurso repetitivo, decidiu pela incidência sobre a demanda de emergência", afirma.

O grande benefício da ferramenta, segundo o STJ, é a celeridade dos processos afetados por tema repetitivo. Mas mesmo essa celeridade é relativa segundo o advogado Ronaldo Martins, do escritório Martins & Salvia Advogados. "O julgamento de recurso repetitivo realmente põe uma pá de cal na discussão", afirma. Mas o advogado defende que é uma análise muito simplista dizer que esse instrumento é positivo por reduzir estoques de processos no Judiciário e abreviar providências das empresas como as provisões de capital que registram em seus balanços. Para o tributarista, quando o processo é classificado como repetitivo e julgamentos de segunda instância são suspensos, há uma demora até o pronunciamento definitivo da Corte. "Às vezes, a necessidade da empresa é imediata", diz. O advogado questiona ainda se essa suspensão não acaba, na prática, por eliminar uma instância judicial.

Por colocar um termo final nas controvérsias, "seja a favor ou contra a Fazenda", a PGFN defende que o instrumento dos recursos repetitivos é positivo. O procurador-adjunto da Fazenda Nacional, Fabrício da Soller, afirma ainda que, nesses casos, como os contribuintes tendem a recorrer menos, a PGFN também perde menos tempo. Além disso, a própria procuradoria acaba por diminuir o volume de recursos e, consequentemente, cai o valor dos gastos. "Por isso, nossa tendência é prestigiar esses institutos. Para não ficar recorrendo de forma ineficaz", diz.

Há também especialistas que alertam ser preciso tomar cuidado quando o Poder Judiciário inclui um processo no rol dos recursos repetitivos. "Isso porque pode acontecer de haver peculiaridades do caso concreto, que fazem com que ele não se amolde à jurisprudência formada", afirma o advogado Igor Nascimento de Souza, da banca Souza, Schneider, Pugliese, Sztokfisz e Custódio Advogados. Para enfrentar a questão, segundo Souza, a banca abriu um escritório em Brasília e contratou profissionais especializados para atuar nos tribunais superiores. "Quem não tiver uma advocacia bastante atuante em Brasília ficará em defasagem em relação à Fazenda, que hoje está bastante estruturada para esta nova maneira de advogar", afirma Souza.

Supremo quer julgar ação da base de cálculo da Cofins até setembro

Luiza de Carvalho, de Brasília
26/03/2010

O Supremo Tribunal Federal (STF) anunciou ontem que prorrogará pela última vez o prazo para levar a julgamento a ação direta de constitucionalidade (ADC) nº 18 - que trata da maior disputa tributária em andamento na Corte. A ação foi ajuizada em 2007 pela União, na tentativa de ver declarada a constitucionalidade da inclusão do ICMS na base de cálculo da Cofins. Este é o quarto adiamento do julgamento. O último prazo deveria expirar no fim de março. Agora, o processo deve entrar em pauta até o mês de setembro. De acordo com o ministro Celso de Mello, relator da ação, este é o último adiamento concedido. O estabelecimento de um limite definitivo para a data de julgamento da ação atendeu a um pedido da Confederação Nacional do Transporte (CNT), protocolado terça-feira no Supremo.

O último andamento na análise da ADC pela corte ocorreu em agosto de 2008, quando o Supremo concedeu uma liminar favorável à União. Desde então, o julgamento foi adiado por duas vezes na Corte e retirado de pauta em razão da morte do ministro Menezes Direito, que era relator do processo. No entanto, no fim do ano passado, o processo teve de ser redistribuído. Isto porque o ministro Dias Toffoli, que ocupou a vaga do ministro Menezes Direito, foi declarado impedido para avaliar o caso em razão da sua atuação no processo quando exercia o cargo de advogado-geral da União.

O novo relator da ação, o ministro Celso de Mello, adiou novamente o julgamento por 180 dias, dentre outros motivos, por problemas de saúde. O prazo terminaria neste mês e, ontem, o ministro decidiu adiar novamente por mais 180 dias, deixando claro, no entanto, que esta seria a última protelação.

Nesta semana, a CNT - "amicus curiae" no processo - protocolou um pedido para que não ocorresse um novo adiamento, tendo em vista que mesmo com o efeito suspensivo dado pelo Supremo, as empresas continuam sofrendo autos de infração relativos ao, execuções fiscais, negativas no fornecimento de certidões pelos órgãos fazendários e inscrição no Cadin. Para o advogado Rodrigo Leporace Farret, do Andrade Advogados, que representa a confederação na ação, o pedido foi atendido, pois foi estabelecido pelo Plenário da Corte que esta será a última prorrogação concedida no caso.

Empresas tentam superar falhas na formação profissional de jovens

Silvia Torikachvili, para o Valor, de São Paulo
26/03/2010

Os jovens, os mais vulneráveis para conseguir empregos em todo o mundo, enfrentam no Brasil uma situação particularmente difícil. O desemprego entre os 16 e 29 anos atinge quase 5 milhões de pessoas, o que representa 60% dos desocupados no país, conforme estudo Instituo de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), divulgado em janeiro.

Os números que constam do estudo "Juventude e políticas sociais no Brasil" chamam a atenção: o desemprego atinge 22,6% entre os jovens de 15 a 17 anos; 16,7% de 18 a 24 anos e 9,5% para as pessoas entre 25 e 29 anos. Com esse quadro, o desemprego nessa faixa etária é três vezes maior do que entre adultos, de acordo com o estudo com base em dados de 2007, é especialmente elevado especialmente elevado (19,8%) o número de jovens que não estudavam nem trabalhavam.

