sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

Refis - Prazo para desistir de ações judiciais e recursos administrativos

Lei nº 11.941/2009

A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) e a Receita Federal do Brasil (RFB) informam que foi prorrogado para 1º de março de 2010 o prazo de desistência de ações judiciais e recursos administrativos, para os contribuintes que aderiram ao parcelamento instituído pela Lei nº 11.941/2009 (caput do art. 13 e o § 4º do art. 32da Portaria Conjunta PGFN/RFB nº 6, de 22 de julho de 2009). A prorrogação ocorre porque o prazo final (28 de fevereiro deste ano) incidia em dia não útil (art. 2º da Portaria Conjunta PGFN/RFB nº 13, de 19 de novembro de 2009).

A PGFN e a RFB também registram que a informação de deferimento do requerimento de adesão ao parcelamento da Lei nº 11.941/2009, encaminhada à Caixa Postal do contribuinte ou disponível no aplicativo da Internet de “Opções da Lei nº 11.941, de 2009”, constitui garantia de que os seus débitos serão, a exclusivo critério do contribuinte, incluídos na consolidação do referido parcelamento, com exceção dos seguintes débitos:

a) vencidos após 30 de novembro de 2008;

b) decorrentes de saldo remanescente de outros parcelamentos que não o Refis, Paes, Paex e Parcelamento Ordinário/Simplificado;

c) de CPMF;

d) renegociados pela Lei nº 11.755, de 2008; e

e) apurados na forma do Simples Nacional (Lei Complementar nº 123, de 2006).

Desse modo, excetuadas as situações acima relacionadas, a consolidação do parcelamento da Lei nº 11.941/2009, será concluída conforme as informações prestadas pelo próprio contribuinte, inclusive no que diz respeito aos débitos que deverão compor o referido parcelamento.

Lojistas cobram mais para vender com cartão

Adriana Aguilar, para o Valor, de São Paulo
26/02/2010

Com o objetivo de diminuir os riscos de inadimplência, algumas redes de lojas optaram por vender produtos exclusivamente via cartão ou dinheiro, não aceitando cheques. A medida, além de proteção contra calotes, permite parcelamento do pagamento. Os comerciantes, porém, não devem repassar ao consumidor os custos operacionais cobrados pelas administradoras de cartões. A prática é condenada pelas entidades de defesa do consumidor.

A rede de lojas Zelo, especializada em cama, mesa e banho, com 37 lojas espalhadas por São Paulo, Rio de Janeiro, Curitiba e Brasília, deixou de aceitar cheque pré-datado em 1998. Desde 2004, não aceita mais nenhum tipo de cheque. "Há cinco anos, a inadimplência na Zelo é zero porque só trabalhamos com cartão e dinheiro. É uma medida de segurança para o consumidor e para nós", afirma o diretor da rede Zelo, Mauro Razuk.

Outra vantagem é a venda parcelada que incentiva os clientes a comprarem produtos de maior valor agregado. "Apesar de o parcelamento ser um custo a mais ao lojista, atrai um número maior de clientes. O lojista tem de saber balancear o custo e a promoção", diz Razuk. Nas vendas com cartões, o lojista só recebe a primeira parcela depois de 30 dias da venda efetuada ao cliente.

Desde maio do ano passado, ArcelorMittal Distribuição também comercializa aços longos e planos via cartão de crédito em 38 unidades de negócios. A siderúrgica espera com isso reduzir a inadimplência e ampliar as formas de pagamento para os clientes.

Atualmente, o cartão de débito ou crédito está presente em 70% do total de vendas dos shoppings centers. O custo para uma rede de lojas pode variar de 1% a 1,5%. "O percentual é expressivo, pois o lojista ainda paga aluguel, condomínio, imposto. Ao final de um ano, a taxa elevada pode até prejudicar o fluxo de caixa e de investimentos", afirma Razuk. "O custo é do lojista e não deve ser repassado ao consumidor, completa Razuk.

A portaria nº 118/94, do Ministério da Fazenda determina que "não poderá haver diferença de preços entre transações efetuadas com uso do cartão de crédito e as que são em cheque ou dinheiro". Mesmo assim, muitos lojistas têm praticado preços mais altos nas compras com cartão, diferenciando os valores em relação ao pagamento em dinheiro ou cheque.

O assunto é polêmico. No Congresso Nacional, há vários projetos de lei defendendo o preço diferenciado. Um deles, o Projeto de Lei do Senado (PLS) 492/2009 quer alterar o Código de Defesa do Consumidor para permitir a fixação de preço diferenciado na venda de bens ou na prestação de serviços pagos com cartão de crédito em relação ao preço à vista.

Na avaliação da coordenadora institucional da Pro Teste, Maria Inês Dolci, é ilegal o repasse de custos operacionais da administradora do cartão ao consumidor. "O cliente da loja já paga a anuidade do cartão. Tem de haver um acordo entre administradoras e lojistas para não usarem o consumidor como massa de manobra para a redução do aluguel das máquinas e das taxas sobre cada compra no débito ou crédito", afirma.

Uma das recomendações da Pro Teste é que o consumidor não aceite preços diferenciados.

Empregados pagam dano moral a empresas

Companhias conseguem reverter acusações e são indenizadas

Adriana Aguiar, de São Paulo
26/02/2010

Um mecânico entrou com uma ação trabalhista contra a Servtec Instalações, empresa de manutenção de ar-condicionado, para cobrar horas extras e buscar indenização por ter sido humilhado por um supervisor, que o teria chamado de preguiçoso por dormir no horário de intervalo. Em outra ação, também envolvendo a empresa, um trabalhador afirmou ter sido demitido sem justa causa, no seu período de estabilidade, quando era membro da Comissão Interna de Prevenção de Acidentes (Cipa). Nos dois casos, no entanto, os condenados foram os trabalhadores. A empresa conseguiu provar que as acusações eram falsas e que teria tido a imagem arranhada perante clientes atendidos pelos ex-funcionários. Com isso, a companhia conseguiu, nos processos, ser indenizada por danos morais.

As decisões mostram que uma situação, que há alguns anos era inimaginável, começa a ganhar corpo na Justiça do Trabalho. Empregados que entram no Judiciário para pedir o pagamento de verbas a que teriam direito têm sido condenados a pagar indenizações por dano moral às companhias onde trabalharam. Dentre as motivações das condenações estão a atribuição de fatos falsos à conduta da empresa, prejuízos à imagem da companhia ou mesmo danos financeiros. "Mas, mesmo que alguns juízes tenham começado a admitir essa possibilidade, parte dos magistrados ainda tem sido relutante na admissão dessas ações", diz a advogada da Servtec, Mayra Palópoli, sócia do escritório Mazza e Palópoli advogados, que já tem outras ações semelhantes na Justiça.

A Servtec conseguiu reverter os dois casos a seu favor. No primeiro, o trabalhador não compareceu à audiência de instrução, levando o juiz a entender que ele se declarou confesso. Assim, o magistrado deu ganho de causa à empresa. Na segunda situação, o ex-empregado admitiu, no decorrer do processo, que renunciou ao cargo de membro da Cipa espontaneamente para assumir uma nova posição em outra empresa. E, como a Servtec provou que a ação ajuizada gerou prejuízos a sua imagem, a juíza da 8ª Vara do Trabalho de Vitória (ES) decidiu reverter a indenização por danos morais em favor da empresa. Neste caso, a condenação foi equivalente a um salário do ex-funcionário, cerca de R$ 1,8 mil.

Nas ações, os juízes, em geral, têm entendido que a pessoa jurídica pode sofrer dano moral , conforme a Súmula nº 227 do Superior Tribunal de Justiça (STJ), de 1999, e o artigo 52 do novo Código Civil, que trata da proteção dos direitos da personalidade das empresas. O dano moral, no entanto, tem que ser comprovado na ação, segundo Mayra Palópoli. Para isso, podem ser citadas rescisões de contratos com outras empresas, a perda de clientes ou até mesmo a divulgação pelo funcionário, por meio da internet, por exemplo, de boatos contra a companhia.

Para o advogado Marcel Cordeiro, do Neumann, Salusse, Marangoni Advogados, é muito comum que o trabalhador faça afirmações inverídicas durante um processo judicial, já que ele acaba não sofrendo nenhuma penalidade por isso. "A ação por dano moral, então, seria uma espécie de contra-ataque possível nesses casos", afirma. Segundo ele, é muito mais fácil caracterizar o dano moral sofrido pela empresa do que processar o ex-funcionário por litigância de má-fé. "No dano moral, basta comprovar o prejuízo efetivo."

