terça-feira, 25 de setembro de 2012

Análise fundamentalista: quando menos é mais

Análise fundamentalista: quando menos é mais Por: André Rocha, analista certificado pela Apimec e atua há 20 anos como especialista na avaliação de companhias. As demonstrações contábeis são uma das principais fontes de dados para a análise fundamentalista. Contudo, a migração para o padrão contábil internacional IFRS, a falta de padronização entre as companhias de um mesmo setor, indefinições fiscais e balanços manipulados têm tornado o trabalho do analista mais árduo. Reduzir o número de companhias analisadas parece ser a solução. A análise fundamentalista se baseia em variáveis macroeconômicas (perspectivas para a taxa de câmbio, inflação e juros) e microeconômicas, como as demonstrações contábeis das empresas. Além disso, é importante estar atento às decisões dos diversos governos, pois estas podem afetar o desempenho dos preços das ações como, por exemplo, a política monetária expansionista dos Estados Unidos e programas públicos que fomentem a demanda de um determinado setor como o Minha Casa, Minha Vida. A avaliação das empresas pode ser quantitativa ou qualitativa. Na primeira, tenta-se chegar ao valor da companhia com base em algumas métricas, como a do fluxo de caixa descontado ou de múltiplos como o P/L (preço por lucro), FV/EBITDA ou P/VPA (preço por valor patrimonial). Na qualitativa, os analistas, por intermédio de conversas com a administração, fornecedores e clientes, tentam avaliar se a estratégia adotada pela companhia é a mais adequada. Na análise quantitativa, as demonstrações contábeis são vitais, especialmente para cálculo dos múltiplos. A tarefa que sempre foi complexa se encontra a cada dia mais difícil. A adoção do padrão internacional de contabilidade IFRS tem por mérito padronizar as demonstrações financeiras dos diversos países. Além disso, o IFRS privilegia o conceito sobre a forma, ou seja, o balanço deve refletir, de forma fidedigna, a situação patrimonial em um determinado instante e não simplesmente atender a obrigações fiscais ou legais. Por exemplo, a taxa de depreciação de um bem deve refletir a vida útil esperada e não obedecer apenas a uma definição legal. Por que, por exemplo, a taxa de depreciação de um veículo tem que ser sempre de 20% ao ano? Embora a ideia seja louvável, ela aumenta o poder de discricionariedade da administração para definir os seus parâmetros. Assim, por exemplo, algumas empresas do segmento de shopping centers têm atualizado anualmente seus ativos pelo valor de mercado enquanto outras não. Assim, as primeiras tendem a apresentar lucros maiores e múltiplos menores, logo mais atrativos. Alguns sistemas de dados divulgam os múltiplos de diversas empresas tomando por base os dados contábeis reportados. Se o analista não estiver atento às diferentes abordagens adotadas pelas empresas pode chegar a conclusões equivocadas. São necessários ajustes para tornar os múltiplos comparáveis. Poderia citar ainda a sistemática contábil adotada pelo setor de construção civil chamado de "percentage of completion". Por ele, a receita é contabilizada levando-se em conta as vendas e o ritmo da construção. Assim uma companhia que tem um ciclo construtivo menor tende a apresentar receita na demonstração de resultados de forma mais rápida do que outra que atenda a um cliente de maior poder aquisitivo, cujo empreendimento demora mais a ser construído. Por exemplo, como comparar os múltiplos de Direcional (DIRR3), companhia focada na baixa renda, com os de Eztec (EZTC3), que não constrói casas populares? E mais, como comparar esses múltiplos com os de outros setores? É necessário fazer ajustes. Isso sem contar que a contabilização é baseada na estimativa de rentabilidade dos projetos definida pela companhia. Se, no fim da obra, a rentabilidade for menor, o lucro tende a ser fortemente impactado. Outra consequência da adoção do IFRS tem sido o aumento do tamanho das notas explicativas. É fundamental lê-las de forma a entender o princípio empregado por cada companhia. Além disso, o governo, para evitar que o novo padrão contábil afetasse a carga tributária, criou o Regime Tributário de Transição (RTT). O governo agora pretende pôr um fim no RTT. Uma das principais controvérsias geradas com a extinção do RTT é se o benefício fiscal da amortização do ágio perdurará. O que é isso? Quando uma companhia adquire outra, a diferença entre o valor pago e o valor contábil é chamada de ágio e pode ser amortizada em um período de cinco a dez anos. Esse ágio reduz a base tributária para cálculo da CSSL e do Imposto de Renda. Pelo IFRS, o ágio é dividido em três parcelas. Uma delas representa o "goodwill" que seria a estimativa de ganho derivado da expectativa de rentabilidade futura. Pela proposta apresentada pelo fisco para edição da medida provisória que porá fim ao RTT, o "goodwill" não poderá ser amortizado fiscalmente. Em suma, o ágio que era calculado por uma simples conta de subtração (valor pago menos valor patrimonial) e gerava um benefício fiscal garantido, envolve agora cálculos mais complexos e suscita incertezas sobre a extensão do ganho fiscal. Por fim, se o novo padrão já traz incertezas, a imprensa tem noticiado casos de bancos que tiveram seus balanços fraudados, o que diminui ainda mais a credibilidade das demonstrações contábeis. Além das dificuldades levantadas anteriormente, o número de empresas listadas cresceu desde 2004. Quais gestoras e corretoras serão vitoriosas nesse novo cenário? No caso das gestoras, tendem a vingar aquelas que apresentem um número maior de profissionais ou as casas que restrinjam seu foco de análise a poucas companhias. Já as corretoras têm uma tarefa árdua. Elas têm como objetivo cobrir o maior número possível de companhias. Contudo, analistas que cobrem mais de doze companhias tendem a apresentar análises cada vez mais superficiais e incompletas. Até porque o trabalho desses profissionais não se restringe à análise, havendo diversas outras atribuições como participar de eventos corporativos, contatos com clientes e viagens. Uma solução seria aumentar o número de analistas. Mas como, se a geração de receita com corretagem mal tem coberto os custos operacionais e de investimento?

quarta-feira, 22 de agosto de 2012

Normas tributárias e a nova contabilidade

Normas tributárias e a nova contabilidade Jimir Doniak Jr (Advogado em São Paulo e Brasília, sócio de Cais, Doniak, Rangel Ribeiro e Matta Nepomuceno Advogados) A contabilidade no Brasil passa por profunda modificação desde a Lei nº 11.638, de 2007, consistente em adotar as normas internacionais (IFRS). O intuito é gerar demonstrações financeiras adequadas à substância econômica da sociedade, além de permitir a comparabilidade entre empresas de diferentes países. Já na esfera fiscal, foi criado o Regime Tributário de Transição (RTT), de modo a evitar efeitos fiscais derivados do novo tratamento contábil. Não se trata de solução definitiva e a persistência dessa situação transitória por vários anos gera custos para as empresas, as quais têm mantido apurações paralelas (contábil e fiscal), sem saber o que ocorrerá no futuro. Este é o cenário atual, no qual se discute qual deve ser o tratamento tributário definitivo frente à nova contabilidade. No passado, as demonstrações financeiras eram tidas como base segura para possibilitar a apuração de diversos tributos. Desse modo, as esferas contábil e fiscal tinham proximidade. Contudo, o rápido exame de características das normas derivadas das IFRS leva a questionamentos quanto ao limite de utilização da contabilidade como base para a apuração de tributos. A nova contabilidade é calcada, fundamentalmente, na visão econômica dos fatos. Por exemplo, não se trata de registrá-los em função de sua natureza jurídica. Uma empresa pode ser a proprietária jurídica de certo bem, mas este não constar em seu balanço patrimonial. Inversamente, outro direito, distinto do de propriedade, talvez deva ser registrado no ativo da sociedade, se ele garantir os benefícios, riscos e controle desse bem. Por se amparar nessa visão econômica, a contabilidade passa a ser dotada de maior dose de subjetividade e imprecisão. Daí a utilização de critérios como valor justo, valor em uso, "impairment" e outros. A sistemática das normas contábeis internacionais, pautada mais em princípios do que em regras, reforça a subjetividade. Os princípios são menos determinados do que as regras. Desse modo, possibilitam maior atenção à situação individual, mas dificultam a padronização de tratamento. Outro ponto a destacar é a visão mais prospectiva do novo sistema contábil. Não se deve mais entender as demonstrações financeiras como "retratos do passado". Elas devem prestar-se também a dar visão prospectiva da atividade empresarial sobre seu futuro. Por fim, em uma sociedade em constante e rápida transformação, é inviável que as normas contábeis sejam submetidas ao lento processo de aprovação de leis pelo Poder Legislativo. Por isso, elas passaram a ser definidas por órgão técnico (Comitê de Pronunciamentos Contábeis - CPC), sendo aprovadas pela CVM. As normas contábeis internacionais reforçam a subjetividade Feito esse panorama, retoma-se a dúvida quanto à utilização, na esfera tributária, das normas contábeis internacionais adotadas pelo Brasil. Por exemplo, seria inadmissível que normas contábeis não contidas em lei, mas meramente aprovadas por CPC e CVM, integrem a apuração da base de cálculo de tributos ou seria aceitável uma legalidade mitigada, em que a norma tributária limitar-se-ia a remeter aspectos essenciais da formação da base de cálculo às normas aprovadas por tais órgãos técnicos? Outra questão: a apuração de resultados contábeis pautada pela mencionada visão prospectiva das demonstrações financeiras seria compatível com os parâmetros que pautam a tributação da renda e da receita? O IR tem como fato gerador a aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica de renda. Ou seja, mede-se a renda adquirida e para isso olha-se o passado, sem se importar com expectativas futuras. Ainda mais: grande parte de todo o arcabouço jurídico-tributário (constitucional e legal) parte da necessidade de fornecer um elevado nível de segurança e certeza. Assim é não somente por interesse da sociedade, para proteção contra o Estado, mas por necessidade deste, o qual carece de normas objetivas e padronizadas que possibilitem a praticidade na arrecadação. Normas contábeis principiológicas e subjetivas atenderiam a esses anseios da atividade de tributação? Finalmente, o tratamento definitivo dos eventuais efeitos tributários das normas contábeis internacionais não deve resultar em perda da garantia de demonstrações financeiras das empresas brasileiras mais confiáveis e sucetíveis de serem comparadas com empresas em diferentes países. Não é aceitável que a contabilidade volte a sofrer interferência de regras de conteúdo fiscal. Perceptível a complexa atividade de compatibilizar as normas tributárias à contabilidade internacional. O desafio é comparável ao do momento de criação da Lei das S.A e do Decreto-lei nº 1.598, de 1977. Há notícias de que o Poder Executivo estaria finalizando as normas que substituirão o RTT e que em breve deverá submeter ao Poder Legislativo uma medida provisória nesse sentido. Torcemos para que os últimos anos tenham sido suficientes para encontrar o melhor tratamento possível e que exista tempo e abertura no Poder Legislativo para que o trabalho do Executivo possa, se necessário, ser aperfeiçoado.