Má qualidade do emprego também é outro destaque: cerca de 50% dos jovens entre 18 e 24 anos trabalham sem carteira assinada, assim como 30% da faixa entre 25 e 29 anos.

Algumas empresas estão atentas à essa situação e atentas às levas de jovens que deixam as escolas públicas em direção ao mercado de trabalho. O Walmart é uma delas. A partir da Escola Social do Varejo, a rede está investindo R$ 3 milhões em 2010 na formação de mais de mil jovens entre 15 e 24 anos. O treinamento é de dez meses e, ao final dos cursos, a contratação pode estar garantida. O Walmart planeja absorver pelo menos 80% desse contingente de jovens nas 100 lojas que deve abrir no Brasil até o final deste ano. "O objetivo do curso é despertar a capacidade de superação dos jovens", explica Paulo Mindlin, diretor de responsabilidade social do Instituto Walmart.

Além do treinamento, as empresas têm em comum uma corrida contra o tempo. Foi somente em meados dos anos 1990 que as políticas públicas para a juventude entraram para a agenda dos governos. Desde então, além da recente oferta de escolas técnicas integradas (150 estão programadas para o Brasil inteiro), há legislações específicas para empresas.

"O Brasil atravessou duas décadas de desemprego juvenil; essas políticas compensatórias nem sempre dão conta da defasagem", afirma Roberto Azevedo, coordenador de trabalho e renda do Ipea . "O jovem que sai da escola pública precisa não só de formação, mas de oportunidade de trabalho decente, caso contrário, vai seguir outros caminhos". Para isso, além de melhorar a escolaridade, é fundamental que haja um mercado mais receptivo, observa Azevedo.

Para capacitar jovens, o programa do Walmart tem parceria com o Instituto Aliança, de Salvador (BA). Em Pernambuco conta com o apoio da Secretaria Estadual de Educação, que garante parte dos recursos, além de infraestrutura. Em Goiânia, a parceria é com o Fraternidade e Assistência a Menores Aprendizes (Fama) onde Claudia Santana, 18 anos, participou de um dos cursos de profissionalização que inspiraram a ampliação da Escola Social do Varejo. Claudia foi contratada, em janeiro, como auxiliar de perecíveis no Sams Clube e está entusiasmada com as perspectivas: "Aqui temos treinamentos constantes e vejo possibilidades de crescer."

Quanto mais suporte e escolaridade melhor. Os brasileiros entre 15 e 29 anos somavam 49,7 milhões em 2007, ou 26,2% da população, segundo a Pesquisa Nacional de Amostragem por Domicílio (PNAD). Em relação a 1998, a escolaridade melhorou: a média de anos de estudo nessa faixa etária era de 6,8 anos; em 2007 subiu para 8,7 anos. Entre 25 e 29 anos, a média está em 9,2 anos de estudo, o que significa 3,2 anos a mais que a média da população que hoje tem mais de 40 anos.

Mesmo tendo aumentado o tempo de permanência na escola, a qualidade da escolarização ainda é bastante sofrível. Os indicadores mostram desigualdades educacionais entre ricos e pobres; brancos e não brancos; áreas urbanas e rurais. Além disso, as pesquisas apontam uma frequência escolar interrompida por abandono, desistência e eventuais retomadas. Na faixa de 15 a 17 anos 50,4% frequentam o ensino médio na idade adequada; outros 44% ainda não concluíram o ensino fundamental. Nas regiões Norte e Nordeste, as taxas de frequência são de 36,4% e 39,6% respectivamente; e sobem no Sudeste (61,8%) e no Sul (56,5%).

A solução para essas interrupções no processo de educação pode ser a formação técnica integrada ao ensino médio, acredita Márcia Morosini, vice-diretora da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio, da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). Ali, as quase 100 vagas por ano seguem uma política de cotas e são oferecidas a alunos que, só com a escola pública, não teriam condições de competir no mercado. "O jovem começa como aluno, mas pode chegar até a pós-graduação e ser um educador, ou optar pela área de análises clínicas, ou trabalhar em gestão de saúde", explica Márcia.

Esse modelo de formação de jovens a partir do negócio principal da empresa é também a abordagem do ReAção, programa da Basf, que desde 2006 passou a integrar a rede pública de ensino de Guaratinguetá , em São Paulo. São 20 escolas da cidade que atendem cerca de 10 mil alunos por ano entre 3 e 14 anos. Eles utilizam sucata e elementos do dia a dia para aprender ciências de uma forma diferente e descomplicada. O menino Paulo do Nascimento, 9 anos, aproveitou o que aprendeu na teoria para montar na prática um ventilador/cortador, que ele explica didaticamente como funciona num vídeo de sete minutos postado no Youtube. A diretora da escola, Silvana Rodrigues, fica encantada com o resultado: "A curiosidade desperta as crianças para experiências surpreendentes."

O ReAção custa um dólar/ano por aluno. Nos quatro anos em que vem desenvolvendo o programa, a Basf investiu perto de R$ 400 mil. Segundo Ivânia Palmeira, coordenadora de comunicação do complexo químico de Guaratinguetá, ainda que os próximos prefeitos eleitos para o cargo não concordarem ou quiserem acabar com o programa, a sustentabilidade do ReAção estará garantida com a contínua capacitação dos professores. "Antes as crianças saíam da quarta série sem saber ler nem escrever", afirma Ivânia. "Hoje competem entre si fazendo experimentos na área da ciência."