Casos de empregados que difamaram a companhia em sites de relacionamento, como o Orkut

Justiça aplica multa a trabalhador por má-fé

Laura Ignacio, de São Paulo
26/02/2010

A ideia de que a Justiça do Trabalho enxerga apenas as razões do empregado tem perdido força à medida que se veem julgamentos que condenam ex-empregados a pagar multas às companhias pela chamada litigância de má-fé - caracterizada por pedidos ilícitos em uma ação ou por reiterados recursos infundados no processo. Recentemente, a 12ª Vara do Trabalho de São Paulo concedeu a um trabalhador o benefício da Justiça gratuita. No entanto, o condenou a pagar uma multa de 1% e indenização de 20%, ambas sobre o valor da causa, por litigância de má-fé. Pela decisão, o ex-empregado deverá pagar uma indenização de R$ 10 mil à empresa.

A defesa da companhia do setor de mapeamentos foi realizada pelo escritório GMP Advogados. Segundo o advogado da banca Eduardo Máximo Patrício, a empresa pagou plano de saúde para o ex-empregado por dois anos após o seu desligamento da empresa, na qual atuou por 17 anos. O ex-empregado ajuizou uma ação para receber horas extras, que não teriam sido pagas, e alegou que a companhia não havia pago o plano de saúde ao qual teria direito. "Apesar da tendência em proteger o trabalhador, a Justiça trabalhista reconheceu a má-fe", diz o advogado.

O desembargador federal do trabalho Sérgio Pinto Martins, do TRT da 2ª Região em São Paulo, afirma que hoje é comum as condenações por litigância de má-fé de trabalhadores. "A litigância de má-fé muitas vezes é imposta pelo juiz, mesmo se ter havido o pedido pelo advogado do empregador", afirma o magistrado.

Turmas do Tribunal Superior do Trabalho (TST) já condenaram empregados por litigância de má-fé. Os tribunais regionais federais também vêm julgando nesse sentido. No fim de janeiro, por exemplo, o Tribunal Regional do Trabalho (TRT) da 2ª Região condenou o sócio de uma cooperativa, que prestava serviço para uma empresa da área de informática, a arcar também com multa por má-fé . Ele foi demitido depois de trabalhar para a empresa entre 2002 e 2005. Segundo a advogada que representou a empresa no processo, Daniela Beteto, do Trevisioli Advogados, apesar dele ter começado a trabalhar em outro lugar na sequência da demissão, pediu na Justiça o direito a receber seguro-desemprego. "Esse foi um dos fatores que demonstrou violação ao princípio da lealdade processual, que é a obrigação de atuação das partes com boa-fé para a obtenção de fins lícitos", afirma Daniela. No caso, a condenação foi de multa de 1% e indenização de 2% do valor da causa.

quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

SEC vota pela convergência às normas internacionais

Jesse Westbrook e Ian Katz, Bloomberg, de Washington
25/02/2010

A Securities and Exchange Commission (SEC), a comissão de valores mobiliários dos Estados Unidos, informou que vai dar andamento ao plano que poderá levar as companhias do país a operar sob as normas internacionais de contabilidade (IFRS, na sigla em inglês) até 2014.

O órgão, em votação por cinco a zero, reiterou ontem o apoio a padrões contábeis que possam incluir companhias dos EUA e de fora do país, embora tenha ressaltado que não decidirá sobre o prazo para essa mudança até o próximo ano.

Em 2008, a SEC propôs um guia para deixar que as companhias com valor de mercado acima de US$ 700 milhões abandonem os padrões dos EUA (conhecidos pela sigla "US Gaap") até 2014. Essa proposta havia sido divulgada antes de Mary Schapiro tornar-se presidente da SEC, em janeiro de 2009.

"Precisamos considerar e deliberar cuidadosamente se tal mudança está dentro dos melhores interesses dos investidores e mercados dos EUA", disse Schapiro, ontem, em reunião em Washington. "Se decidirmos que tal mudança atende a esses interesses, também precisaremos dar um tempo suficiente de transição para os que preparam as demonstrações financeiras e para os que as usam."

A General Electric e a Câmara de Comércio dos EUA defendem a adoção dos padrões internacionais, sob o argumento de que as regras mundiais tornariam mais fácil para as empresas levantar dinheiro e ajudariam os investidores a comparar os balanços de empresas locais e de fora do país.

O Conselho de Investidores Institucionais, que representa fundos de pensão americanos, por sua vez, questiona se as normas internacionais dariam proteção suficiente aos acionistas.

Calor faz indústria atrasar venda de ovos de Páscoa

Faturamento, no entanto, deve crescer, já que 85% do movimento se concentra no fim de março.

Lílian Cunha, de São Paulo
25/02/2010

Anna Carolina Negri/Valor

Bertagnon, da Village: Colombas já estão nas prateleiras desde a semana passada, mas chocolates só chegam agora
Há um ano, os supermercados já estavam lotados de "parreiras" de Ovos de Páscoa. Mas quem foi fazer compra nos últimos dias sentiu falta da decoração de chocolate. A maior parte das lojas ainda está com todos os suportes montados, mas sem nenhum produto pendurado. O motivo? As altas temperaturas dos últimos dias. Para evitar perdas com ovos derretidos, a indústria resolveu atrasar a entrega, que em 2009 começou a ser feita antes mesmo da 4ª feira de Cinzas.

"O calor está assustando", diz André Matz, gerente comercial da chocolates Neugebauer. "Não adianta distribuir agora porque vai haver perda. Assim como os agricultores, agora a indústria só toma decisões com base na meteorologia. " Por isso, a venda no varejo dos chocolates começa, na maior parte das lojas, a partir de amanhã, quando as temperaturas devem baixar um pouco.

"A temperatura média deve cair um grau no Sudeste. Depois do dia 3 de março até o dia 9, as médias deverão cair um pouco mais", diz a meteorologista Caroline Vidal do Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos (CPTEC).

Para manter suas características e qualidade, o chocolate precisa ser comercializado em temperatura máxima de 25º C, segundo Alais Fonseca, gerente de marketing da Top Cau, que além de sua marca fabrica para vários supermercados. "Mesmo colocando as parreiras sobre as geladeiras de produtos refrigerados, a umidade prejudica o produto", diz ela.

Lojas com ar condicionado, claro, levam vantagem. "Estamos procurando escapar de pontos de venda com condições de temperatura inadequada", diz Metz. Nesse quesito, levam vantagem produtoras como a Cacau Show e a Kopenhagen, que comercializam seus chocolates com exclusividade em suas lojas próprias. Nas 260 lojas da Kopenhagen - onde a temperatura é controlada para ficar entre 18°C e 22°C, os ovos já estão expostos, assim como nas 800 lojas da Cacau Show, que aumentou sua produção em 42% e espera faturar 50% mais que na Páscoa anterior.

A Kraft Foods, dona da marca Lacta, também está esperando o calor amainar. E considerou as altas temperatura para definir a estratégia de marketing. Dona de 34,6% das vendas na Páscoa anterior, a empresa está lançando o ovo Chicabom, inspirado no picolé da Unilever, e o "Era do Gelo 3" com fator "Gela Boka". "É um ingrediente que oferece sensação de refrescância ao consumidor", diz Eduardo Caldas, diretor de marketing de chocolates da companhia. "A lembrança do sorvete também dá essa ideia. Sabemos que muitos consumidores colocam o ovo no congelador por uns momentos antes de comer para ter um chocolate mais durinho e fresco", afirma.

A Village, que produz ovos e colombas pascais , iniciou na semana passada a distribuição dos bolos. Mas está esperando para distribuir os ovos. "A colomba não derrete e não sente o calor ao contrário dos chocolates", diz Reinaldo Bertagnon, principal executivo da Panificadora Cepam, dona da Village.

Já a Mars não está muito preocupada, pois seu produto tem características diferentes. "No M&M, nosso carro chefe, o confeito que envolve o chocolate protege o produto de grandes temperaturas", diz Valdir Nascimento, gerente de marketing e de negócios da companhia. Ele espera vender 30% mais em volume que no ano passado. Outras fabricantes, como a Arcor, também estão otimistas. A empresa argentina projeta 10% de crescimento em volume. A Kraft, deve passar dos 21 milhões de ovos de 2009 para 23 milhões. Na Village, a expectativa é vender 40% mais em volume. Na Neugebauer, a meta é crescer 14% em volume. Mas e o calor? Ele não afeta as vendas? "Os últimos dez dias antes da Páscoa concentram 85% das vendas. A última semana fica com 75%", explica Caldas, da Kraft. E, segundo a meteorologia, no fim de março, as temperaturas devem cair.