sexta-feira, 17 de agosto de 2012

Estudiosos ouvidos pelo Valor rejeitam o estereótipo de que a corrupção está no DNA do brasileiro

Para estudiosos, o bom exemplo deveria partir do andar de cima Valor Econômico - São Paulo Para quatro estudiosos ouvidos pelo Valor, o estereótipo do brasileiro malandro e conivente com pequenas ilegalidades não encontra respaldo histórico ou atávico. Embora de linhas divergentes de pensamento, eles se mostraram de acordo em um ponto: o exemplo da boa conduta deveria vir do andar de cima. Para o antropólogo Roberto DaMatta, o comportamento do brasileiro se explica pela composição da sociedade. "O problema é que até hoje o Brasil vive em um modelo imperial, uma sociedade aristocrática e hierarquizada, na qual algumas poucas pessoas detêm privilégios que não cabem aos demais". Trata-se, afirma, de um modelo herdado da civilização portuguesa e que não desapareceu com a Proclamação da República, a separação da Igreja do Estado e a criação do jogo do bicho, no Rio de Janeiro. "No sistema português, religiosos eram julgados pelo Direito Canônico e os nobres e ministros tinham foruns privilegiados". Para DaMatta, os sinais mais evidentes desse modelo são o paternalismo do serviço público e os privilégios de determinados setores do Judiciário. "Nosso problema maior é a igualdade, civilizar o espaço público e cuidar bem do dinheiro que é de todos". Já o sociólogo Chico de Oliveira atribui a corrupção à própria essência do sistema capitalista. "A grande corrupção não se dá no interior do Estado, ela se dá na relação entre o Estado e o mercado. Ocorre que o pensamento econômico contemporâneo absorveu a corrupção praticada pela iniciativa privada e a transformou em competitividade". Oliveira não poupa os sindicatos, que tendem a se corromper na medida em que se desviam de suas funções originais e expandem seus poderes para outras áreas da economia. Para o historiador Marco Antonio Villa, a corrupção tornou-se mais presente no Brasil após a Proclamação da República, com "picos" durante o Estado Novo (década de 30), mas até meados da década de 80 não era um fenômeno de proporções endêmicas como hoje. O historiador acredita que providências contra a corrupção deveriam ter sido adotadas quando da redemocratização do país após o fim do regime militar, o que não foi possível em razão da doença do presidente eleito Tancredo Neves e a posse do então vice, José Sarney, representante das forças mais conservadoras. Villa não concorda com a tese de uma herança colonial portuguesa. "É querer imputar ao outro o problema que é nosso". Ele critica o que considera uma falta de politização da sociedade. (GM)

quinta-feira, 16 de agosto de 2012

Como o Japão ficou para trás na indústria de eletrônicos

Como o Japão ficou para trás na indústria de eletrônicos Por Daisuke Wakabayashi - The Wall Street Journal Numa viagem de negócios ao Japão em 2004, o analista de tecnologia Michael Gartenberg foi apresentado ao Librie, da Sony Corp., o primeiro leitor de livro com tinta eletrônica. Gartenberg ficou impressionado. Ele viu ali um prenúncio de uma nova era de eletrônicos. Mas havia problemas. O software vinha em japonês. Era preciso um computador para baixar um livro e a seleção era limitada. Hoje, o Kindle, da Amazon.com Inc., domina o mercado de e-books e pouco se recorda do Librie. A Sony está tentando recuperar o prejuízo com um aparelho sucessor, que ocupa um distante terceiro lugar no mercado global. É uma história que vem se repetindo ao longo dos últimos 20 anos com as empresas do Japão, que outrora dominavam o mercado de eletrônicos no mundo. As japonesas superaram rivais com inovações em equipamentos, desde televisores finos até celulares avançados. Mas, praticamente em todos os casos, concorrentes estrangeiras colheram os frutos ao fazer mudanças rápidas, integrar os produtos com software intuitivo e serviços on-line e transmitir uma mensagem de marketing mais inteligente. Isso deixou uma das mais reconhecidas fabricantes japonesas de eletrônicos, a Sharp Corp., às voltas com fortes apertos de caixa e uma ação em queda livre. A Sony está no meio de mais uma reestruturação depois de quatro anos no vermelho. E a Panasonic Corp. está saindo do ramo de eletrônicos de consumo. "As empresas japonesas estavam muito confiantes sobre nossa tecnologia e capacidade de fabricação. Perdemos os produtos para o consumidor de vista", disse Kazuhiro Tsuga, presidente da Panasonic, numa entrevista coletiva em junho, ao assumir a liderança da empresa depois que ela registrou o maior prejuízo anual em seus 94 anos de história. Sony, Sharp e Panasonic tiveram no ano fiscal encerrado em março um prejuízo combinado de cerca de US$ 20 bilhões. É um contraste com os anos áureos do fim da década de 70 e começo da de 80, quando o Japão começou a dominar o mundo de eletrônicos de consumo. Conforme a economia do Japão crescia, seus conglomerados tomavam conta do mercado de chips de memória, televisores a cores e videocassetes, enquanto seus laboratórios de pesquisa criavam equipamentos que definiram uma época: o Walkman e os aparelhos de CD e DVD. Agora, essas empresas são só uma sombra das americanas Apple Inc. e Google Inc. e da sul-coreana Samsung Electronics Co. A atual fraqueza do Japão está enraizada no que é tradicionalmente a sua força: a fixação com o "monozukuri", ou a arte de fazer coisas, com foco nos avanços de hardware. Esse conceito, motivo de orgulho nacional, empurrou as empresas japonesas de eletrônicos a batalhar para inventar produtos que muitas vezes eram os mais finos ou os menores do mundo, ou apresentavam outros aperfeiçoamentos mínimos. Mas elas perderam de vista fatores que realmente importam para as pessoas, como o design e a facilidade de usar. No caso do leitor eletrônico, a estratégia da Sony era vender aparelhos, enquanto a Amazon se concentrava na venda de livros. Como resultado, o Kindle estava mais em sintonia com a razão principal para qualquer consumidor desejar o aparelho: comprar e ler livros. "Mesmo que o primeiro aparelho tenha definitivamente apontado o caminho para o futuro, esse é um mercado que escapou das mãos da Sony", disse Gartenberg, que é diretor de pesquisa da Gartner Inc. "Outros conseguiram capitalizar muito mais." Para piorar a situação, o iene forte tornou mais difícil acompanhar inovações com as reduções de custo necessárias para que os produtos ficassem mais atraentes para o mercado de massa. Para os produtos de ponta, as empresas japonesas muitas vezes investem na produção doméstica e então vendem as novidades no exterior. O iene forte estreitou a margem de lucro de produtos japoneses vendidos no exterior, um problema que os rivais coreanos têm evitado graças a um won relativamente fraco. A queda nos lucros também dificultou investimento em tecnologia e novos produtos. No mais recente exemplo da perda de liderança do Japão, as empresas do país estão ficando para trás na corrida para desenvolver o que pode se tornar a tecnologia dominante para a próxima geração de televisores: os "oled", sigla em inglês para diodos orgânicos emissores de luz. As novas telas são mais finas e requerem menos energia. A Samsung, maior fabricante de TVs da Coreia, já domina o mercado de telas oled de menor porte presentes em smartphones e outros aparelhos. Agora a Samsung e sua rival e também coreana LG Electronics Co. planejam lançar, separadamente, novos aparelhos de TV oled de 55 polegadas ainda este ano. É um grande passo à frente em relação às japonesas Sony, Panasonic, Sharp e Toshiba Corp., que passaram anos desenvolvendo a tecnologia, sem encontrar formas eficientes de comercializá-la. Na tentativa de alcançar suas rivais coreanas, a Sony e a Panasonic, normalmente arqui-inimigas, fecharam em junho um acordo inédito para desenvolver juntas tecnologia de produção de oled. É um retrocesso para a Sony, que há cinco anos se tornou a primeira fabricante a vender um televisor oled. Na época, os executivos da empresa consideraram a tecnologia um "símbolo do retorno da Sony". O modelo de 11 polegadas - com espessura de cerca de 2,5 milímetros - era uma maravilha tecnológica. Mas, ao preço de US$ 2.500 cada, o televisor oled foi um fiasco financeiro. O tropeço com as telas oled ocorreu poucos anos depois de um revés semelhante com a geração anterior de televisores. Em 2004, a Sony foi a primeira empresa a lançar televisores com tela de cristal líquido, ou LCD, que substituíram a iluminação fluorescente traseira das TVs por diodos emissores de luz mais claros e que gastavam menos energia, conhecidos como LEDs. Quando a Samsung lançou seus modelos, um ano depois, a empresa os chamou de televisores "LED", um apelido para distinguir suas novas TVs de LCD dos modelos já existentes. A estratégia de marketing foi um sucesso e a Samsung conseguiu convencer os consumidores a pagar mais para ter os novos modelos LED, ajudando a retardar um declínio acentuado nos preços das televisões. Segundo a empresa de pesquisa NPD, a Samsung responde por quase metade de todos os televisores LED vendidos na América do Norte, enquanto que a Sony não figura nem entre as cinco principais vendedoras no primeiro semestre de 2012. Depois de anos de oportunidades perdidas, a Sony agora oficialmente mudou a marcha, decidindo recentemente que faz mais sentido deixar que a Samsung e outros assumam a liderança no desenvolvimento de inovações. Os executivos da Sony concluíram que, com todo o esforço em ser pioneira em tecnologias inovadoras, a empresa só estava gerando alvos para as concorrentes copiarem a um custo mais baixo. "O primeiro corredor tem sempre que encarar o vento. Às vezes, é mais fácil correr atrás", disse Tadashi Saito, que assumiu em abril como diretor de estratégia da Sony. Outro funcionário familiarizado com o raciocínio da diretoria da Sony disse que os prejuízos no negócio de televisão tornaram mais difícil fazer uma "aposta" agressiva em oled. É um outro mundo em relação aos primórdios da Sony, quando os fundadores Akio Morita e Masaru Ibuka quase quebraram a empresa para construir um novo tipo de televisão a cores, a Trinitron. Hoje a sensação é que, "financeiramente, as empresas japonesas já não podem assumir riscos", diz Yuji Fujimori, analista do Barclays Capital em Tóquio.