Mesmo com todos os programas de capacitação de jovens comandados pelas empresas, e ainda que o governo desenvolvesse políticas públicas que atendessem a todas as demandas, tanto Márcia Morosini, da Escola Politécnica, como Roberto Azevedo, do Ipea, advertem que o problema do emprego não estaria resolvido para todos os brasileiros que terminam o ensino médio.

"Educação pode muito, mas não pode tudo", diz Márcia. "Se a qualidade da formação melhorar, mas o mercado não gerar novos postos de trabalho, e se as empresas não crescerem, os jovens ficarão limitados a empregos de baixa produtividade e baixa remuneração", diz Azevedo. "Por isso, as empresas precisam também estar atentas a uma política sustentável de investimentos e de crescimento."

Comércio entra com Adin contra mudanças no SAT

Arthur Rosa, de São Paulo
26/03/2010

A Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) ajuizou uma ação direta de inconstitucionalidade (Adin) no Supremo Tribunal Federal (STF) contra as mudanças na metodologia de cálculo da contribuição ao Seguro de Acidente do Trabalho (SAT ), que entraram em vigor neste ano. A entidade questiona o artigo 10 da
Lei nº 10.666, de 2003, que criou o Fator Acidentário de Prevenção (FAP) - utilizado para aumentar ou reduzir as alíquotas do tributo, com base nos índices de sinistralidade de cada empresa.

A entidade, que representa cerca de cinco milhões de empresas no país, alega na Adin que, apesar de previsto em lei, coube a decretos e resoluções da Previdência Social estabelecer a forma de cálculo do FAP, o que contraria a Constituição Federal e o Código Tributário Nacional. "Não restam dúvidas que o artigo 10 da Lei 10.666/03, ao confiar ao regulamento a elaboração de critérios que podem sujeitar o contribuinte ao recolhimento de tributo em valor até seis vezes maior, outorgou descabida margem de liberdade à administração, incompatível com a ordem tributária constitucional, tendo em vista o risco de insegurança jurídica que proporcionava aos contribuintes, o que veio a se concretizar com a edição do artigo 202-A do Decreto 3.048/99, com redação dada pelo Decreto 6.957/09", argumenta a CNC na ação.

Para a entidade, além da violação do princípio da legalidade, expresso no artigo 150, inciso I, da Constituição Federal, as leis e decretos questionados "atentam também contra o princípio da razoabilidade, já que não editaram qualquer norma visando à efetiva alteração do risco ambiental do trabalho nas atividades desenvolvidas pela empresas".

Muitos contribuintes e entidades de classe - entre elas a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo - conseguiram liminares e decisões de mérito contra a aplicação do FAP - que varia de 0,5 a dois pontos percentuais, o que significa que a alíquota da contribuição pode ser reduzida à metade ou dobrar, chegando a 6% sobre a folha de salários. Levantamento da Confederação Nacional da Indústria (CNI) mostra que, com as mudanças - que incluiu o reenquadramento nas 1.301 atividades econômicas previstas na legislação nas alíquotas do SAT (1% a 3%) -, mais da metade das 952 mil companhias do país passaram a pagar um valor maior de contribuição. Para a Previdência Social, no entanto, mais de 90% das empresas foram bonificadas.

Copom vê riscos para estabilidade de preços e indica elevação da Selic

Fernando Travaglini, de Brasília
26/03/2010

Os membros do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central chegaram a um "consenso" quanto à necessidade de se implementar um ajuste na taxa básica de juros, segundo informou a ata da última reunião, divulgada ontem. Segundo o Copom, "aumentaram os riscos" para a estabilidade dos preços, fruto do aquecimento da economia e da recente deterioração das expectativas de inflação, que se encontram "sensivelmente acima do valor central da meta" para este ano (4,5%).

"O Copom avalia que, diante dos sinais de robustez da demanda doméstica, ocasionando redução da margem de ociosidade dos fatores de produção, evidenciada por indicadores de utilização da capacidade na indústria e do mercado de trabalho, e do comportamento recente das expectativas de inflação, aumentaram os riscos para a concretização de um cenário inflacionário benigno."




Desde a última reunião do Copom, a mediana das expectativas de mercado para a variação do IPCA em 2010 elevou-se de 4,60% para 5,03%. Para 2011, a mediana passou de 4,50% para 4,60%. Já o nível de utilização da capacidade instalada na indústria de transformação da Fundação Getúlio Vargas (FGV) atingiu 83,1% em fevereiro, 6,1 pontos percentuais acima do mesmo mês de 2009.

A maior parte dos membros do Copom, no entanto, decidiu por "monitorar atentamente", nas palavras do texto da ata, a evolução do cenário enquanto aguarda o processo de retirada dos estímulos dados pelo governo durante a crise.

"Os efeitos desses estímulos serão parte importante do contexto no qual decisões futuras de política monetária, que devem assegurar a manutenção da convergência da inflação para a trajetória de metas em 2010 e 2011, serão tomadas."

Por causa disso, foi mantida a Selic em 8,75% ao ano, com 5 votos a favor e 3 pela elevação de 0,5 ponto - o que levaria o juro básico a 9,25% anuais. A próxima reunião será em 27 de abril.