Carrefour vai acelerar expansão no Norte e NE

Claudia Facchini, de São Paulo
25/02/2010

Os Estados do Norte e Nordeste serão prioritários para a expansão no Brasil do Carrefour. As duas regiões representam 17% das vendas grupo no mercado brasileiro e já superam a participação da região Sul no faturamento. Com os investimentos em logística que foram realizados recentemente, o diretor do Carrefour no Brasil, Túlio Bolzoni, afirma que o Norte e Nordeste passarão a ter um peso ainda maior nas vendas.

Depois de abrir no ano passado um centro de distribuição em Recife (PE), a multinacional francesa inaugurou um ontem um depósito em Manaus (AM), no qual foram investidos R$ 27 milhões. A varejista construiu o seu primeiro depósito central no Nordeste há cinco anos, em João Pessoa (PB).

O grupo já possui seis hipermercados na capital amazonense, o maior número em uma capital brasileira depois de São Paulo (SP) e Belo Horizonte (BH) e é esperado que leve outras bandeiras para a região, como o Atacadão ou os supermercados Carrefour Bairro.

Nos últimos cinco anos, o Carrefour decidiu concentrar investimentos em sua eficiência logística. Além de reduzir custos, a melhora gestão dos estoques permite reduzir os níveis de ruptura (falta de mercadoria) nas lojas. "Nesse período, abrimos um centro de distribuição por ano", disse Bolzoni.

Só nos últimos três anos, 50% da malha logística da varejista no país passou por algum tipo de melhoria. A multinacional francesa enfrentou problemas operacionais no início dos anos 2000, após entrar no setor de supermercados no Brasil.

Receita esclarece matéria equivocada da Folha de São Paulo (Notícias RFB)

Sobre a matéria "Fisco blinda grandes grupos em ano eleitoral", publicada na Folha da S. Paulo em 21 de fevereiro de 2010, a Receita Federal do Brasil esclarece que a Portaria Sufis nº 3.324, de 23 de dezembro de 2009, não é sigilosa, mas de ampla divulgação no âmbito interno na Receita Federal, como ocorre com diversos outros atos legais, que são publicados no Boletim de Pessoal e disponibilizados na intranet da instituição. Exemplo disso, são as portarias anuais que estabelecem metas de execução de procedimentos de fiscalização. Esse tipo de assunto, por óbvio, jamais é publicado no Diário Oficial da União.

A Portaria em questão trata de metas para a área de programação da fiscalização, ou seja, estabelece um cronograma para, de forma metodológica, viabilizar a troca de experiências entre as unidades da Receita na seleção de contribuintes, sobretudo em relação aos de maior capacidade contributiva. Trata-se de uma inovação.

A Receita esclarece também que a referida portaria sequer se refere ao ano-calendário de 2010, mas de metas de contribuintes que serão fiscalizados em 2011. Logo, a chamada sensacionalista da matéria de que o "fisco blinda grandes grupos em ano eleitoral" é absolutamente infundada.

Não será o comando da Receita que selecionará previamente os grandes contribuintes que serão fiscalizados, tão pouco caberá essa incumbência aos órgãos centrais da Receita, instalados em Brasília. A seleção de contribuintes é atividade desenvolvida a partir da especialização dos Auditores-Fiscais envolvidos nessa atividade, que estão lotados em órgãos regionais (Superintendências) e, sobretudo, nas unidades locais (Delegacias), a quem compete e continuará competindo a responsabilidade final pela seleção de quem será objeto de procedimento de fiscalização.

Nem mesmo a afirmação de que as Delegacias estarão impedidas de agir isoladamente é verdadeira, pois, mesmo após a conclusão dos procedimentos de seleção, que ocorrerão durante o ano-calendário de 2010, as unidades poderão acrescentar até 20% ao número de contribuintes selecionados, desde que ocorram fatos supervenientes.

A vantagem do novo modelo está em proporcionar o intercâmbio das boas práticas de seleção entre as diversas áreas de programação, permitir que Auditores-Fiscais com especialização em identificar indícios em determinados segmentos possam estender seu conhecimento para outras Delegacias ou Regiões Fiscais. Até a edição da Portaria, esse conhecimento ficava restrito à Delegacia na qual o Auditor-Fiscal estava lotado. Ou seja, a seleção de contribuintes de maior capacidade contributiva deixa de ser geográfica e passa a ser por especialização.

A informação de que a Portaria estaria por "limitar", "inibir", "engessar" e "retirar a autonomia" do trabalho do fiscal revela total desconhecimento quanto ao referido ato. A seleção, seja ela nos moldes atuais, para o ano-calendário de 2010, seja para os procedimentos que serão executados em 2011 (disciplinados na Portaria) continuam a ser executados por Auditores-Fiscais, que são as autoridades com competência técnica e legal para definir o que é relevante em termos tributários a fim de ensejar o início de um procedimento de fiscalização.

Em resumo, a diferença básica no modelo de seleção dos grandes contribuintes que serão fiscalizados em 2011 é a de que, no novo modelo, os Auditores-Fiscais das diversas Delegacias de uma Região Fiscal terão de trabalhar em grupo para trocar experiências, identificar e adotar as boas práticas de seleção. Mais do que isso, a Portaria permitirá que os Auditores-Fiscais incumbidos da seleção possam se especializar cada vez mais nos diversos segmentos e operações econômicas, fato que isoladamente em uma Delegacia não é possível.

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

Boleto bancário

A 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que os bancos não podem cobrar tarifa para a emissão de boleto bancário ou ficha de compensação. Por unanimidade, os ministros entenderam que a cobrança é abusiva. A decisão foi tomada em recurso apresentado pelo ABN Amro Real e Banco do Nordeste do Brasil contra acórdão do Tribunal de Justiça do Maranhão (TJMA). Acompanhando o voto do relator, ministro Luis Felipe Salomão, a 4ªTurma reiterou que, como os serviços prestados são remunerados pela tarifa interbancária, a cobrança pela emissão de boleto constitui enriquecimento sem causa por parte das instituições financeiras, pois há "dupla remuneração" pelo mesmo serviço, importando em vantagem exagerada dos bancos em detrimento dos consumidores, conforme dispõe os artigos 39 e 51 do Código de Defesa do Consumidor (CDC). Em seu voto, o relator ressaltou que cabe ao consumidor apenas o pagamento da prestação que assumiu junto ao credor, "não sendo razoável que ele seja responsabilizado pela remuneração de serviço com o qual não se obrigou, nem tampouco contratou, mas que é imposto como condição para quitar a fatura recebida."

Fisco desconta dívida de precatório

A Emenda Constitucional nº 62 autoriza Fazenda a realizar compensação

Adriana Aguiar, de São Paulo
24/02/2010

Os contribuintes devedores que têm créditos a receber da União, Estados ou municípios não terão mais outra alternativa senão quitar os débitos pendentes, por meio de compensação. Até então, eles podiam optar por receber os valores devidos - com precatórios - e manter a dívida existente. Agora, respaldadas pela Emenda Constitucional nº 62 - a chamada Emenda dos Precatórios -, as Fazendas públicas podem colocar em prática neste ano essa nova estratégia de cobrança.

A nova lei - que alterou a forma de pagamento de precatórios no fim de 2009 - permite que os entes públicos façam uma espécie de encontro de contas com o contribuinte, independentemente de sua escolha. Ou seja, se uma empresa tem dívidas a pagar, esses valores podem ser diretamente descontados pela União, por exemplo, do montante a receber em precatório. A obrigatoriedade do uso da compensação, no entanto, só vale a partir da vigência da nova emenda.

A mudança impede que os contribuintes simplesmente recebam os valores a que têm direito e paguem o débito da forma que achar conveniente. Possibilidade assegurada pela jurisprudência dos tribunais em julgamentos anteriores à emenda. "Mesmo com decisão que garanta a restituição por precatórios, entendemos que a emenda deverá ser aplicada na prática. O que deverá resultar na compensação no momento da expedição do título, caso haja dívida", afirma o procurador-adjunto da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), Fabrício Da Soller.

Pelo menos para os débitos federais, os aspectos práticos de como esses "descontos" serão efetuados já estão sendo estudados em conjunto com a Receita Federal, segundo Da Soller. "Ainda teremos que envolver nessa discussão o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) ou o Conselho da Justiça Federal (CJF), já que a expedição dos precatórios envolve o Poder Judiciário. Mas acredito que isso será possível em breve", diz. Para o procurador, não faz sentido que um contribuinte receba o que lhe é devido e continue inadimplente.