quinta-feira, 2 de agosto de 2012

Olympus revela erros contábeis no Brasil

Por Hiroyuki Kachi - The Wall Street Journal, de Tóquio Num primeiro teste de seus esforços para melhorar os controles internos depois de um escândalo contábil milionário, a Olympus Corp. afirmou que havia informado o Departamento de Justiça dos Estados Unidos sobre possíveis irregularidades na contabilidade de despesas no Brasil que podem ter violado a lei americana anticorrupção. A notícia abalou a confiança de investidores na capacidade da nova diretoria de conduzir a fabricante de câmeras fotográficas e equipamento médico em direção a lucros sustentados. As ações da Olympus fecharam em queda de 6,8%, para 1.380 iene (US$ 17,67) cada em Tóquio, pressionadas pelo possível impacto da declaração da empresa e temores ligados a um processo aberto por um investidor institucional. Admissões no ano passado por parte de executivos da Olympus de que haviam encoberto até US$ 1,5 bilhão em perdas com investimentos colocaram a companhia no centro de um dos maiores escândalos empresariais do Japão em anos e gerou debate no país sobre o estado da governança corporativa em geral. Um porta-voz da Olympus confirmou ontem reportagem da Bloomberg em que o presidente do conselho, Yasuyuki Kimoto, aparece dizendo que sua companhia levantou a questão do Brasil com o Departamento de Justiça dos EUA "quatro ou cinco meses atrás". O possível problema poderia ser relacionado a como a empresa lançou gastos de médicos para viagens, refeições ou entretenimento numa unidade de treinamento operada pela Olympus no Brasil, segundo a Bloomberg. "Podemos concordar que houve alguma espécie de violação no Brasil da Lei de Práticas de Corrupção no Estrangeiro [...] Entendemos que o [Departamento de Justiça] está tentando reunir muita informação sobre nós", disse Kimoto no artigo da Bloomberg. A lei americana de 1977 a que Kimoto se referiu, conhecida pela sigla em inglês FCPA, proíbe o pagamento de suborno a funcionários públicos para assegurar contratos e exige que as empresas que têm papéis negociados nos EUA mantenham livros contábeis e registros acurados. Médicos empregados por hospitais públicos podem ser considerados funcionários públicos. A Olympus não quis fazer mais comentários sobre suas constatações no Brasil e o que disse ao Departamento de Justiça, citando a investigação em andamento. Conforme o crescimento econômico enfraquece em países desenvolvidos, multinacionais estão buscando meios de se expandir em mercados emergentes, onde violações à FCPA são mais preocupantes para os EUA, segundo Lesli Ligorner, um sócio em Xangai da firma americana de advocacia Simmons & Simmons. A SEC, agência que policia o mercado de ações nos EUA, abriu 20 processos civis ligados à FCPA em 2011, comparados a 17 em 2007. O Departamento de Justiça pode abrir queixa criminal contra empresas sob a FCPA, embora a investigação de tais processos possa levar anos. O Departamento de Justiça não quis comentar sobre as constatações da Olympus no Brasil. Temores de investidores foram exacerbados ontem por um processo aberto contra a Olympus pela Terumo Corp. A fabricante japonesa de equipamento médico, que tem 2,1% da Olympus, havia proposto uma fusão com a Olympus, no que parecia ser uma tentativa de gorar a oferta da Sony Corp. por uma participação na fabricante de máquinas fotográficas. A Olympus já informou que está procurando um sócio que invista cerca de 50 bilhões de ienes (perto de US$ 640 milhões) para reforçar suas finanças. Apesar de tentar levar a Olympus para um acordo mais amplo, a Terumo afirmou ontem que abriu um processo numa corte distrital em Tóquio pedindo indenizações pela forte queda no valor de suas ações da Olympus conforme o escândalo contábil se desdobrava. A Terumo afirmou que foi forçada a contabilizar uma perda de 8 bilhões de ienes no ano fiscal encerrado em março, dos quais 6 bilhões de ienes se referiam a títulos de investimento. A certa altura do escândalo, nada menos que 80% do valor de mercado da Olympus evaporou. No fechamento de ontem, a ação estava 44% abaixo do seu valor antes de o escândalo vir à tona, em outubro. A Terumo está pedindo 6,61 bilhões de ienes em indenizações mais juros de 5% ao ano até que o caso seja resolvido. A Olympus não quis comentar sobre a queixa da Terumo antes de a analisar e afirmou que a empresa não podia ainda estimar um possível impacto financeiro.

segunda-feira, 30 de julho de 2012

Estudo visa acabar com amortização de ágio nas aquisições de empresas...