O Copom, no entanto, ressalta que "também houve consenso entre os membros do comitê quanto à necessidade de se adequar o ritmo do ajuste da taxa básica de juros à evolução do cenário inflacionário prospectivo, bem como ao correspondente balanço de riscos, de forma a limitar os impactos causados pelo comportamento da inflação corrente sobre a dinâmica subjacente dos preços".

Na interpretação do Departamento de Pesquisas e Estudos Econômicos do Bradesco, o comitê entende que a intensidade da elevação dos juros terá que ser adequada para o caso em que o balanço de riscos mais desfavorável se manifeste.

"Em outras palavras, se houver deterioração significativa do cenário inflacionário e do descompasso entre oferta e demanda, o Banco Central poderá acelerar o ritmo de subida de juros em relação ao originalmente planejado ou em relação ao esperado pelo mercado", diz o Bradesco em relatório.

Também em relatório, a equipe econômica do Santander avalia que o Copom já tinha bastante certeza, na reunião de março, do ritmo de recuperação da atividade econômica e do impacto sobre inflação. Essa sinalização, expressa na ata, reforça a expectativa de alta de 50 pontos bases na reunião de abril. O banco projeta ciclo de alta de 300 pontos ao longo deste ano, elevando a taxa Selic para 11,75% ao ano no final de 2010.

Já a LCA Consultores espera alta menor, de 250 pontos base no ano. "O conteúdo da ata do Copom não confronta esse diagnóstico. A autoridade monetária sinaliza, no documento, que irá agir de modo a 'zelar para que as pressões inflacionárias sejam contidas', mas não chega a pintar um quadro em que a dinâmica inflacionária esteja sob risco imediato de descontrole - de forma que a atuação a política monetária tenderá a ser mais preventiva do que combativa", diz a análise.

Ainda de acordo com a LCA Consultores, a recente evolução doméstica da atividade econômica e da inflação tende a reafirmar esse cenário de elevação moderada no juro primário. "A atividade tem mostrado sinais de moderação do seu ritmo marginal de expansão, ao passo que a inflação corrente vem sofrendo relevante desaceleração (tanto no atacado industrial como ao consumidor)."

Também na ata, o Banco Central elevou a projeção de reajustes dos itens administrados por contrato e monitorados para 2011. O índice esperado passou de 4,1% para 4,4%.

Para este ano, o patamar foi mantido em 4% para o conjunto dos preços administrados por contrato - como as tarifas de serviços. O Copom manteve ainda a expectativa de reajuste zero para a gasolina e para o gás de botijão neste ano.

Brasil cai duas posições em ranking de TI

País fica na 61ª colocação em levantamento do Fórum Econômico Mundial, liderado pela Suécia

Gustavo Brigatto, de São Paulo
26/03/2010

Apesar de todo o investimento que tem recebido e do acesso crescente da população à tecnologia, o Brasil não conseguiu melhorar sua posição no Índice de Tecnologia da Informação (ITI) elaborado pelo Fórum Econômico Mundial (WEF, na sigla em inglês). Pelo contrário, na edição 2009-2010 do levantamento, o país aparece na 61ª posição, dois lugares abaixo do posto que ocupava no ano passado.

Para Irene Mia, coeditora do relatório e economista sênior de competitividade global do WEF, o Brasil não está conseguindo acompanhar o ritmo de países como China, Índia, Chile e até Barbados, países que têm tido grande preocupação em criar as condições de desenvolvimento do setor. "O Brasil está melhorando em vários aspectos, mas ainda tem questões de infraestrutura que precisam ser trabalhadas, como o sistema de ensino e o alto preço cobrado pelos produtos de tecnologia e comunicação", diz a especialista, em entrevista ao Valor.




No item que mede a preparação dos indivíduos para consumir tecnologia, o Brasil passou da 81ª colocação em 2008 para a 99ª posição no ranking deste ano. Na avaliação da economista, com mais educação - principalmente nas áreas de ciências e matemática - e preços mais acessíveis, a população teria mais interesse em comprar e usar a tecnologia em seu cotidiano. Irene avalia, no entanto, que o quadro não é preocupante. "Duas posições não é uma queda drástica. O Brasil continua sendo um país interessante do ponto de vista de investimentos", diz.

A melhora em pontos como telefonia, rede elétrica e centros de pesquisa, entre outros aspectos, fez o Brasil ganhar duas posições em um quesito importante do ITI: o de infraestrutura. O país passou do 65º para o 63º lugar. Irene reforça, no entanto, que o desempenho do Brasil vem sendo prejudicado pelos mesmos fatores nos últimos anos: burocracia, impostos e o sistema educacional.

Em 2009, na comparação com os países da América Latina e do Caribe, o Brasil ficou atrás de Barbados, Chile, Porto Rico, Costa Rica, Uruguai, Panamá e Colômbia no índice que mede o nível de preparação de um país para o uso de tecnologias da informação e comunicações. México e Argentina perderam algumas posições e continuaram atrás do Brasil.

De acordo com Irene, não é possível fazer uma comparação direta entre o desenvolvimento dos mercado em países com realidades tão diferentes como Brasil e Barbados, por exemplo. O índice do WEF é apenas uma referência de como cada país tem trabalhado a questão do uso de TI. "Em países com tamanho menor é muito mais fácil fazer uma política dar certo", afirma.