A ideia de realizar a compensação de precatórios por parte das Fazendas já era esperada por advogados tributaristas, que também atuam na área de precatórios - mesmo com o julgamento recente na 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) de um recurso repetitivo que deu ao contribuinte a opção entre a restituição ou compensação do precatório com tributos. Isso porque, o parágrafo 9º , artigo 1º da EC nº 62, estabelece que no momento da expedição dos precatórios, independentemente de regulamentação, deles deverá ser abatido, a título de compensação, o valor correspondente aos débitos líquidos e certos, inscritos ou não em dívida ativa e constituídos contra o credor original pela Fazenda Pública devedora. Nesse caso, estão incluídas as parcelas a vencer de parcelamentos, ressalvados aqueles cuja execução esteja suspensa em virtude de contestação administrativa ou judicial.

Com a edição da emenda, o advogado Eduardo Diamantino, do Diamantino Advogados Associados, acredita que a aplicação da decisão do STJ fica limitada a discussões anteriores à EC 62. Para ele, "a compensação, que até então era uma garantia do cidadão contra o Estado mau pagador, agora virou arma do Estado contra o cidadão". Antes da mudança de legislação, estava em vigor a Emenda Constitucional nº 30, segundo a qual se o Estado não pagasse o precatório, o contribuinte poderia tentar a compensação tributária. "Nessa época a Receita Federal não queria admitir a compensação e entendia que deveria haver a edição de lei complementar para que isso pudesse valer", diz Diamantino. No entanto, segundo ele, o Estado agora só quer pagar se realizar a compensação com supostas dívidas do credor. "Isso representa uma inversão total."

O advogado Nelson Lacerda, do Lacerda & Lacerda Advogados, também concorda que haverá uma movimentação ainda maior pelo abatimento da dívida. "A Emenda nº 62 trouxe ainda mais força para que isso comece a ocorrer. Ainda que muitos já optassem pela compensação, já que os precatórios demoram anos para serem recebidos", afirma.

Vendas no varejo sobem 5,9% em 2009, aponta IBGE

Rafael Rosas, do Rio
24/02/2010

A acomodação das vendas do varejo em dezembro não impediu que o volume negociado no comércio fechasse o ano com alta expressiva de 5,9% em 2009. Para o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o recuo de 0,4% entre novembro e dezembro, na série com ajuste sazonal, não representa uma reversão na trajetória de alta. A queda foi a primeira para um mês de dezembro desde os -0,5%, em 2003. "Vínhamos com sete meses de alta. O resultado de dezembro não quer dizer que haja uma nova tendência", afirmou Reinaldo Pereira, da coordenação de serviços e comércio do IBGE.

Segundo o economista, se não fosse a turbulência internacional, o volume de vendas poderia ter subido na casa de dois dígitos no ano passado, depois de avançar 9,1% em 2008. Apesar da desaceleração entre 2008 e 2009, Pereira considerou positivo o resultado do ano passado. "O ano foi terrível para outros segmentos. Acredito que o resultado foi razoável", disse, lembrando que 2009 significou o sétimo ano seguido de avanço nas vendas do varejo. Para ele, contribuíram para a alta ao longo do ano a inflação baixa, o aumento da renda, a redução do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) e o crescimento do emprego.

O crescimento do volume de vendas no ano passado foi puxado pelo setor de hiper, supermercados, produtos alimentícios, bebidas e fumo, que subiu 8,3%, contribuindo com 67,8% da alta do comércio em 2009. No comércio varejista ampliado, que cresceu 6,9% no ano passado, o destaque ficou por conta de veículos e motos, partes e peças, com avanço de 11,1%, respondendo por 52,2% de todo o ganho do varejo ampliado.

"Isso mostra que a política de desoneração fiscal do governo, com a redução do IPI, foi um sucesso", destacou Pereira, lembrando que o volume de vendas de material de construção, também beneficiado pelo IPI menor, cresceu 16,8% na comparação de dezembro de 2009 com igual mês do ano anterior, embora no acumulado do ano tenha havido queda de 5,9%.

Pereira observou que o resultado anual mostra o aquecimento do setor no quarto trimestre. Entre outubro e dezembro, o volume de vendas no varejo subiu 8,8% na comparação com igual período de 2008, quando a crise internacional estava no auge.

terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

Corretoras revisam expectativas para Lojas Renner após balanço

Eduardo Campos - Valor

23/02/2010 13:26

SÃO PAULO - A Lojas Renner surpreendeu os investidores com lucro líquido recorde de R$ 100,3 milhões no quarto trimestre de 2009. A soma representa um aumento de 53,4% sobre os R$ 65,4 milhões embolsados ano antes.

Seguindo a divulgação dos resultados, algumas corretoras reavaliaram os modelos de análise para a companhia. O UBS incorporou os resultados trimestrais e o resultado foi uma alta no preço alvo de R$ 45,00 para R$ 49,50. A recomendação para o papel é de "compra".

Já o Morgan Stanley reiterou o rating "overweight", ou acima da média do mercado, e preço alvo de R$ 46,00 por ação. "Conforme demonstrado no quarto trimestre, há risco de crescimento nas margens conforme as vendas se recuperarem, o que faz da Renner o papel de precificação mais atraente no segmento de consumo do Brasil", disse a instituição em relatório.

A Bradesco Corretora, mesmo com os resultados superando suas estimativas, manteve a nota do papel em "marketperform", ou média do mercado, com preço alvo de R$ 35,00. No entanto, os analistas não descartam revisar em breve essas estimativas.

Para a Link Investimentos, em linhas gerais os números foram bons e devem trazer um bom momento para as ações da companhia no curto prazo. No entanto, a corretora ainda acha que o potencial de valorização do papel no longo prazo é mais limitado e, por isso, manteve o rating "underperform", ou abaixo da média de mercado, para o ativo ON da varejista.

Para os analistas da Itaú Corretora os resultados renovaram a confiança no potencial de valorização da companhia e, por essa razão, elevaram a nota para "outperform". O preço alvo também foi revisado, passando de R$ 44,60 para R$ 52,50.

Anteprojeto de lei sobre terceirização no Brasil

Carlos Zangrando é gerente do departamento trabalhista do escritório Décio Freire & Associados, membro do Instituto dos Advogados Brasileiros, membro do Instituto Brasileiro de Direito Social Cesarino Júnior e professor da Fundação Getulio Vargas, no Rio de Janeiro
23/02/2010

No início deste ano, o ministro do Trabalho, Carlos Lupi, anunciou o envio ao Congresso Nacional de um anteprojeto de lei, pretendendo regulamentar a "terceirização". O ministro ressaltou a necessidade de regulamentar a terceirização de modo a proteger os empregados, e ainda afirmou que estava se dando um importante passo para a melhoria da vida dos trabalhadores brasileiros.

Em nosso Curso de Direito do Trabalho (LTr, 2008), definimos terceirização como um "neologismo criado para explicar um negócio jurídico complexo, no qual uma empresa contrata os serviços especializados de outra, que os prestará, normalmente, por intermédio de seus empregados."

Não se trata, realmente, de um "instituto jurídico", na acepção científica da expressão, mas sim de uma mera estratégia de administração empresarial, por intermédio da qual uma empresa contrata e delega serviços a terceiros, a fim de propiciar uma maior racionalidade na produção. Sua utilização, aliás, é encontrada desde tempos imemoriais.

Existem vantagens administrativas, econômicas e operacionais com a terceirização : a empresa passa a ter maior disponibilidade para concentrar sua atenção no processo produtivo e na sua melhoria contínua. Porém, inúmeras foram as péssimas experiências ocorridas no passado, o que deixou a mancha indelével da fraude, hoje automaticamente associada com a simples menção da palavra terceirização.

Em face do vácuo normativo, o Poder Judiciário trabalhista foi chamado a se pronunciar. Hoje tudo o que temos para orientar o julgador e o intérprete são as orientações da Súmula Tribunal Superior do Trabalho (TST) nº 331. Entretanto, apesar dos esforços da jurisprudência, a verdade é que a terceirização não se conforma a um conceito jurídico preciso.

A razão desse insucesso é a teima em buscar uma definição jurídica, pela criação de uma série de dogmas jurisprudenciais, quando o fenômeno na verdade diz respeito à técnica de administração de empresas.

A grande maioria dos juristas brasileiros insiste em conceituar a "licitude" da terceirização sob os parâmetros imprecisos do tipo de "atividade" (atividade-fim ou atividade-meio) que é transferida para o prestador de serviços, não conseguindo verificar que, de fato, o gênero da atividade não constitui em si mesmo um requisito para a ocorrência do fenômeno. Este se apresenta, sim, como um processo de racionalização da produção, de modernização contínua e de fomento à produtividade.

E mais. Verifica-se claramente, por trás das linhas da jurisprudência e da doutrina, uma clara intenção de se criar um modelo de "ilicitude" fundada em simulacros, e com isso expurgando de nosso sistema econômico as empresas prestadoras de serviço, tal como párias.