Por Fernando Torres - Valor Econômico - São Paulo Voltou a circular no mercado o rumor de que o governo federal poderá acabar com o benefício fiscal da amortização de ágio em aquisições de empresas seguidas de incorporação. A mudança teria sido proposta pela Receita Federal e viria em conjunto com uma medida provisória que será editada nos próximos dias e que tem como objetivo pôr fim ao Regime Tributário de Transição (RTT), criado em 2008, na esteira da mudança do padrão contábil brasileiro para o IFRS. Mas há muita gritaria no meio empresarial contra a possibilidade do fim desse benefício fiscal, que estimula fusões e aquisições. Grosso modo, se uma empresa paga pela outra mais que o valor de seus ativos líquidos, essa diferença pode ser deduzida da base de incidência do Imposto de Renda e da Contribuição Social sobre Lucro Líquido (CSLL) da companhia compradora, em um período de cinco a dez anos. Como esse benefício fiscal estimula a realização de negócios no país, existe entre as empresas a expectativa - e a esperança - de que, num momento em que o governo tenta estimular a atividade econômica, o Planalto não referende a proposta do Fisco. Se essa for a decisão, a MP se restringirá a criar uma legislação definitiva sobre a tributação do lucro das empresas. Não que isso seja pouca coisa. Desde de 2008, há inúmeras dúvidas sobre tratamentos tributários decorrentes das mudanças contábeis que não foram oficialmente respondidas pelo Fisco. A partir de 2008, as empresas passaram a fazer um balanço societário de acordo com as normas editadas pelo Comitê de Pronunciamentos Contábeis (CPC), mas a tributação segue ocorrendo pela regra contábil vigente até 2007, com as adições e exclusões que já eram previstas naquela época. A primeira proposta estudada pela Receita era a criação de uma contabilidade fiscal completa, paralela à societária. Mas essa ideia foi abandonada para se evitar duplicidade de processos. A solução foi manter o sistema atual, em que o balanço em IFRS é a base de tudo. Pelo RTT, a empresa parte desse lucro, volta para a regra contábil societária de 2007, e depois faz as adições e exclusões para chegar à base de cálculo final. No sistema tributário definitivo que deve ser criado, em vez de haver esse comando geral para se retomar o sistema contábil antigo, haveria uma lista explícita de cada ajuste que deve ser feito. Os acertos, assim como as adições e exclusões, seriam feitos no livro eletrônico de apuração do lucro real, chamado de e-Lalur, que já foi anunciado e passa a ser obrigatório em 2013. O entendimento dos especialistas ouvidos pelo Valor é que, havendo apenas um balanço - o societário, de acordo com o IFRS -, afastaria-se os questionamentos sobre a base de distribuição de dividendos isentos (se o lucro societário ou fiscal) e também acerca do cálculo do juros sobre capital próprio, que está ligado ao patrimônio líquido da empresa. Ficaria valendo o lucro e o PL do IFRS. Outra dúvida que deve ser esclarecida tem a ver com o tamanho do ágio por expectativa de rentabilidade futura, chamado de "goodwill". O texto atual da MP prevê que as regras fiscais devem seguir a mesma lógica do IFRS nesse ponto - o que difere do que era feito até 2007 e também do que algumas empresas seguiram fazendo desde então. Pela prática antiga, toda a diferença entre o valor de uma aquisição e o patrimônio líquido contábil (a custo histórico) era alocada como ágio por expectativa de rentabilidade futura e podia ser amortizado para fins fiscais ao longo de cinco a dez anos. Na regra contábil nova, é preciso primeiro ajustar o PL adquirido para seu valor de mercado, já que ativos imobilizados e terrenos, por exemplo, podem estar excessivamente desvalorizados. Depois é alocado um valor para os ativos intangíveis adquiridos, como marcas, patentes ou licenças. Já com os novos valores, cada um desses ativos entra em sua respectiva linha do balanço da empresa compradora. Somente o que não puder ser alocado em nenhuma dessas linhas é que fica como "goodwill". Se esse "goodwill" poderá ou não ser amortizado para fins fiscais, como foi dito, depende da decisão do Planalto. O que deve estar claro é que os demais ativos adquiridos e alocados em outras linhas (como imobilizado ou intangível), quando forem depreciados ou amortizados, poderão ser aproveitados fiscalmente como despesa dedutível de IR e CSLL. Estaria prevista também a obrigatoriedade de elaboração de laudo, que deve ser registrado em cartório, para fundamentar o valor da mais-valia ou menos-valia dos ativos adquiridos. O que não estaria definido até agora, e que terá que ser visto com lupa na MP, é a partir de quando essa forma de cálculo do ágio passa a ser a única válida. Se desde 2008 ou apenas depois de sua publicação. A medida provisória deve dizer ainda que eventuais alterações nos pronunciamentos contábeis emitidos pelo CPC não terão efeito tributário até que o Fisco se manifeste.

quinta-feira, 19 de julho de 2012

Baterias Moura impede revendedor de usar site

A empresa Acumuladores Moura, que detém a marca Baterias Moura, obteve uma antecipação de tutela (espécie de liminar) que proíbe um revendedor de seus produtos, o Comércio de Baterias Garcia, de São Bernardo do Campo (SP), de utilizar o domínio www.bateriasmoura.com. A decisão é da 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP). De acordo com o advogado Hugo Filardi, que defende a Acumuladores Moura, do Siqueira Castro Advogados, a ação foi ajuizada depois de a empresa receber reclamações de clientes que acessaram o site e compraram baterias de outras marcas, pensando que eram da marca Moura. O estabelecimento em São Bernardo vende, tanto em sua loja física quanto em seu site, baterias de várias marcas, inclusive da Moura. "Por conta do site, a Acumuladores Moura foi responsabilizada pela qualidade de outras baterias", diz Filardi. O advogado afirma que pede na ação indenização por danos materiais e morais. A empresa, que detém o domínio www.bateriasmoura.com.br, segundo Filardi, entende que, além do desvio de clientela, houve prejuízos à sua imagem. Em sua defesa, a Baterias Garcia diz que não teve a intenção de utilizar o nome da Moura para conquistar clientela, e que registrou o domínio apenas para vender os produtos da marca. Em primeira instância, o pedido de liminar havia sido negado. Na decisão, a juíza Patrícia Svartman Poyares Ribeiro, da 6ª Vara Cível de São Bernardo do Campo, entendeu que a Acumuladores Moura não provou que a utilização do domínio trouxe danos materiais ou morais. Segundo o advogado Paulo Ciari de Almeida Filho, do Azevedo Sette Advogados, a proteção de domínios não está prevista na Lei nº 9.279, de 1996, que trata da propriedade industrial. Ele afirma que a Justiça tem entendido que o uso de um nome em endereço na internet não violaria marca registrada no Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI). "É aconselhável que a empresa, ao registrar uma marca, registre também o domínio", diz.

terça-feira, 17 de julho de 2012

"Marketing de Atitude - Como Fazer Suas Equipes e Seus Clientes Gostarem de Você"

Uma pitada de afeto pode mudar muita coisa na empresa Por Jacílio Saraiva - Valor Econômico - São Paulo Uma coleção de livros de Antoine de Saint-Exupéry (1900-1944) descansa na mesa do publicitário Julio Ribeiro na Talent, agência que ele fundou há 30 anos. Os volumes, em francês, revelam um dos três passatempos preferidos de Ribeiro: estudar idiomas. Além de falar sete línguas, ele também se dedica à pintura, quando chega em casa depois do trabalho, e pratica piano, com aulas particulares, uma vez por semana. Na semana em que o Valor entrevistou um dos nomes mais conhecidos da propaganda brasileira, ele estudava a rara estrutura de notas musicais inventada por Cole Porter. "O jazz exige muito mais de quem quer desafiar o piano", diz Ribeiro, um dos sócios da agência que cunhou bordões como "Não é uma Brastemp" ou "Bonita camisa, Fernandinho". Na entrevista a seguir, Ribeiro fala de outro desafio, mais espinhoso, apresentado no seu quarto livro, lançado este mês. "Marketing de Atitude - Como Fazer suas Equipes e seus Clientes Gostarem de Você" tem 20 capítulos sobre como manter um bom relacionamento entre empresas, funcionários e clientes, com exemplos de companhias como Walmart, TAM e Magazine Luiza. "Estamos subestimando o valor que o afeto tem nas relações comerciais", diz. "Hoje, quando você lê qualquer livro de negócios, parece uma conversa entre dois escafandristas. Não há nada sobre como tratar melhor os seus parceiros." Valor: O que o levou a escrever esse livro? Júlio Ribeiro: O tema já estava na minha cabeça há muito tempo e quando minha filha Sílvia abriu uma editora, me encomendou o livro (a designer gráfica Silvia Ribeiro fundou a Dash Editora em 2011). O fator "relacionamento nos negócios" sempre apareceu como um fundamento determinante nas pesquisas que fazemos entre as empresas e seus clientes, mas era pouco visto no discurso dos dirigentes. Nos Estados Unidos, uma pesquisa mostrou que 68% das empresas abandonavam seus fornecedores porque não recebiam a atenção merecida. Valor: No livro, o senhor cita Sam Walton (1918-1992), fundador do Walmart, que dizia que, quando os funcionários são bem tratados e estão felizes, farão os clientes contentes também. Na prática, além de um bom salário, o que deixa os empregados de sorriso aberto? Ribeiro: A principal razão de os funcionários não gostarem da empresa em que trabalham é a sensação de desimportância, de como são tratados pela chefia. Uma companhia que tem um quadro que não veste a camisa tem custos maiores e menor eficiência. O relacionamento empresa-empregado é fundamental para o sucesso de qualquer organização. O colaborador passa o horário nobre da sua vida no trabalho e precisa ter uma boa experiência ali. Aqui na agência, ninguém grita com ninguém e a funcionária que serve o café é tratada da mesma forma que eu. Valor: O senhor é a favor da participação dos funcionários na receita das empresas, faz isso na sua agência e diz que dividir parte dos lucros adicionais não é despesa, mas custo negativo. O que está faltando para que mais organizações adotem essa prática? Ribeiro: Falta uma cultura empresarial mais moderna. As pessoas que trabalham com você não são empregados, são seres humanos. Do lado do cliente, quem compra os produtos também não é apenas um consumidor. É um marido, pai, filho. Valor: O senhor afirma no livro que as empresas que passam por crises são as que mais têm capacidade de se adaptar às novas realidades do mercado. Em quantas realidades as corporações deverão se encaixar agora? Ribeiro: É possível criar uma empresa à prova de crises, com um fundo de reserva e uma boa governança. Mas ainda não inventaram uma organização à prova de mudanças. Veja o que aconteceu com a Kodak, que não mudou e sumiu. Conheci um fabricante de calçados que descobriu que não tem mais clientes desde que surgiram os concorrentes chineses. As empresas têm de tornar seus clientes e fornecedores mais competitivos. Se você só exporta, agora deve desenvolver o mercado local. Hoje, a classe C consome mais do que a A. 90% dos alunos de faculdades no Brasil vêm de faixas mais baixas e a posse de bens não é mais exclusiva de determinadas esferas sociais. O Brasil mudou. Quem não se adaptar a isso vai desaparecer também. Valor: Sua agência não aceita contas de cigarro, de bebidas e do governo. O que o senhor perdeu e ganhou com essa posição? Ribeiro: Você sempre ganha quando age com bons princípios. Funcionários e clientes têm orgulho de você. Mas essa possibilidade de ser admirado ao rejeitar contas requer responsabilidade. Somos uma das poucas agências do Brasil que recusa clientes e há cinco anos não perdemos um só contrato. Faço a parte de planejamento da agência e fico surpreso com as novas tendências que estão surgindo. Por isso, é preciso sempre ter novas ideias, se antecipar ao mercado e pensar antes dos clientes. Valor: Fundada pelo senhor há mais de 30 anos, a Talent se associou em 2010 à holding francesa Publicis Groupe. Dois anos depois de fechado o negócio, o que o senhor aconselharia a alguém que está ponderando a venda de uma empresa que criou? Ribeiro: Ninguém é eterno. Éramos a última grande agência nacional. Mas agências e clientes são multinacionais e, quando você faz uma companhia, ela também precisa ser do mundo. "Marketing de Atitude - Como Fazer Suas Equipes e Seus Clientes Gostarem de Você" Julio Ribeiro. Dash Editora. 208 págs., R$ 37,00