Com relação ao conjunto de países emergentes composto por Brasil, Rússia, Índia e China, o Bric, que têm sido um dos principais destino de investimentos das empresas nos últimos anos, o Brasil só ficou à frente da Rússia, que perdeu 16 posições e ficou em 90º lugar no ranking.

Em sua nona edição, o ITI traz as notas de 133 países. No total, são avaliados 68 itens, que são agrupados em três grandes temas: o ambiente empresarial, regulatório e de infraestrutura de TI; o preparo do governo, pessoas e empresas para usar os recursos; e a implementação real de novas tecnologias.

A Dinamarca, que liderou o ranking em suas três edições anteriores, perdeu a posição para a vizinha Suécia, que ocupou o segundo lugar nas edições do estudo em 2008 e 2007. Cingapura, que no ano passado era a quarta colocada no índice, assumiu a segunda posição. "Cingapura é um país que tinha poucos recursos, mas que, por decisão do governo, decidiu investir em tecnologia e teve sua realidade transformada por conta disso", comenta Irene.

Assim como o Brasil, os Estados Unidos também perderam duas posições na lista, caindo da terceira para a quinta colocação. Questões de regulamentação, proteção à propriedade intelectual e custo de acesso à telefonia são apontados como os principais entraves para o país. Apesar de ter um enorme mercado de tecnologia e um dos maiores índices de registro de patentes no mundo, os EUA não conseguem retomar a liderança do ITI, perdida em 2005.

Coca-Cola lança garrafa feita com etanol

Brasil é o quinto país a ter a embalagem, que emite 25% menos CO2 e será usada em 3% a 4% da produção

Paola de Moura, do Rio
26/03/2010
Leo Pinheiro/Valor

A Coca-Cola lançou ontem, no Rio, uma garrafa de plástico produzida com 30% de matéria-prima proveniente de etanol da cana-de-açúcar em substituição à resina proveniente do petróleo. É o quinto país do mundo onde a empresa lança este tipo de produto. As embalagens, batizadas de PlantBottle, de 500 ml e 600 ml, chegarão em abril às cidade de São Paulo, Rio de janeiro, Belo Horizonte, Curitiba, Recife e Porto Alegre. A produção da garrafa, segundo a Coca-Cola, emite 25% menos CO2 do que usada atualmente.

Por enquanto, o bio-Meg, produto que utiliza o etanol para fazer os tubos de plástico que serão posteriormente transformados em garrafa de refrigerante é fabricado na Índia. De lá, são importados para o Uruguai, para a fábrica da Cristal Pet, onde são transformadas nos tubos e importados pela Coca-Cola Brasil Segundo Rino Abbondi, vice-presidente de técnica e logística da multinacional de bebidas, o etanol brasileiro é exportado para a Ásia para ser utilizado na fabricação do bio-Meg.

A empresa, no entanto, espera que até 2014 consiga produzir no Brasil o bio-Meg e, então, poderá colocar no mercado todos os modelos de garrafas de plástico produzidas com o material, conta o presidente da Coca-Cola Brasil, Xiemar Zarazúa. "O objetivo é, num futuro, conseguir produzir as garrafas com 100% de derivados de etanol", promete Rino Abbondi, mas sem determinar um prazo.

Segundo o vice-presidente, o custo de produção é maior. No entanto, ele não revela o percentual. "Temos um compromisso de não repassar isso ao consumidor", afirma Abbondi.

Ao todo, serão produzidas 140 milhões de unidades, que equivalem de 3% a 4% da produção. A garrafa é 100% reciclável e já entra na cadeia de reaproveitamento de materiais da empresa. A Coca-Cola detém a patente do bio-Meg e já o distribuiu nos Estados Unidos, no Japão, na Austrália e no Canadá.

A expectativa da empresa é que, este ano, a produção inicial das garrafas PlantBottle reduzam o uso de mais de 5 mil barris de petróleo. O presidente da União da Indústria de Cana-de-açúcar (Unica), Marcos Jank comemorou a iniciativa. Segundo Jank, cada 10 milhões de garrafas produzidas consumirão 68 mil litros de etanol. Quando a proporção for aumentada de 30% para 100% essa relação crescerá para 227 mil litros.

Presente no lançamento, o ministro do Meio-Ambiente, Carlos Minc, comemorou a mudança para uma fonte renovável. Mas fez questão de lembrar que o aumento da produção de etanol não avançará sobre áreas protegidas, como Amazônia ou Pantanal, ou usadas na produção de alimentos.

As embalagens virão com um símbolo diferenciado apontando que são feitas com etanol. Na parte de trás do rótulo, haverá uma explicação sobre a produção e o material. Luciana Feres, diretora de marketing da empresa, conta que será feita também uma campanha de marketing em revistas e na internet. "Por enquanto, não haverá uma divulgação nacional para não frustrar os consumidores das regiões onde a garrafa não vai chegar. Quando tivermos uma produção nacional, aí sim entraremos com campanhas institucionais e de venda em todo o país", explica Luciana Feres.

quinta-feira, 25 de março de 2010

Boa perspectiva da economia ajuda na queda da inadimplência

Adriana Braz para o Valor, de São Paulo
25/03/2010

A inadimplência das empresas apresentou queda nos últimos meses, reflexo direto da melhora da atividade econômica e da menor taxa de desemprego. Dados da Serasa Experian mostram que o índice começou a cair em novembro, depois de 14 meses de elevação da inadimplência, entre setembro de 2008 e outubro de 2009, em função da crise financeira global.