Pior ainda, são as atabalhoadas tentativas de regulamentar juridicamente essa simples estratégia administrativa.

O projeto de lei feito em "parceria" pelo Ministério do Trabalho e Emprego, e as Centrais Sindicais, por exemplo, se baseia em vários desses simulacros. Logo se inicia vedando a "contratação de serviços terceirizados na atividade fim da empresa tomadora de serviços" (artigo 2º).

Os conceitos de "atividade-meio" e "atividade-fim" recendem ao tempo em que se discutia o que era "causa" e "efeito" na atividade produtiva.

Nas empresas modernas, não há grande interesse da definição da causalidade; tendo em vista que tais concepções só são realmente válidas para sistemas mecânicos.

A empresa moderna é um sistema orgânico, em que uma série de eventos são combinados para formar diversas conexões, as quais se alternam, sobrepõem ou se combinam e, dessa maneira, determinam a textura do próprio sistema.

Mais adiante, o anteprojeto exige uma verdadeira carrada de documentos, cria procedimentos e estabelece obrigatoriedades burocráticas, que levam a empresa tomadora de serviços a quase substituir a prestadora, na administração dos seus bens e de seu pessoal (artigos 3º , 4º e 5º).

Logo depois, contudo, o mesmo anteprojeto parece lançar à inutilidade absoluta toda a burocracia que impõe, pois que determina a "solidariedade" nas obrigações, de todas as naturezas, entre tomador e prestador de serviços, no que diz respeito aos empregados desta última (artigo 6º).

Com efeito, essa solidariedade não é outra coisa senão um convite para que as empresas prestadoras de serviços cometam todo tipo de vilipêndio aos direitos de seus empregados, pois que haverá um sentimento de "irresponsabilidade", já que sempre contarão com um "pato" para pagar a conta, qual seja, o tomador de serviços. E essa é apenas uma das inúmeras consequências perniciosas dessa trágica opção legislativa.

A Organização Internacional do Trabalho (OIT) relata que a demanda pela mão de obra apresenta decréscimo, em todo o mundo, nas últimas três décadas, e podemos antever uma diminuição ainda maior. Hoje, por exemplo, já se exige do candidato a qualquer emprego uma especialização técnica mínima, o que já torna grande parte da população mundial simplesmente inimpregável (fonte: Global Risks 2010 - A Global Risk Network Report - World Economic Forum, janeiro/2010). Na atualidade, apenas a atividade de prestação de serviços permite, ainda que parcialmente, a absorção dessa mão de obra.

Não há a menor dúvida que a terceirização deve ser regulamentada, porém de tal modo que favoreça a atividade produtiva, crie novos empregos e assegure os direitos de todos os trabalhadores, impedindo e punindo as eventuais fraudes. Porém, nada disso será conseguido com uma norma jurídica que, bem analisada, revela-se ineficiente, sob quaisquer parâmetros, contendo falsos preceitos, e que será provável causadora de prejuízo ao bem-estar social.

Quem deseja legislar, deve se lembrar continuamente da lição do velho poeta Horácio: leges sine moribus vanae (se faltar a moral, a lei é inútil).

Governo pode instituir cobrança por nova lei

De Brasília
23/02/2010

Apesar de o Supremo Tribunal Federal (STF) ter julgado inconstitucional o Funrural, a cobrança pode voltar a ser instituída. Uma das possibilidades mais cogitadas por advogados tributaristas é que a Fazenda volte a cobrar o tributo por meio de lei complementar. O mesmo ocorreu com o Fundo para Investimento Social (Finsocial), cuja cobrança foi julgada também inconstitucional há 19 anos e substituída pela Cofins. Da mesma forma que ocorreu com o Finsocial, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) ressalta que a contribuição para a Previdência não pode deixar de ocorrer na área rural. Por enquanto, a possibilidade é apenas uma especulação.

O Finsocial foi criado em 1982 a partir da cobrança de 0,5% sobre o faturamento bruto das empresas e foi majorado diversas vezes. Em 1991, porém, a Lei Complementar nº 70 criou a Cofins - que manteve a tributação sobre faturamento.

No caso do Funrural, o caminho está ainda mais fácil. Isto porque a norma derrubada pelo Supremo, a Lei nº 8.540, de 1992 - que estipulou a contribuição sobre a produção - é anterior à Emenda Constitucional nº 20, de 1998, que modificou o sistema de previdência social. A emenda passou a admitir a receita como base de cálculo. Ou seja, uma nova lei nos moldes da que foi considerada inconstitucional estaria fundamentada, agora, na Constituição Federal. "Seria um caminho fácil aprovar uma nova lei no Congresso, mas a Fazenda teria de responder pela cobrança feita de forma inconstitucional no passado " , diz o advogado Marcelo Guaritá, sócio do Diamantino Advogados Associados.

A decisão do Supremo pela inconstitucionalidade do Funrural vale apenas para a empresa Mataboi. Para obter o mesmo direito, os interessados devem propor suas próprias ações judiciais - o que ainda não é garantia de sucesso imediato, pois a decisão do STF não é vinculante. Um caminho mais curto seria o Supremo oficiar ao Senado Federal para editar uma resolução que pusesse um fim à eficácia da lei. (LC)

Produtor busca R$ 11 bi do Funrural

Frigoríficos disputam com fornecedores contribuição declarada inconstitucional

Arthur Rosa e Luiza de Carvalho, de São Paulo e Brasília
23/02/2010

Os produtores rurais e as empresas que adquirem a produção agrícola - especialmente os frigoríficos - iniciaram na Justiça uma disputa pelos bilhões de reais que foram pagos nos últimos cinco anos de contribuição ao Fundo de Assistência ao Trabalhador Rural (Funrural), declarada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no início do mês. Os produtores, baseados no entendimento da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), alegam que o tributo foi descontado deles, sobre a receita bruta obtida com a venda da produção. Já os frigoríficos, que conseguiram levar o assunto ao Supremo, argumentam que são os responsáveis - como substitutos tributários- pelo recolhimento da contribuição e devem receber o que foi pago indevidamente.

A PGFN estima que a derrota pode gerar um rombo de até R$ 14 bilhões nas contas da Previdência Social - R$ 11,25 bilhões vêm das contribuições recolhidas entre 2005 e 2009 e R$ 2,8 bilhões representam a perda de arrecadação apenas neste ano. No início do mês, o Supremo julgou um recurso do Frigorífico Mataboi, do Mato Grosso do Sul, e considerou inconstitucional o artigo 1º da Lei nº 8.540, de 1992, que determina o recolhimento de 2,3% da contribuição sobre a receita bruta da comercialização de produtos agropecuários. Por unanimidade, os ministros consideraram que a cobrança só poderia ser instituída por lei ordinária, e não por lei complementar. Além disso, entenderam que haveria bitributação, pois já incide PIS e Cofins sobre a comercialização agrícola.

Além de interromper a cobrança, o governo foi condenado a devolver as contribuições pagas nos últimos cinco anos. No entendimento da PGFN, no entanto, os produtores rurais poderão pleitear na Justiça apenas a diferença entre o valor recolhido nesta nova forma de cálculo e o montante que seria pago pelo modelo original. Até a edição da Lei nº 8.540, a contribuição incidia em 20% sobre a folha de salários dos produtores rurais. "O Supremo não considerou inconstitucional o tributo, mas o seu cálculo", diz o procurador-adjunto Fabrício Da Soller. "E é possível que ainda possamos recorrer da decisão no Supremo."

Para o procurador, as empresas não têm direito de pedir a restituição dos valores recolhidos nos últimos cinco anos, pois são apenas responsáveis por reter e repassar a contribuição à União. "Seria um pedido absurdo. Quem pagou de fato foram os produtores rurais", afirma Da Soller. Ele argumenta que, de acordo com o Código Tributário Nacional (CTN) e a jurisprudência do Supremo e do Superior Tribunal de Justiça (STJ), a ação de repetição de indébito - aquela em que se pede de volta valores pagos indevidamente à Fazenda - só pode ser ajuizada pelo contribuinte. "Nesse caso, é o produtor rural. As empresas poderiam, no máximo, pleitear na Justiça o direito de não mais reter o valor do Funrural", acrescenta o procurador.

Os frigoríficos, no entanto, não concordam com a posição da PGFN e vão brigar na Justiça pela contribuição. "O responsável pelo recolhimento é quem tem direito a recuperar o que foi pago indevidamente. Se o produtor se sentir prejudicado, deve buscar um ressarcimento do frigorífico. E na esfera civil", diz o advogado Moacyr Pinto Junior, do escritório Pinto Guimarães Advogados Associados, que representa a Associação dos Frigoríficos de Minas Gerais, Espírito Santo e Distrito Federal (Afrig). O advogado afirma que já está preparando ações judiciais para suspender a cobrança e recuperar o que já foi recolhido.