Minas altera regulamento do ICMS

Por Laura Ignacio - Valor Econômico - São Paulo O governo de Minas Gerais alterou o regulamento do ICMS para reduzir a carga tributária de alguns segmentos econômicos. As mudanças foram implementadas por meio do Decreto nº 46.009, publicado na edição de ontem do Diário Oficial do Estado. A norma dispensou o estorno de crédito de ICMS em aquisições de medicamentos para o tratamento do câncer. As compras desses remédios são isentas do imposto. Porém, pelo princípio da não cumulatividade, previsto na Constituição, deve ser feito o estorno do ICMS de operações isentas ou não tributadas. O decreto mineiro garante ainda isenção de ICMS para operações com mercadorias destinadas a programas de fortalecimento e modernização das áreas fiscal, de gestão, planejamento e controle externo adquiridas por meio de licitações ou contratações de acordo com normas do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). O benefício, retroativo a 1º de agosto de 2011, vale até 31 de dezembro. Até então, o benefício fiscal abrangia apenas as licitações ou contratações realizadas de acordo com as normas do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). Também estão isentas de ICMS as saídas de mercadorias doadas ao governo federal para a distribuição de alimentos pelo Programa Mundial de Alimentos das Nações Unidas (PMA), recebidas com a isenção de que trata o Convênio ICMS nº 105, de 2011. De acordo com o decreto, o benefício fiscal é retroativo a 21 de outubro de 2011. O decreto ainda inclui o milheto, a casca de soja e a casca de canola na lista de produtos agrícolas que têm direito à redução de 30% da base de cálculo do ICMS, quando destinados a estabelecimento de produtor rural, de cooperativa de produtores, de indústria de ração animal ou de órgão estadual de fomento e desenvolvimento agropecuário. Além disso, a norma alterou a lista de produtos agrícolas com redução de 60% da base de cálculo do ICMS, quando destinados à alimentação animal ou ao emprego na fabricação de ração animal. Com efeitos retroativos a janeiro, alguns dos produtos beneficiados são alho em pó, sorgo, milheto, sal mineralizado, farinhas de peixe, de ostra, de carne, de osso, de pena, de sangue e de víscera, calcário calcítico, caroço de algodão, além de farelos e tortas diversos, especificados no decreto. De acordo com nota da Secretaria da Fazenda de Minas Gerais, o Decreto nº 46.009 incluiu na legislação tributária estadual diversos convênios de ICMS firmados no Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz). "Os efeitos retroativos trazidos no texto legal referem-se às datas em que os convênios tiveram ratificação nacional, a partir das quais passam a produzir efeitos", afirma a nota.

quinta-feira, 12 de julho de 2012

EUA rejeitam "green card" por tatuagens associadas a gangues

Por Miriam Jordan - The Wall Street Journal Em dezembro, Heitor Villalobos deixou o Estado americano do Colorado, onde mora, e foi ao México, sua terra natal, como parte do processo para obter o visto de residência nos EUA. Ele esperava ficar dois meses fora até concluir o processo. Sete meses depois, esse mexicano de 37 anos, que vive de pequenos consertos, ainda não conseguiu voltar para casa, onde deixou a mulher e os três filhos. O consulado americano não permite. O problema? As tatuagens no corpo de Villalobos - algumas associadas a gangues violentas no México. "Ele gosta de tatuagem, assim como muitos americanos", diz Veronica, a americana com quem é casado há seis anos. Segundo ela, o marido não tem ligação com gangues criminosas. Ele diz que fez as tatuagens, umas no México, outras nos EUA, só porque achou bacana. Advogados especializados em imigração dizem que, nos últimos anos, o temor de que gangues estrangeiras possam entrar nos EUA tem levado Washington a atrasar ou a negar o "green card" (visto de residência permanente) a certas pessoas com tatuagem. Levas de imigrantes, a maioria da América Latina, já foram pegos nessa peneira, mesmo tendo ficha criminal limpa. O visto é negado com base num artigo da lei de imigração que admite a "inadmissibilidade" em caso de risco à segurança nacional, incluindo a possível filiação a organizações criminosas. No ano fiscal encerrado em setembro de 2006, os EUA recusaram visto de imigrante a só duas pessoas por ter "razões para acreditar" que buscavam "única, principal ou incidentalmente" tomar parte no crime organizado. No ano fiscal de 2010, o mais recente para o qual há dados disponíveis, o número subira para 82 pessoas. Ter o corpo tatuado não é suficiente para que o pedido de visto seja negado, disse uma porta-voz do Departamento de Estado. Ela disse que, agora que as forças de segurança entendem melhor a relação entre "certas tatuagens" e facções criminosas, vem sendo dada "mais atenção a tatuagens como indicador de filiação a gangues durante o processo de [concessão] de vistos". O órgão não se pronuncia sobre casos isolados, disse ela. Especialistas dizem que muitas tatuagens que vêm dando dor de cabeça a imigrantes podem até ser associadas a uma ou outra gangue, mas são populares também entre o público em geral. Um exemplo: as máscaras que simbolizam o teatro, uma rindo, outra chorando, como a que Villalobos tem. "Se a pessoa tem tatuagem de gangue, é justo que o funcionário consular vá investigar se tem ligação com gangues", disse Ira Mehlman, porta-voz da Federação para a Reforma da Imigração Americana, grupo que defende restrições à imigração aos EUA. Críticos dizem que autoridades americanas estão tomando decisões que complicam a vida das pessoas e violam seus direitos. O mexicano Rolando Mora Huerta, casado desde 2008 com Madeline Cardenas, nascida nos EUA, já foi detido por estar ilegalmente no país. Fora isso, só teve problemas com a lei por dirigir em excesso de velocidade e consumir álcool antes da idade permitida, dizem advogados do casal. Ele também tem tatuagens e, em julho de 2010, teve o visto negado por "filiação a uma organização criminosa", segundo a notificação em espanhol do consulado. Cardenas, que é enfermeira em Nampa, Estado de Idaho, disse que o marido fez as tatuagens quando tinha 14 anos, antes de ir morar nos EUA. Em setembro de 2010, os advogados de Mora deram mais informações ao consulado, incluindo uma carta da polícia de Nampa atestando que não havia indícios de que o rapaz pertencesse a alguma gangue. O consulado não voltou atrás. Este ano, os advogados do casal recorreram junto ao Departamento de Estado, mas o órgão confirmou a decisão consular. Na semana passada, eles entraram com ação contra o governo americano numa vara federal contestando a afirmação de que Mora pertence a um grupo criminoso e argumentando que proibir sua entrada nos EUA viola o direito fundamental da mulher, que é americana, de estar com o marido. Depois do Natal, Villalobos foi a Ciudad Juárez para entrevistas no consulado ligadas ao pedido de green card. Um funcionário do órgão questionou Villalobos sobre as tatuagens e seu possível envolvimento com gangues, dizem advogados do mexicano. Villalobos negou qualquer relação. Em vez de aprovar o visto, o funcionário do consulado notificou o mexicano de que seu caso exigia mais análise. Não há prazo para a decisão. "Por eu gostar de arte, tentam colocar em mim uma máscara de pessoa má", disse Villalobos. Segundo autoridades do Colorado, ele não tem passagem pela polícia. Se o pedido de Villalobos for negado, ele e a família terão de decidir o passo seguinte. Sem a renda do marido, a mulher, que não trabalha fora, teve de cancelar o plano de saúde da família. Agora, depende da ajuda financeira da mãe.