Luiz Rabi, gerente de indicadores de mercado da Serasa Experian, lembra que esse foi um período adverso na inadimplência das empresas. "A partir do final de 2009, houve uma inversão no volume de registro inscrito na nossa base de dados, e uma trajetória de queda se estabeleceu", diz. O indicador Serasa Experian é formado por três blocos de dados: cheques devolvidos (considera a segunda devolução), protestos de títulos em cartórios e dívidas não pagas a bancos.

Em janeiro, o índice caiu 14,6% e, em fevereiro, 8,1%, em relação aos meses de 2009. Rabi ressalta que o fato de os bancos públicos terem suprido o mercado de crédito e de o governo ter reduzido o IPI de automóveis, motos e produtos da linha branca foram medidas fundamentais para permitir a recuperação da atividade econômica. "Isso tudo acabou favorecendo a geração de caixa das empresas, que começaram a pagar as dívidas e a colocar sua situação financeira em ordem", avalia. A tendência, segundo ele, é que a inadimplência continue em queda este ano. Se em 2009 houve forte alta na inadimplência, de 18,7% sobre 2008, este ano Rabi estima que o índice volte aos patamares do período pré-crise, entre 5% e 6% no ano.

Dados do Banco Central (BC) mostram que a inadimplência do segmento empresarial estava em 3,8% em janeiro de 2010, mesmo índice de dezembro do ano passado. Segundo Rabi, essa diferença existe porque a metodologia usada pelo BC considera as dívidas em atraso há 90 dias. No caso da Serasa Experian, os dados para os registros inscritos são passados pelos bancos, que enviam o CNPJ em débito, mas não informa há quanto tempo a dívida está atrasada.

Na avaliação de Andreas Suma, diretor sênior para a América Latina da FICO, especializada em aplicações de tecnologias analíticas para empresas financeiras, os principais fatores que permitiram a queda na inadimplência foram o menor desemprego e o crescimento econômico brasileiro, o que aumentou a renda dos consumidores e, consequentemente, o consumo. "Com o aumento, ou retomada, da renda, as pessoas passaram a voltar a pagar suas dívidas", constata.

Paralelamente, no fim do ano passado, grandes bancos, como Itaú e Bradesco, anunciaram a elevação de recursos destinados ao crédito ao consumidor. "Essas instituições esperam que a média de consumo de crédito no Brasil aumente cerca de 20% em 2010", afirma Suma. Com mais dinheiro disponível para empréstimos no mercado, a tendência é de que haja um aumento na inadimplência em reais em 2010, mesmo com a queda no percentual de contas inadimplentes. O executivo faz um alerta sobre os novos consumidores, que terão acesso ao crédito pela primeira vez. "É preciso educar esse consumidor iniciante a usar o crédito com bom senso, com consciência", pondera.

Suma aponta ainda outro fator que ajudou a reduzir as taxas de inadimplência: a melhora na capacidade de cobrança dos bancos brasileiros. "As instituições financeiras estão mais sofisticadas, identificam melhor os diferentes segmentos para atender a cada um mais adequadamente", avalia. Segundo ele, essa percepção não é só em relação ao Brasil, mas no mundo todo. "A cobrança é sempre uma balança, um equilíbrio, entre como fazer de modo mais eficiente, com o menor custo, e de que maneira as instituições podem melhor a comunicação com cada segmento de seus cliente."

João Leandro Bueno, diretor da consultoria AT Kearney, afirma que o panorama positivo para 2010 da economia faz com que as empresas tenham boas perspectivas e, assim, possam quitar as dívidas em atraso. Com isso, aumentam a sua capacidade de conseguir mais crédito. "Este ano, será de retomada dos investimentos", prevê. Por isso, Bueno estima que a tendência é de a inadimplência cair e apresentar índices próximos aos registrados em 2008, antes da crise internacional.

Cofre aberto

Volume de recursos deve crescer acima de 20% com a expansão da economia e o aumento do emprego.

Por Mario Rocha, para o Valor, de São Paulo
25/03/2010

O mercado de crédito conta com o otimismo gerado pelos bons ventos da economia brasileira para projetar um ano de muito consumo e investimento em 2010. Neste ano, não vai faltar demanda nem oferta de crédito, a despeito da expectativa de elevação da taxa Selic nos próximos meses e do recolhimento de depósitos compulsórios anunciado pelo Banco Central em janeiro. As concessões de crédito devem avançar 20,6% sobre o estoque de 2009, numa média ponderada entre uma alta de 19,9% no segmento de pessoa física e de 22,7% para pessoa jurídica, conforme projeção da Federação Brasileira de Bancos (Febraban).

As operações de crédito sofreram um baque com a crise financeira mundial, que teve seu ápice no último trimestre de 2008. O primeiro semestre de 2009 foi marcado por retração no consumo e queda na demanda de crédito. No segundo semestre, segundo o indicador da Serasa Experian, o crédito para pessoa física cresceu 4,5% ante o segundo semestre de 2008, enquanto o de pessoas jurídicas caiu 2,1%. Em dezembro, os bancos já retomavam a média diária de concessões de crédito de antes da crise, em torno de R$ 7,3 bilhões. Em fevereiro, o volume total das operações de crédito atingiu R$ 1,43 trilhão, alta de 0,8% sobre janeiro e de 16,8% em 12 meses.