O advogado participou recentemente, na sede da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), em São Paulo, de uma reunião sobre o assunto, organizada pela Associação Brasileira de Frigoríficos (Abrafrigo), que representa cerca de 500 pequenas e médias empresas. A entidade espera uma audiência na Receita Federal para defender a extensão da decisão do Supremo para todos os frigoríficos brasileiros. Se o Fisco não concordar, a entidade promete recorrer à Justiça. "Vamos à Justiça pedir uma declaração de inconstitucionalidade para todos os frigoríficos", afirma o presidente da Abrafrigo, Péricles Pessoa Salazar, acrescentando que as ações de repetição de indébito devem ser ajuizadas por cada empresa.

Já a Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes (Abiec), que representa os 11 maiores frigoríficos do setor no país, aguarda a publicação do acórdão do Supremo para orientar suas filiadas. "Acredito que o Supremo deverá se manifestar em relação a quem tem o direito de pedir a restituição", afirma Otávio Cançado, diretor-executivo da Abiec.

Mesmo sem a publicação do acórdão do Supremo, os produtores rurais já buscam a Justiça para recuperar a contribuição. O advogado gaúcho Ricardo Alfonsin deve ajuizar nos próximos dias cerca de uma centena de ações individuais e ações coletivas para a Federação das Associações de Arrozeiros do Rio Grande do Sul (Federarroz) e a Associação dos Criadores de Suínos do Rio Grande do Sul (Acsurs). O advogado Marcelo Guaritá, sócio do escritório Diamantino Advogados Associados, também está ingressando com diversas ações judiciais em nome de produtores rurais e de entidades de classe. Para ele, a estratégia jurídica deve variar em cada caso. O advogado explica que quando a empresa já possui uma discussão judicial em andamento com a Fazenda - como é o caso de muitos frigoríficos -, a estratégia é tentar ingressar na ação como parte interessada. Já para aqueles produtores que comercializam com empresas que não discutem o tributo em juízo, a ideia é ajuizar um processo diretamente contra o governo.

O advogado Allan Moraes, do escritório Neumann, Salusse, Marangoni Advogados, que representa diversas empresas e cooperativas agrícolas, acredita, no entanto, ser possível às empresas ajuizar ações de comum acordo com os produtores rurais. "Os produtores têm dificuldades para comprovar o pagamento do Funrural. Nem sempre o recolhimento está discriminado nas notas fiscais", diz Moraes. O advogado lembra ainda que os produtores, principalmente os de menor porte, normalmente não têm ciência da contribuição quando vendem seus produtos, e há também a questão de dependência econômica para com as empresas, o que pode ser outra barreira para ingressarem com ações judiciais.

A caminho da classe média, com ideias próprias de participação

Ascensão social de milhões de brasileiros não dispensa reformas capazes de dar estabilidade à continuação de um processo que está apenas em seu princípio.

Por João Carlos de Oliveira, para o Valor, de São Paulo
23/02/2010

"A Classe Média Brasileira - Ambições, Valores e Projetos de Sociedade" - Amaury de Souza e Bolivar Lamounier.
Editora Campus. 192 págs., R$ 49,00

Há um fenômeno global e brasileiro de máxima importância social, econômica e política neste início de século: o surgimento de uma nova classe média. Nos países de economia emergente, 400 milhões pertencem a esse segmento e até 2030, estima-se, mais dois bilhões de pessoas serão incorporados. No Brasil, apenas no período entre 2002 e 2008, o conjunto das famílias que ganhavam, em termos reais, entre R$ 1,1 mil e R$ 4,8 mil passou de 44% para 52% da população. Nos anos 2000, cerca de 26,9 milhões de brasileiros foram incorporados à classe C.

A estabilidade econômica, o aumento da renda e a crescente oferta de crédito aproximaram esses brasileiros do padrão de consumo da chamada classe média tradicional - que percebe mais de R$ 4,8 mil por mês de renda média familiar. São esses os fatores que ajudam a explicar o fato de que, hoje, na classe C, 69% têm casa própria, 22% têm carro, 100% têm TV em cores, 89% têm telefone celular, 52% têm computador e 34% têm e usam banda larga. Foi o consumo, enfim, que os incluiu.

Não é por acaso, portanto, que os cientistas políticos Amaury de Souza e Bolívar Lamounier definem que a "classe C deixa de ser 'baixa' e começa a ser 'média'" em livro agora publicado.

O verbo utilizado - "começa" - dá ideia de que o alargamento da classe média no país ainda não se completou. Além disso, eles salientam que o fenômeno de megamobilidade social, vista no Brasil e em outros países de economia emergente, não deve ser analisado como resultado de estratégias individuais de ascensão social, mas como fruto de uma nova estratificação social que se está construindo. Essas transformações repetem processos que levaram os Estados Unidos, por exemplo, a ter 90% de sua população de classe média.

O que não quer dizer que esse crescimento do peso da classe média seja natural ou inevitável. Ao contrário. Entre 1990 e 2004, por exemplo, enquanto a classe média quase dobrava de tamanho na maioria dos países de economia emergente, na vizinha Argentina ela encolhia de 46% para 34%. Ou seja, o processo depende, sim, das escolhas de política econômica, do cenário político e, claro, das circunstâncias.

No texto, os autores defendem a necessidade de o Brasil retomar uma agenda de reformas, para que o processo de alargamento da classe média brasileira não se frustre. Lembram, por exemplo, que a distribuição de renda no país permanece como uma das piores do mundo e que será preciso desmontar as barreiras que separam os setores formal e informal da economia.

O foco do livro não é o debate macroeconômico, mas o que os autores chamam de fatores weberianos ligados à motivação e à autocapacitação (educação, empreendedorismo etc.) e de formação de valores sociais e políticos. Seu conteúdo é o resultado de estudo patrocinado pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), que começou com pesquisas quantitativas e qualitativas realizadas pelo Ibope em novembro de 2008, passou por workshops e foi desenvolvido por Souza e Lamounier. Não faltam artes e tabelas ilustrativas. Pena que todas tenham sido feitas em nuances de preto e cinza, dificultando sobremaneira a leitura.

Em 182 páginas, com sete capítulos e um apêndice sobre estratificação ocupacional, os autores traçam um rico perfil dessa parcela de brasileiros, revelam algumas de suas crenças, comportamentos e valores, debatem o peso econômico e político que podem desempenhar e colocam em questão a sustentabilidade desse processo. Afinal, os brasileiros que compõem a classe C ampliaram seu consumo se endividando (via crédito) e não está claro se terão capacidade para gerar renda no futuro suficiente para manter ou melhorar o padrão de vida recém-conquistado. É sintomático, por exemplo, que o grande temor e preocupação para a maioria (53%) seja mesmo perder renda ou o emprego ou ver falir o próprio negócio.

Entre aspectos que mais cham a atenção no livro está a mentalidade estatista, que os autores frisam ser um dos entraves para o desenvolvimento no país do empreendedorismo. Os entrevistados acreditam que o poder público deve intervir na economia, inclusive controlando preços, e que deve ficar nas mãos do governo a parte dominante da seguridade social (88%), saúde (88%), educação fundamental (87%) e universidades (78%).

A educação continua a ser vista como instrumento fundamental de ascensão social. Mas há grande insatisfação com o sistema educacional, que se manifesta em dois aspectos: aumento da procura por educação profissional e técnica e crescente demanda por uma política de cotas (etnias, pobreza ou estudantes do ensino público) para ingresso na universidade.

Outro aspecto é a política. A arrasadora maioria (entre 92% e 98%, dependendo do nível de escolaridade) avalia que os partidos não se interessam por conhecer as aspirações e preferências do eleitorado; 88% concordam com a ideia de que a política é tão complicada que não se consegue entender o que acontece; e 87% acreditam que tirar proveito é a principal motivação de quem entra na política.

As forças armadas, o governo, o Judiciário, o Congresso e a polícia despertam confiança em menos de um terço dos entrevistados. Somente o presidente Luiz Inácio Lula da Silva se sai razoavelmente, contando com a confiança de mais da metade desses brasileiros menos escolarizados (53%).

Renner tem lucro recorde e planeja dobrar investimento

Com cenário macroeconômico favorável neste ano, companhia volta a avaliar aquisições.

Por Sérgio Bueno, de Porto Alegre
23/02/2010

Nelson Perez/Valor

O lucro líquido recorde de R$ 100,3 milhões apurado no quarto trimestre, com alta de 53% em comparação com o mesmo período de 2008, não só representou 53% de todo o resultado acumulado no ano como dissipou as últimas incertezas da Lojas Renner sobre a recuperação das vendas e dos níveis de desempenho pós-crise global.