terça-feira, 10 de julho de 2012

Desmascarando o poder enganador dos números

Por Oscar Pilagallo - Valor Econômico - São Paulo "Os Números (Não) Mentem" Charles Seife. Tradução de Ivan Weisz Kuck. Zahar. 264 páginas, R$ 44,90 Numa época em que se despeja diariamente sobre o cidadão uma quantidade industrial de números, produzidos por governos, empresas, entidades e institutos de pesquisas, entre outras fontes, é oportuno o alerta de Charles Seife sobre as falácias matemáticas. Em "Os Números (Não) Mentem", o autor, mestre em matemática pela Universidade de Yale, define o conceito: trata-se da "arte de empregar argumentos matemáticos enganosos para provar algo que nosso coração diz ser verdade - ainda que não seja". A manipulação só é possível porque os números, "por trajarem o alvo manto do fato irrefutável, são dotados de um incrível poder". O livro de Seife, que é também professor de jornalismo da Universidade de Nova York, é uma tentativa de relativizar tal poder. Com uma série de exemplos, tirados sobretudo da história americana, ele mostra como "um punhado de técnicas poderosas" pode forjar a realidade e fazer a sociedade "engolir inverdades". Seife argumenta que é preciso estar atento para o fato de que torcer os números pode ser um bom negócio. Em 1983, por exemplo, a Nasa encomendou um estudo para avaliar os riscos dos ônibus espaciais. O resultado: havia uma possibilidade, em 35, de a nave explodir no lançamento. Como essa proporção era inaceitável, a Nasa ignorou o estudo e seus engenheiros produziram nova estatística: uma em 100 mil. Era um número inventado, como denunciou o prestigiado físico Richard Faynman, mas a subestimação do risco, que provocaria o acidente fatal três anos mais tarde, proporcionou à agência a verba pretendida. Na década passada, a crise das hipotecas nos Estados Unidos teve natureza semelhante. Os operadores do mercado financeiro sabiam do grande risco de emprestar a clientes que teriam dificuldade em honrar o compromisso, mas isso não os impediu de manter a prática. Quando a crise estourou, em 2008, a economia mundial sentiu seus efeitos, mas os responsáveis não perderam dinheiro, pessoalmente, e muitos até ganharam ainda mais quando o governo foi obrigado a intervir, injetando recursos públicos em suas empresas para evitar o risco sistêmico de uma quebradeira geral. Para Seife, os riscos das falácias numéricas vão muito além do campo econômico. Na política, ele acredita, a manipulação de dados ameaça a própria democracia, "uma instituição fundada sobre uma operação matemática -- a contagem de votos". Sobre a relação entre estatística e política, embora o Brasil não seja citado, dois tópicos interessam especialmente ao leitor brasileiro neste período pré-eleitoral: as distorções potenciais das pesquisas de opinião e do sistema de voto distrital. No primeiro caso, o autor argumenta que as pesquisas são pseudoeventos que permitem aos jornalistas manter o assunto em pauta quando não há notícia, o que os liberta da "cronologia nada ideal dos eventos autênticos". Afirma que, enquanto narram a disputa como "uma corrida de cavalos", ajudam a distorcer a realidade. Hoje em dia não se fazem mais erros primários, como usar amostragens inadequadas, que levaram a equívocos históricos (como o anúncio da vitória fácil do candidato republicano no pleito de 1936, que acabou consagrando o democrata Franklin Roosevelt), e quem é do ramo dá o devido peso à margem de erro. O problema é o uso de pesquisas tecnicamente frágeis ou, o que é pior, com viés intencional. Quanto ao voto distrital, proposta recorrente no Brasil, defendida em geral pelos mais conservadores, Seife o associa a uma história de dois séculos de manipulação do sistema eleitoral dos Estados Unidos. O autor traça a gênese da falácia matemática que solapa os mecanismos da democracia. Conta que, no início da década de 1880, Elbridge Gerry, um dos signatários da Declaração de Independência e governador de Massachusetts, reorganizou os distritos eleitorais do Estado para favorecer seu partido. A ideia era agrupar os votos da oposição num mesmo distrito (de forma que muitos fossem redundantes) ou desintegrar os distritos oposicionistas (para que o adversário não alcançasse maioria em nenhum deles). Um distrito ficou geograficamente tão disforme que parecia uma salamandra, daí a expressão "gerrymandra", até hoje empregada pelos críticos do voto distrital. O livro dedica espaço generoso à eleição americana de 2000, quando o republicano George Bush venceu o democrata Al Gore depois da confusão sobre a contagem de votos na Flórida. O autor, porém, não toma partido. Ninguém ganhou, diz, e "isso é o máximo que qualquer um poderia afirmar com segurança". Assim, ele chega à conclusão de que, dadas a apuração cheia de falhas e uma diferença ínfima, o correto seria declarar a eleição empatada, e decidir no cara ou coroa, como manda a legislação estadual, quem seria o vencedor. Torturar os números, para que confessem o que quer que seja, não tem nada a ver com ideologia. Falácias numéricas surgem à esquerda e à direita, como mostra Seife. O próprio Al Gore, vítima dos números em 2000, teria mais tarde usado estatísticas capengas no documentário "Uma Verdade Inconveniente", com o fito de tornar mais impressionantes as consequências do aquecimento global. Nas animações que simulam o desaparecimento de cidades litorâneas, o político supôs que o derretimento das geleiras faria o nível do mar subir seis metros, a previsão mais catastrófica e em desacordo com a maioria dos climatologistas, que estimam elevação não superior a um metro no próximo século. À direita, Seife pinça o exemplo da campanha contra a legalização do aborto, que usa pesquisas segundo as quais mulheres que interrompem a gravidez são mais propensas ao suicídio. É verdade, mas é verdade também que elas têm maior probabilidade de morrer em acidentes ou ser assassinadas. Em todos os casos, os riscos maiores não decorrem do aborto, claro, mas do fato de que as mulheres com quem são comparadas - aquelas com filhos - costumam ter uma vida doméstica menos exposta a perigos. Embora o autor caia na armadilha que denuncia, ao estimar que as falsificações numéricas são responsáveis pelo desaparecimento de US$ 1 trilhão do Tesouro americano (ele nem se dá ao trabalho de explicar a conta), seu alerta vem em boa hora. Oscar Pilagallo é jornalista e autor de "História da Imprensa Paulista" e "A Aventura do Dinheiro". "Os Números (Não) Mentem" Charles Seife. Tradução de Ivan Weisz Kuck. Zahar. 264 páginas, R$ 44,90