"A crise foi mais amena no Brasil e o impacto no consumo foi menor. O governo colocou em prática uma política de sustentação de renda e o desemprego quase não aumentou. O setor mais atingido foi o industrial", diz o economista-chefe da Febraban, Rubens Sardenberg. Quem soube tirar proveito foram os bancos públicos, que viram na crise a oportunidade de ampliar seus negócios nesse mercado. De dezembro de 2008 a janeiro de 2010, a participação das operações de crédito dos bancos públicos em relação ao PIB saltou de 13,2% para 18,6%, enquanto para os bancos privados nacionais subiu de 17,2% para 18,0%, e para os bancos estrangeiros houve redução de 8,3% para 8,0%.

"O ano de 2009 foi extraordinário para o Banco do Brasil e 2010 será ainda melhor", diz Ricardo Flores, vice-presidente de crédito, controladoria e risco global do BB. "Com medidas de ampliação de crédito para pessoas físicas e jurídicas, conseguimos elevar nosso 'market share' de 17,1% em dezembro de 2008 para 20,1% em dezembro de 2009", afirma Flores, acrescentando que no período a carteira doméstica da instituição cresceu 35,2% ante uma evolução média de 14,9% no Sistema Financeiro Nacional.

Para 2010, o BB espera um crescimento entre 18% e 23% de suas operações de crédito, numa ponderação entre as projeções para pessoas físicas (entre 27% e 32%) e pessoas jurídicas (de 16% a 21%). As taxas de inadimplência reforçam a estratégia do banco de buscar espaço maior no mercado de crédito. Ricardo Flores diz que, em dezembro de 2009, a inadimplência de pessoas físicas no BB estava em 4,9%, ante 7,8% no sistema financeiro, que é considerado um nível confortável. Para pessoas jurídicas, essa comparação era de 2,9% no BB e de 3,8% no sistema.

O otimismo é acompanhado por executivos de outras instituições financeiras. Eles tomam por base alguns indicadores da economia brasileira, como a expectativa de crescimento do PIB entre 5% e 5,5% este ano. "Na margem, deve crescer mais do que isso. E o crédito cresce mais nessa faixa", diz Sardenberg. Outro indicador foi a criação de 390 mil empregos com carteira assinada no primeiro bimestre, o que levou o Ministério do Trabalho a projetar 2 milhões de novos empregos em 2010. Em fevereiro, a Serasa Experian também registrou o menor número absoluto de devolução de cheques por falta de fundos desde março de 1997, o que configura a volta da normalidade do mercado de crédito ao consumidor. Ainda em fevereiro, a quantidade de empresas que buscaram crédito subiu 11,4% ante o mesmo mês de 2009.

Na Associação Comercial de São Paulo, o economista Marcel Solimeo diz que a base de consumidores só cresce. Segundo ele, o Sistema de Proteção ao Crédito (SPC) registrou, nos últimos três anos, uma média anual de 10 milhões de novos consumidores que nunca haviam consultado o SPC. No setor empresarial, o índice de confiança da indústria medido pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) subiu 1,9% entre janeiro e fevereiro deste ano e atingiu 115,8 pontos, o terceiro melhor resultado desde o início da série em 1995.

O ambiente favorável na economia não deixa que uma provável elevação da taxa Selic e o enxugamento de liquidez com o recolhimento dos compulsórios alterem os planos do diretor do departamento de empréstimos e financiamento do Bradesco, Nilton Pelegrino. "Os compulsórios e os juros estão dentro das nossas previsões. No passado, o governo fez a parte dele para ajudar o consumo e flexibilizou o compulsório. Mas isso não iria durar para sempre."

Durante a crise de 2008, o Banco Central deu liquidez ao mercado ao injetar R$ 99,8 bilhões no sistema. Em janeiro, o BC anunciou que vai recolher R$ 71 bilhões. As taxas de juros dos CDBs, por exemplo, subiram no mês de março antecipando-se ao recolhimento dos compulsórios. Mas nada disso parece afetar a oferta de crédito. A previsão do Bradesco para 2010 é de crescimento de 21% a 25% nas operações de crédito para pessoa física e de 25% para pessoas jurídicas, sendo de até 28% para pequenas e médias empresas e de 23% para as grandes. Pelegrino diz que o sistema está líquido e que pelos critérios do Acordo da Basileia, o Bradesco pode ofertar R$ 240 bilhões em crédito este ano.

Na Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), há controvérsias quanto ao tema. Nem tanto pelas grandes empresas, que têm à sua disposição outros mecanismos de financiamento além do sistema bancário, como o mercado de captações externas e as ofertas de ações em bolsa de valores.

O diretor do departamento de micro, pequenas e médias indústrias da Fiesp, Milton Antonio Bogus, diz que em decorrência da crise financeira, muitas empresas se viram obrigadas a renegociar suas dívidas. Como a economia voltou a crescer, essas empresas precisaram de mais recursos para atender à demanda. "Isso gerou distorções porque os bancos não concedem um novo crédito às indústrias que estão com uma dívida recém negociada." Ele diz que há crescimento da oferta e demanda de crédito. Mas, o sistema financeiro muitas vezes cobra juros desiguais para uma mesma empresa. "O resultado é que as empresas buscam empréstimo por necessidade e acabam pagando juros predatórios."