Para 2010, diante de um cenário macroeconômico bem mais favorável, a empresa planeja dobrar os investimentos fixos em comparação com 2009, para R$ 140 milhões, o que supera inclusive os aportes de R$ 136,8 milhões realizados em 2008, disse ontem o diretor administrativo e de relações com investidores, José Carlos Hruby.

Os planos da companhia incluem a abertura de 12 novas lojas no país neste ano (seis no primeiro semestre e seis no segundo), ante as dez inauguradas em 2009. Uma delas será aberta na avenida Paulista, em São Paulo, em frente à sede da Federação das Indústrias do Estado (Fiesp), em abril. Até o fim de junho a rede vai estrear em duas novas praças: Maceió e Palmas. Outras dez das 120 unidades atuais serão reformadas, e a Renner vai ainda ampliar os aportes em tecnologia e logística.

"O ano de 2009 transcorreu num nível bem mais positivo do que se desenhava no fim do ano anterior e estamos muito otimistas para 2010", afirmou Hruby. A expectativa da empresa é fechar este exercício com uma taxa de crescimento de vendas nas mesmas lojas superior ao nível de 1,4% apurado em 2009 e também com melhores indicadores operacionais (lucro antes de resultado financeiro, impostos, depreciação e amortização - lajida) e margem bruta. Até agora, explicou, "as vendas estão se desenvolvendo de acordo com as previsões mais otimistas para 2010".

O cenário mais tranquilo também recoloca no horizonte da Renner a possibilidade de adquirir o controle de uma rede de varejo no país. Em 2008, a empresa chegou a negociar a compra da Leader, com sede no Rio de Janeiro, mas com o estouro da crise o negócio foi abortado.

"Acreditamos que o mercado brasileiro no nosso segmento vai passar por uma consolidação, com a Renner como compradora", comentou o diretor. Hruby afirmou que a rede está "avaliando" ofertas feitas por bancos de investimentos, mas não deu detalhes e disse que é "prematuro" prever qualquer prazo para uma operação desse tipo.

No quarto trimestre do ano passado, a Renner apurou receita líquida de R$ 778,8 milhões, 15,6% a mais do que no mesmo período de 2008. Só as vendas líquidas de mercadorias subiram 16%, para R$ 711,9 milhões.

As vendas em mesmas lojas avançaram 9,5% e a margem bruta das operações de varejo cresceu de 44,9% para 48,7%, graças a negociações de preços com fornecedores e à melhor gestão dos estoques, disse o executivo. O lajida aumentou 55,8%, para R$ 159,4 milhões no trimestre.

A companhia encerrou 2009 com um caixa líquido de R$ 276,6 milhões, contra R$ 18,2 milhões em dezembro de 2008, devido à redução dos investimentos e do pagamento de dividendos - de 75% para 25% do lucro líquido do ano anterior.

Recentemente, o conselho de administração propôs o restabelecimento da distribuição de 75% do resultado do ano passado, que será avaliado em assembleia de acionistas no dia 22 de abril.

No acumulado do ano, a Renner teve receita líquida total de R$ 2,363 bilhões, com alta de 8,2% sobre 2008, sendo R$ 2,116 bilhões (expansão de 8,2%) em vendas de mercadorias.

As vendas em mesmas lojas avançaram 1,4%, enquanto a margem bruta subiu de 46,4% para 47,5%.

O lajida da companhia no ano passou de R$ 311,4 milhões para R$ 374,2 milhões. O lucro líquido cresceu 16,7%, de R$ 162,4 milhões para R$ 189,6 milhões, e também foi recorde.

No dia 16 deste mês, a rede iniciou as vendas on-line por intermédio de sua página na internet. Por enquanto estão disponíveis produtos de perfumaria, cosméticos, moda íntima feminina e relógio, num total de 2,8 mil itens. Conforme Hruby, nos próximos meses alguns artigos de vestuário, como camisas, além de gravatas, poderão ser incluídos.

"A dificuldade é a padronização dos tamanhos", explicou o executivo. Segundo ele, as vendas pela internet deverão equivaler, em 2010, ao faturamento de uma loja física recém-inaugurada.

Ainda para o primeiro semestre a Lojas Renner prevê o início da distribuição dos cartões híbridos com as bandeiras Visa e Mastercard. A expectativa, disse Hruby, é que no primeiro ano cerca de 1 milhão de plásticos sejam entregues a portadores do cartão próprio da empresa, que tem uma base de 15,2 milhões de usuários, 1,7 milhão dos quais incorporados ao longo do ano passado.

A empresa também espera obter neste ano a licença do Banco Central para abrir um banco próprio, possivelmente a partir de 2011. A instituição vai operar como financeira.

Brasil precisa descobrir a figura do planejador financeiro

Rogério Bastos
23/02/2010

Vem surgindo no Brasil a figura do planejador financeiro, profissional que tem grande importância na vida dos investidores nos mercados desenvolvidos. Nos Estados Unidos, onde a profissão tomou forma e tem hoje maior destaque, cerca de um terço dos investidores usam planejadores financeiros e, destes, 87% declararam que estão tomando decisões melhores em relação a seus investimentos depois que buscaram a ajuda de seus planejadores financeiros. Os dados são da Financial Planning Association (FPA), dos Estados Unidos.

Mas afinal, o que faz um planejador financeiro e por que ter a assessoria de um desses profissionais pode ser importante?

O planejador financeiro tem como principal atribuição ajudar seus clientes a criar e implementar um plano financeiro que lhes permita atingir seus objetivos no longo prazo. Para a montagem desse plano, depois de definidos os objetivos de longo prazo, são examinados diversos fatores.

Os detalhes de um plano financeiro são demasiadamente complexos para expor neste espaço, mais vamos passar pelos principais fatores que devem ser observados na montagem de qualquer plano financeiro: seguros, investimentos e sucessão.

Seguros: Esta é a parte menos óbvia do planejamento financeiro e, infelizmente para aqueles que não lhe dão a devida importância, uma das mais importantes. Ter uma cobertura adequada para os indivíduos e seus bens é parte fundamental do processo de acúmulo de riqueza, pois a ocorrência de eventos não previstos (e não cobertos) nesta fase pode causar um grande prejuízo que coloque em risco todo o acúmulo de riqueza e, por consequência, o planejamento. Tipicamente são analisadas do ponto de vista de segurança e adequação as coberturas dos seguros de saúde, vida (e acidentes pessoais), residência, carros e outros bens de valor.

Sucessão: Aqui devem ser alinhados os objetivos de longo prazo dos indivíduos e famílias com os planos de sucessão. No caso típico, o planejamento de sucessão pode não só evitar surpresas e despesas desnecessárias num evento de sucessão, mas também longos inventários e até brigas na família se bem planejados e executados. A utilização de veículos de investimentos alinhados com a sucessão é peça chave de qualquer plano financeiro, afinal a ideia é ter patrimônio para viver bem e passar para as próximas gerações.

Investimentos: A análise dos objetivos e do perfil de risco do cliente é o ponto de partida para esta que é, sem dúvida, a parte mais importante de qualquer plano financeiro. A escolha dos investimentos mais adequados passa, entre outros, pelos seguintes aspectos: perfil de risco, tributação, liquidez, rentabilidade e custos. A eficiência e a imparcialidade do planejador financeiro são da maior importância e têm grande impacto no retorno de longo prazo. Com a queda da taxa de juros reais observada no Brasil ao longo dos últimos anos, a escolha dos investimentos adequados para atingir os objetivos do longo prazo dos indivíduos e famílias passa a ser decisiva no sucesso de qualquer processo de planejamento financeiro.

Depois de preparado, amplamente discutido com o cliente e sua família e acordado, o plano financeiro deve ser implementado e monitorado constantemente, com ênfase especial na carteira de investimentos, para tomar ações corretivas sempre que ocorrerem desalinhamentos em relação ao plano original.

Também é importante revisar o plano, pelo menos uma vez por ano, ou quando houver qualquer alteração nos objetivos de longo prazo, uma vez que tais alterações podem ter impactos significativos sobre a implementação do plano.

Caso você esteja pensando "mas isso não é para mim!", saiba que apesar do foco do planejamento mudar em função da sua situação financeira atual, renda e idade, o planejamento financeiro tem grande utilidade na vida de todos.

No Brasil a profissão de planejador financeiro ainda não é reconhecida oficialmente. Porém, a exemplo do que ocorre no resto do mundo, já existe um processo de certificação de profissionais de planejamento financeiro que tenham notório saber na área (verificado através de um exame rigoroso aplicado pelo IBCPF - Instituto Brasileiro de Certificação de Profissionais Financeiros) que concede-lhes o direito de uso da marca CFP (Planejador Financeiro Certificado). Uma lista desses profissionais está disponível no site do IBCPF: www.ibcpf.org.