segunda-feira, 9 de julho de 2012

Projeto regulamenta comissão de fábrica e cria alternativa à CLT

Por Carlos Giffoni - Valor Econômico - São Paulo Um anteprojeto de lei que amplia a autonomia de empresas e sindicatos nas negociações de cada categoria está nas mãos da Casa Civil e pode ser encaminhado ao Congresso neste mês. Trata-se de uma alternativa à Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Elaborado pelo Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, o Acordo Coletivo de Trabalho com Propósito Específico (ACE) regulamenta a criação de Comitês Sindicais de Empresa (CSE) - versão moderna das comissões de fábrica - dentro dos locais de trabalho, o que tende a diminuir o número de processos encaminhados anualmente à Justiça do Trabalho. A adesão à nova legislação seria facultativa. O projeto garante segurança jurídica para que esses comitês negociem diretamente com a diretoria das empresas desde problemas no dia a dia até benefícios e direitos, como licença-maternidade. O setor empresarial faz coro ao projeto, que facilita a resolução de questões internas nas empresas. "A ideia é muito boa, porque prevê uma valorização da negociação entre as duas partes. Quando a negociação está amadurecida, é preciso dar oportunidade de fazê-la diferentemente de como a lei [a CLT, de 1943] estabelece. E outra, não é obrigatório", diz José Pastore, professor da Universidade de São Paulo (USP) e consultor em relações do trabalho. "Reconhecemos a legitimidade da representação interna e como isso equilibra as necessidades dos negócios e as demandas dos trabalhadores", afirma Nilton Junior, diretor de recursos humanos da Volkswagen no Brasil. O que o projeto estabelece é um entendimento especial nos moldes do acordo coletivo firmado entre a montadora de caminhões Scania e os metalúrgicos do ABC que, com a forte queda da produção neste ano, evitou as demissões na fábrica. O banco de horas adotado na Scania não é reconhecido por lei, não tem segurança jurídica, mas foi o que criou condições para frear a produção sem que houvesse demissões. Em setembro do ano passado, o sindicato levou o anteprojeto ao secretário-geral da Presidência da República, Gilberto Carvalho, e ao presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS). O primeiro rascunho do ACE havia sido entregue ao ex-presidente Lula em 2009. Finalizado, o texto prevê que os acordos especiais só poderão ser firmados diretamente entre empresas e sindicatos, se o sindicato comprovar que tem representação na empresa. Essa representação seria escolhida por meio do voto, assim como nas comissões de fábrica que existem no ABC desde 1981. As exigências previstas vão além. O Ministério do Trabalho deverá certificar os sindicatos que têm representatividade e, portanto, não estariam sujeitos a pressões empresariais. Somente esses estariam aptos a formalizar um acordo específico. O número de trabalhadores sindicalizados na empresa deve superar 50% do total de empregados - a média nacional é de 18%, o que reduz significativamente o número de sindicatos e empresas aptos a assinar um acordo especial. Da parte patronal, a empresa deverá comprovar que reconhece o comitê sindical como o órgão com quem negocia as demandas dos trabalhadores e que não tem pendências judiciais por intervir no direito sindical. O acordo especial conta com o apoio do Ministério do Trabalho. "Temos que incentivar os processos que facilitem os acordos coletivos e a representação dos trabalhadores. Os sindicatos que realizam esses acordos são representativos de suas categorias. A aprovação do anteprojeto não depende só do Congresso, depende de negociações", diz o ministro Brizola Neto. Hoje, as empresas são obrigadas a dar uma hora de almoço aos seus funcionários. Na fábrica da Mercedes-Benz, no ABC, funcionários e diretores avaliaram que 45 minutos seriam suficientes - e, com isso, todos poderiam terminar o expediente 15 minutos mais cedo. Porém, essa modificação é proibida por lei e a empresa que fizer tal acordo está sujeita à multa, ainda que o sindicato da categoria o ratifique. Com a instituição dos comitês sindicais, caberia às duas partes fazer um acordo específico para aquela empresa, dentro da qual estaria instalado um braço sindical. O CSE é responsável pela fiscalização dos acordos coletivos e do cumprimento da legislação trabalhista nas empresas onde está instalado, por buscar soluções para problemas do dia a dia e por adequar a negociação coletiva - realizada pelo sindicato da categoria - à realidade da empresa. "A legislação não contempla todas as categorias, impede os empresários de resolver problemas que a competitividade moderna impõe e impede os trabalhadores de avançar em conquistas de direitos", diz Sérgio Nobre, presidente do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC. "O bom do CSE é que não permite que o trabalhador sofra um dano, evitando que os problemas cheguem à Justiça." São 89 as empresas do ABC paulista em que já funcionam comitês sindicais para os metalúrgicos, de acordo com o sindicato da categoria. Os trabalhadores dessas empresas representam cerca de 90% do total de 105 mil metalúrgicos da base do sindicato. Empresas do setor químico também já aderiram ao formato, mas tanto empresários como sindicalistas estão de acordo que falta segurança jurídica que garanta os acordos firmados. Nobre destaca que, nas montadoras do ABC, a rotatividade é muito baixa e não passa de 2% ao ano [somente no mês de maio, segundo o Ministério do Trabalho, a taxa de rotatividade no país foi de 4,3%], já que existe uma satisfação garantida pela presença do comitê sindical. "O diálogo constante minimiza os problemas", diz Nilton Junior, diretor da Volkswagen. Na fábrica da empresa, em São Bernardo do Campo, que emprega 14,8 mil trabalhadores, 28 diretores sindicais, afastados de suas atividades, compõem o comitê sindical. De acordo com ele, o CSE na fábrica da Anchieta se envolve em questões mais estratégicas, relacionadas às demandas de longo prazo dos trabalhadores, que são repassadas à empresa em reuniões semanais. "A negociação coletiva começa dentro da empresa e quase tudo se resolve ali mesmo na maior parte dos países. O sindicato não tem legalidade para se instalar dentro da empresa no Brasil. Isso é exceção", diz Hélio Zylberstajn, professor da Faculdade de Economia da USP.

Conectados para trocar experiências com colegas

Por Adriana Fonseca - Valor Econômico - São Paulo Recentemente, o cardiologista e clínico geral Renato Vieira recebeu em seu consultório uma paciente de longa data. Ela apresentava uma lesão avermelhada na região da boca e do nariz. Apesar de acreditar tratar-se de rosácea, uma doença de pele, ficou na dúvida em diagnosticá-la dessa forma. Foi então que recorreu, em tempo real e pela internet, aos colegas. "Pedi permissão da paciente, tirei duas fotos da lesão com o meu celular e, no mesmo momento, transferi os arquivos e perguntei o que eles achavam", explica Vieira. A pergunta não foi simplesmente jogada na internet. Foi feita em uma rede social voltada apenas para médicos, a Doctors Way, lançada há nove meses. "Quase que instantaneamente, os colegas dermatologistas começaram a responder confirmando que se tratava mesmo de um caso de rosácea", lembra o médico, que orientou sua paciente a não ficar exposta à luz solar e a evitar alimentos muito quentes, além de encaminhá-la a um dermatologista. Em poucos minutos, Vieira discutiu o caso que acabara de surgir em seu consultório com outros colegas de profissão. Situações semelhantes já haviam surgido e foi a partir da necessidade pessoal de compartilhar informações médicas que ele e o colega Fernando Maluf fundaram uma rede social que só aceita médicos - é preciso inserir o número de CRM para se cadastrar. Hoje, há mais de 2.500 profissionais cadastrados na Doctors Way. Na internet, os médicos criam um perfil, como acontece no Facebook. Só que em vez de compartilhar episódios da vida particular, pedem a opinião dos colegas sobre exames e diagnósticos, leem estudos sugeridos por outros integrantes da rede e notícias especializadas da área, publicam artigos médicos e ainda podem assistir a aulas e trechos de congressos. Tudo de forma gratuita. "Tenho 16 anos de formado e atendo apenas no meu consultório, em São Paulo. Às vezes, sinto dificuldade de falar com colegas sobre dúvidas que surgem no dia a dia", diz Vieira, explicando porque criou o site. "Acredito que profissionais de locais mais remotos sintam ainda mais essa necessidade", diz. Segundo ele, mais de 160 perguntas já foram feitas nos nove meses de vida do site e cada uma recebe, em média, quatro respostas. As redes sociais, popularizadas há alguns anos pela troca de informações pessoais entre amigos, estão ganhando a esfera profissional no Brasil. E não necessariamente com a função de expor o currículo ou procurar emprego, como acontece no LinkedIn. A função dos sites segmentados por área profissional, como o Doctors Way, é ampliar o networking, integrar a comunidade e ajudar no dia a dia de trabalho. Assim como os médicos, os profissionais de recursos humanos também se uniram virtualmente. Capitaneada pela seccional São Paulo da Associação Brasileira de Recursos Humanos (ABRH-SP), a People surgiu no começo de abril com o intuito de ampliar e facilitar a conexão de quem atua na área. "O objetivo é gerar debates virtuais sobre gestão de pessoas, em complemento aos encontros presenciais promovidos pela associação", explica Donizetti Moretti, diretor da ABRH-SP. Segundo ele, o site já conta com 2.400 cadastros e 23 grupos de estudos. Os temas mais comuns são desenvolvimento de lideranças e engajamento de pessoas. Também são movimentados os debates sobre legislação relacionada a recursos humanos. Psicóloga e sócia da ASDP Consultores, especializada em seleção e coaching, Yara Leal de Carvalho é uma das participantes da People. Ela é facilitadora do fórum que discute assuntos ligados à geração Y e conta que a rede social ampliou a conexão entre os participantes do grupo, que já se encontravam presencialmente uma vez por mês. "Usamos a rede para trocar textos e vídeos sobre temas de nosso interesse", afirma Yara, que também participa do grupo de discussão sobre coaching. "A internet amplia a possibilidade de estudos e aprofunda o networking", ressalta. Os executivos expatriados também têm na internet um ponto de encontro. Na rede social global InterNations, 480 mil pessoas que estão vivendo fora de seus países de origem trocam informações, quase sempre em inglês, sobre os mais variados assuntos - desde como gerenciar uma pequena empresa no país estrangeiro e administrar a papelada relacionada aos vistos até dicas de onde saltar de paraquedas. Com a crescente comunidade de expatriados no Brasil, a rede inaugurou, neste ano, duas regionais brasileiras: Campinas e Goiânia. Os novos grupos se juntam a outros três do país já existentes na rede social desde 2009 - São Paulo, Rio de Janeiro e Brasília - e às mais de 300 comunidades ativas do site, uma para cada cidade. "O número de membros da InterNations residentes em Campinas e Goiânia tem aumentado constantemente. Os canais vão atender melhor às necessidades desses expatriados e ajudá-los a se comunicar e a organizar encontros", afirma Valentina Griffin, gerente de relações internacionais da rede social para a América Latina. No Brasil, o site tem cerca de 10 mil usuários cadastrados. Na comunidade de São Paulo, por exemplo, a maior da América do Sul, os usuários da rede social marcam happy hours, indicam restaurantes, pedem sugestões de escola para os filhos e até ideias do que fazer em um domingo pela manhã. O site também funciona para troca de informações sobre carreira e negócios. Para organizar melhor o conteúdo da página, os fóruns são divididos em cinco áreas: conversas sobre a cidade, dúvidas relacionadas à expatriação, empregos, moradia e dicas de lojas. Lançada em 2007, a InterNations surgiu a partir da ideia de três amigos: Christian Leifeld, Philipp von Plato e Malte Zeeck. Os três estudaram e trabalharam em diversos países estrangeiros e descobriram, nessas temporadas longe de casa, como é difícil se ambientar em uma nova cidade. Hoje, quem comanda os negócios é o alemão Zeeck, de 35 anos. O executivo fez o colegial nos Estados Unidos e passou, durante a graduação, por Suíça, Itália e Brasil. Já no mercado de trabalho, atuou na Espanha e na Índia entre outros locais. Na InterNations, o acesso é gratuito para alguns serviços, como a participação nos fóruns de discussão e a busca por outros membros. Usuários pagantes, identificados como "albatross members", têm outros benefícios como entrada gratuita nos encontros presenciais promovidos pela rede, prioridade nas listas dos eventos, permissão para ver quais membros visitaram o seu perfil e número ilimitado de mensagens para outros usuários. O custo de se tornar um "albatross member" vai de 3,95 libras mensais no pacote de 12 meses, até 5,95 libras por mês no combo trimestral.