Entre os analistas, há consenso na previsão de que o setor imobiliário deverá ser a principal vedete nas operações de crédito. O ano começou com o pé direito, dado o recorde para meses de janeiro no volume de financiamento à casa própria com recursos da poupança. Em janeiro, o Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo registrou R$ 2,88 bilhões nessa modalidade de financiamento, superando em 77,3% o resultado de janeiro de 2008, antes da crise financeira, quando o crédito imobiliário vivia um momento de euforia.

Novas regras sobrecarregam companhias

De São Paulo
25/03/2010

Com o prazo da entrega dos dados chegando, é crescente a queixa das companhias sobre o excesso de trabalho. As novas normas da CVM, que criam o Formulário de Referência e mudam a rotina das assembleias, e toda a mudança contábil para adoção do padrão internacional IFRS tumultuaram a vida das empresas.

"Acredito que houve desconsideração da CVM com a sobrecarga que está caindo sobre as administrações", diz Nelson Carvalho, da Fipecafi. "Não se trata de algo burocrático ou trivial. O esforço demanda horas a mais dos profissionais mais caros das empresas." Ele diz aplaudir a norma, mas avalia que o período não foi adequado.

"Na prática, as coisas não são tão rápidas quanto às vezes pensam os reguladores", diz Maria Helena Petterson, sócia da Ernst & Young.

A modificação das normas contábeis em prazo exíguo deve-se à publicação da nova lei, no fim de 2007, de maneira surpreendente. Já a Instrução 480 é trabalhada dentro da CVM desde 2002. A Instrução 481, que trata do material das assembleias e do uso de procuração para voto, veio na esteira da norma de transparência.

Maria Helena Santana, presidente da CVM, afirma que teria até 2012 para editar as regras. Assim, não se trata de um ideal de gestão. Para ela, a 480 e a 481 vieram em bom momento, intervalo entre a adoção das primeiras novas normas contábeis, de 2008, e a próxima leva, que consolidará o IFRS no balanço anual de 2010. (GV e FT).

Norma exige abertura sobre nível de confiança dos números dos balanços

Empresas terão que checar os controles

Por Graziella Valenti e Fernando Torres, de São Paulo
25/03/2010

As companhias abertas têm mais motivos, a partir deste ano, para se preocupar em estar em dia com seus controles internos. A qualidade desses controles será aberta pela primeira vez no Brasil, dentro do Formulário de Referência (FR). Empresas e auditores já estão inquietos com essa exposição dentro do novo documento exigido pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM), que substitui o Informe Anual (IAN).

A norma determina que os diretores comentem o grau de eficiência dos controles, indicando eventuais imperfeições e providências para corrigir os problemas. Pede também que sejam apresentadas as deficiências e recomendações presentes no relatório do auditor independente - um documento até então privado da companhia, oferecido pela auditoria como um diagnóstico do que foi encontrado durante a diligência sobre os números apresentados no balanço.

A atenção dada a esse item do FR ficou evidente em evento organizado ontem pela regional de São Paulo do Instituto Brasileiro de Executivos de Finanças (Ibef-SP) e pela Anefac (associação dos executivos de finanças).

"Acho ótimo. As empresas vão se preocupar em ter menos problemas para serem relatados", disse Nelson Carvalho, professor da Fipecafi - USP, que estava no evento. "Se falarem que vão filmar suas refeições, você certamente vai comer menos."

Mas além de dor de cabeça com a exposição, a regra está gerando dúvidas. Os auditores apontam que no Brasil não há uma exigência legal de auditoria de controle interno como a existente nos Estados Unidos, por conta da Sarbanes Oxley (SOX). Por isso, temem que se confunda a responsabilidade da empresa e seus diretores pelos controles com a do auditor.

A superintendente da CVM, Elizabeth Machado, ressaltou que o presidente da companhia e o diretor de relações com investidores são os responsáveis pelo documento. Assim, eles devem dar sua opinião sobre os controles internos e também relatar e comentar os pontos tratados pelos auditores. Cabe aos executivos decidir o que relatar no formulário. "Mas se um auditor faz um comentário, imagina-se que ele seja relevante."

Eliseu Martins, professor da Fipecafi e ex-diretor da autarquia, acredita que o auditor, ainda que não seja obrigado, deve revisar alguns trechos do documento. Neste item dos controles internos, é papel do profissional informar a CVM se encontrar alguma inconsistência entre o formulário e o relatório enviado à empresa por ele.

Para esclarecer as dúvidas, o Instituto dos Auditores Independentes do Brasil (Ibracon) discute com a CVM a necessidade de se divulgar uma ofício sobre o tema. "É preciso haver uma orientação que deixe claro de quem é a responsabilidade sobre aquelas informações e sobre o escopo do trabalho do auditor. Não deve haver uma terceirização do trabalho", afirma Wanderley Olivetti, sócio da Deloitte.

Para ele, de posse da lista de recomendações, cabe à administração da empresa avaliar se os problemas de controles identificados são significativos ou não. "Pode haver uma deficiência significativa, mas que coincidentemente não gerou erro na demonstração financeira", afirma.

Apesar de a norma brasileira não exigir uma certificação dos controles internos a exemplo do que ocorre nos EUA, Daniel Maranhão, sócio da Terco Grant Thornton, não descarta que isso seja pensado para o futuro. "Isso é importante porque acaba sendo bom para a gestão da companhia", diz.

Dentro desse contexto, ele admite que o trabalho mais detalhado geraria receita adicional para as firmas de auditoria, o que significa aumento de despesas para as empresas. Nesse caso, teria que ser analisada a relação entre o custo e o benefício da mudança.