TRF impede Receita de aplicar multa

Por Bárbara Pombo e Laura Ignacio - Valor Econômico - Brasília e São Paulo A aplicação de multa de 50% sobre pedidos de ressarcimento ou compensação de créditos tributários negados pela Receita Federal foi considerada inconstitucional pela Corte Especial do Tribunal Regional Federal (TRF) da 4ª Região. Essa é a primeira decisão de um órgão máximo de segunda instância sobre a cobrança. A penalidade foi instituída em 2010 pela Lei nº 12.249. Antes de ser alterada, a legislação previa uma multa de 20% por atraso no recolhimento de impostos compensados indevidamente com créditos tributários. A elevação do percentual da chamada multa isolada prejudica as empresas que recolhem PIS e Cofins pelo regime não cumulativo, principalmente as exportadoras, que acumulam muitos créditos. Entre novembro de 2010 e junho deste ano, a aplicação da penalidade gerou R$ 148,94 milhões aos cofres públicos, de acordo com a Receita Federal. Só a 8ª Região Fiscal (SP), arrecadou R$ 67,13 milhões. O caso analisado pelo TRF da 4ª Região - que abrange os Estados do Sul - é da Tyson do Brasil Alimentos. A agroindústria de Santa Catarina entrou com um mandado de segurança preventivo para evitar a aplicação da multa sobre pedidos de restituição - que somam cerca de R$ 10 milhões. Na primeira instância, porém, o pedido foi negado. No TRF da 4ª Região, a maioria dos 15 desembargadores que compõem a Corte Especial entendeu que a pena viola garantias previstas na Constituição Federal. Uma delas seria o direito de pedir. "Diante da possibilidade de lhe ser aplicada a pena pecuniária, produz justo receio, a ponto de desestimulá-lo a efetivar o pedido da compensação a que teria direito", afirma a relatora da arguição de inconstitucionalidade, desembargadora Luciene Amaral Corrêa Münch. De acordo com o advogado tributarista Guilherme Cezaroti, do escritório Campos Mello Advogados, a decisão indica que, para o Fisco, o contribuinte sempre age com má-fé ao solicitar uma restituição ou compensação tributária. "Agora, a Receita só poderá cobrar da Tyson os tributos não recolhidos, corrigidos pela Selic. Nenhuma multa pode ser aplicada", diz. Os desembargadores concordaram ainda que haveria violação ao princípio da proporcionalidade, já que a penalidade é equivalente à metade do valor dos créditos. Além disso, entenderam que os dispositivos da lei questionados pelo contribuinte seriam abusivos por classificar o "mero pedido de ressarcimento ou compensação" como potencial infração. Para tributaristas, esse é o ponto principal do acórdão. "Há imposição de penalidade para o exercício regular de um direito. Não tem lógica", diz o advogado Luiz Rogério Sawaya. O advogado Rafael Nichele, do Cabanellos Schuh Advogados Associados, lembra que a Receita Federal não tem qualquer prejuízo ao negar um pedido de ressarcimento ou compensação. "Por isso, não deve ser aplicada multa", afirma. Para a advogada que representa a empresa no processo, Priscila Dalcomuni, do Martinelli Advocacia Empresarial, é inadmissível que o contribuinte fique sujeito a uma pesada pena pelo simples fato de tentar lutar por um direito. "Temos 290 normas em vigor de PIS e Cofins e muitas dúvidas sobre o que gera ou não créditos", diz. O precedente favorável reforça a ideia da Confederação Nacional da Indústria (CNI) de levar o assunto ao Supremo Tribunal Federal (STF). O departamento jurídico da entidade tem realizado estudos para decidir se entrará com ação direta de inconstitucionalidade (Adin) contra a multa. Há contribuintes que conquistaram vitórias já na primeira instância. Em janeiro, a Justiça Federal em São Paulo proferiu sentença que impede a Receita de aplicar multa aos 51 associados da União Brasileira de Avicultura (Ubabef). De acordo com o advogado que representa a entidade no processo, Fábio Pallaretti Calcini, do Brasil Salomão & Matthes Advocacia, a discussão já foi levada ao TRF da 3ª Região (São Paulo e Mato Grosso do Sul). Procurada pelo Valor, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) preferiu não comentar o assunto.

sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

O líder que literalmente abandonou o barco

Por Vicky Bloch
Professora da FGV, do MBA de recursos humanos da FIA e fundadora da Vicky Bloch Associados


O mundo todo se abalou com a recente notícia do naufrágio do navio Costa Concordia, na Itália. Um transatlântico com mais de quatro mil pessoas a bordo afundando? Hoje em dia? Parecia impensável, mas aconteceu. E por uma bobagem cometida por uma liderança inconseqüente.

Quando comecei a entender o ocorrido, imediatamente remeti o fato ao mundo empresarial.

Francesco Schettino, comandante do navio, ignorou as regras mínimas de risco. Desconsiderou informações. E, mais do que tudo, no auge da crise, reagiu demonstrando que não tinha perfil de liderança. Abandonou o navio quando ainda havia passageiros lá dentro, usou argumentos fracos para justificar sua atitude e, se pensarmos bem, promoveu uma mudança de rota arriscada por um motivo ridículo.

Não foi uma situação emergencial que o fez desviar da rota. Ele simplesmente resolveu fazer uma gracinha com um transatlântico com milhares de pessoas a bordo e deu no que deu.

É possível fazer um paralelo desse caso ao de um CEO de uma empresa que toma decisões ignorando seu meio externo e os riscos que elas implicam - podendo afundar a organização. Um líder jamais pode subestimar um risco, por mais distante que lhe possa parecer. E vejam bem: em 2010, esse mesmo comandante deu uma declaração a um jornal tcheco dizendo que a segurança do passageiro vem acima de tudo. "No navio, deve reinar uma disciplina quase militar. Se aparece uma situação difícil, o comandante deve ter tudo sob controle", disse ele. Me espanta a discrepância entre discurso e prática.

Exemplo emblemático no meio empresarial que ilustra bem esse paralelo com o naufrágio do transatlântico é o caso do Lehman Brothers, banco de investimento que estourou a crise do subprime nos Estados Unidos em 1998. As decisões do CEO à época foram inconsequentes, pensadas no curto prazo, e levaram o banco à maior falência da história americana. Com ele, arrastou outros bancos e levou a uma desconfiança generalizada no sistema financeiro.

Evidentemente existe uma grande diferença do risco nessa minha analogia: no caso do navio, o acidente poderia ter causado uma enorme tragédia com a morte de centenas ou milhares de pessoas caso tivesse ocorrido distante da costa. Já a instituição financeira não colocou a vida de pessoas em risco, mas ainda assim causou um estrago gigantesco: gerou um enorme desemprego e desencadeou uma crise sem precedentes nos EUA e no mundo todo.

Não sabemos os detalhes do episódio do Costa Concordia, mas estou usando essa história para mostrar que, quando um profissional se senta na cadeira de liderança com quinhentas, mil, cinco mil ou quinze mil pessoas abaixo dele. É preciso considerar absolutamente todos os riscos e fazer um plano B para todas as variáveis. E nunca, jamais, fazer gracinhas com a organização.

Será que o comandante tomou essa decisão sozinho? Será que nenhum membro da sua equipe o aconselhou a abortar a ideia de se aproximar da ilha de Giglio? Não sei. Não sabemos se houve desarticulação de equipe, como era a gestão interna das pessoas, se o nível de competência do time estava adequado. Mas sabemos que a decisão foi do líder. Foi, comprovadamente, uma falha humana.

Falha esta que se completou com a atitude covarde do comandante de não voltar ao navio quando ordenado pelo oficial da capitania. "Vá até a proa, suba pela escada de socorro e coordene a evacuação. Você precisa nos dizer quanta gente ainda está lá, se há crianças, mulheres, passageiros, o número exato de cada categoria" - foi a ordem ignorada. Acredito que ele tenha entrado em pânico, perdido o controle emocional, atitude que não pode ser esperada de um comandante. Em uma situação como essa, tem que entrar em cena uma liderança assertiva.

Levanto ainda mais uma lição nessa história que pode ser levada ao ambiente corporativo. Quando profissionais de gestão de pessoas fazem seleção de um executivo, uma leitura que podemos fazer é: em que situação esse profissional saiu das organizações anteriores? Quais foram as condições que ele deixou para trás? Isso pode contar muita história sobre o estilo dele. Se esse executivo tiver abandonado o barco no auge da crise, pode não ser uma boa indicação.