Rogério Bastos é sócio da FinPlan Consultoria e Gestão de Investimentos e Planejador Financeiro certificado pelo Instituto Brasileiro de Certificação de Profissionais Financeiros (IBCPF)

E-mail: rbastos@finplan.com.br

O euro ameaçado

Antonio Delfim Netto é professor emérito da FEA-USP, ex-ministro da Fazenda, Agricultura e Planejamento
E-mail: contatodelfimnetto@terra.com.br
23/02/2010

A nuvem escura que se formou sobre o euro deve lembrar-nos de três raras verdades sobre as taxas de câmbio: 1) o "trilema" das economias abertas (também conhecido como "trindade impossível") mostra que nenhum país pode manter taxa de câmbio fixa com liberdade de movimento de capitais e, simultaneamente, realizar a política monetária mais conveniente para seus objetivos; 2) nenhum sistema de câmbio é o "certo" para todos os países durante todo o tempo; e 3) que a liberdade de movimento de capitais foi contrabandeada alegremente para dentro da teoria econômica como uma extensão, não justificada, das vantagens comparativas nas transações de bens e serviços nesta proposição logicamente impecável.

A última encontra grande resistência nos economistas financeiros e na academia, que acreditam no "equilíbrio geral". Nunca é demais reafirmar que John Williamson, que organizou o Consenso de Washington, recusou-se a incluí-la, a despeito dos protestos de Stanley Fischer, economista-chefe do FMI. Aliás, a primeira recomendação do Consenso era que os países em desenvolvimento deveriam manter "taxas de câmbio competitivas"!

A ironia do destino é que, com tempo suficiente, a verdade se revela, a despeito das barreiras do interesse mesquinho e do contrabando ideológico que tentam escondê-la. Um novo documento do FMI mostra que este aprendeu com a crise. Em particular tornou-se muito mais cuidadoso com relação às supostas virtudes da liberdade irrestrita dos movimentos de capitais para os países emergentes e recomenda que o cuidado com eles deve ser tanto maior quando mais sofisticado for o sistema financeiro.

O grande "escândalo" para os mercadistas fanáticos é que já não se condena "a priori" a regulação daquele movimento. O nosso Banco Central vai ter que se reciclar. Justamente agora ele parece pretender transformar o Brasil num grande centro financeiro internacional, promovendo a mais completa conversibilidade do real...

Para entender as dificuldades enfrentadas pelos 16 países da União Europeia (UE) que utilizam o euro como moeda comum, é preciso lembrar o longo e tortuoso caminho percorrido desde o fim da Segunda Guerra Mundial pela França e pela Alemanha para superar seu estranhamento secular, que sempre esteve na base dos conflitos europeus. Esse objetivo político dominou a construção da UE, que foi incorporando outros países que se sentiriam desconfortáveis com possível "dominação" pela França e a Alemanha unidas. Deu-se razoável conforto a todos na construção do Parlamento Europeu, onde cada um tem voz proporcional à sua importância no conjunto.

A possibilidade de sucesso desse arranjo institucional politicamente aceitável está apoiada na criação de uma moeda única, construída aritmeticamente pelo estabelecimento de uma relação definitiva, numa data fixada, entre as moedas de cada país (franco, marco, lira etc.) e a nova moeda, o euro, cujo valor é controlado pelo Banco Central Europeu. Em poucas palavras, a adoção do euro retira dos países o controle sobre sua política monetária e sobre a política cambial. Esta passa a ser um regime de câmbio fixo com relação à moeda comum.

Para funcionar bem, esse arranjo deve ser acompanhado pela completa mobilidade dos fatores (mão de obra e capital), ou seja, é preciso que a "região" satisfaça as condições de uma Área Monetária Ótima (AMO), o que acabaria nivelando salários e as taxas de retorno do investimento. No nível médio, esses países viram a taxa de juros de sua dívida convergir para a da virtuosa Alemanha. E a política fiscal dos membros, que é a única coisa que lhes restou? Sobre ela criaram-se normas absolutas: os déficits fiscais de cada país não deveriam exceder 3% do PIB e a dívida pública/PIB não deveria exceder 60%.

Onde mora o perigo na UE? De um lado na confiança entre os parceiros. Há uma eterna tentação dos governos de iludir o velho Luca Paciòli (1445-1517) fantasiando a sua ciência. O que se sabe agora sobre a Grécia e a Goldman Sachs não é tranquilizador a esse respeito. Dos 16 países do euro, 12 estão sendo "investigados" (auditados) pela UE por suspeita de contabilidade "criativa". Sem controle fiscal não há AMO que resista.

Por outro lado, a taxa de câmbio efetiva do país depende da evolução interna dos salários e da produtividade, o que desloca as correntes de comércio. A Alemanha, por exemplo, tem "desvalorizado" sistematicamente sua taxa de câmbio com relação aos parceiros, controlando o aumento da sua taxa de salário. Em 2010 e 2011, praticamente congelará os aumentos dos salários em troca da garantia de emprego. A nuvem escura a que nos referimos está estampada na tabela abaixo, que revela as "expectativas" para 2010 quando comparadas com o que exige a CEE.

O problema é o mesmo de sempre: os efeitos de rede! Esses cinco países têm exposição bancária da ordem de US$ 3,5 trilhões (EUA, Reino Unido, França, Alemanha, Suíça), igual ao PIB nominal da China em 2008. Um "default" da Grécia pode levar à destruição do euro e a uma crise do tamanho da de 1929, que só foi resolvida com a Segunda Guerra. Destruiria essa "joia política" garantidora da paz na belicosa Europa. É por isso que ela vai ser salva por seus parceiros, mas não sem ter que se ajustar dolorosamente.

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

É preciso um tipo de capitão para enfrentar cada desafio

É preciso um tipo de capitão para enfrentar cada desafio
Leonardo Toscano e Roberto Amatuzzi são sócios da Excelia
22/02/2010

Como todo organismo vivo, uma empresa também nasce, cresce, amadurece e morre. A missão dos executivos e o desejo dos acionistas é fazer com que essa vida corporativa perdure. Não podemos garantir que um negócio dure para sempre, mas, no que depende do capital humano, podemos promover transformações que renovem a organização.

A vida de uma empresa pode ser compreendida nesta sequência de ciclos: empreendedorismo; estabilização (e possível queda); recuperação; transformação; nova estabilização; nova transformação e assim sucessivamente. Porém, mais importante do que reconhecer o atual estágio em que se encontra sua empresa é entender que há um perfil de liderança mais adequado para cada um deles.

Existem dois tipos de executivos que atendem aos diversos momentos de uma organização: o líder da estabilização e o agente da transformação. Por mais resistências que se tenha à troca de lideranças, principalmente em empresas de controle familiar, dificilmente esses dois perfis cabem numa só pessoa. Não se trata de mudar o capitão conforme o vento, mas de acordo com o desafio.

Assim, o líder dos momentos de estabilização é aquele mais experiente no setor de atuação de sua empresa, que inspira segurança na equipe e no mercado. É mais negociador e mais habilidoso politicamente, porque deve manter o grupo em um rumo constante e sem solavancos. Ele é mais avesso a riscos, pois seu papel é consolidar o que está dando certo. Firma alianças e compromissos de longo prazo com colegas, clientes e fornecedores.

Já o executivo que atua como agente da transformação apresenta uma trajetória de experiências em diferentes contextos, porque sua missão é claramente levar empresas de um estágio a outro. Tem uma capacidade maior para promover melhorias intensas, que muitas vezes não podem ser feitas por um líder muito vinculado ao grupo. Para implementar os projetos necessários, esse líder não pode ter compromisso com o status quo. Com independência e senso de urgência para cumprir sua missão e partir, ele não prioriza uma carreira perene na empresa. Sua realização é obter reconhecimento como transformador.

Podemos comparar a liderança da estabilização a um educador enquanto o agente transformador é como um médico. Vale lembrar, entretanto, que, assim como acontece com as pessoas, as empresas não precisam esperar sinais de doença para procurar um médico. O melhor remédio é sempre prevenir, reconhecendo os diversos estágios da vida e buscando o fortalecimento do organismo ou seu tratamento adequado, antes que seja tarde demais.

Cobrança no varejo tem novos adeptos

De São Paulo
22/02/2010

Enquanto as redes de supermercados que optaram por reduzir o uso de sacolas plásticas vão fazendo a sua substituição por caixas de papelão ou materiais mais resistentes, algumas lojas começam a cobrar por sacolas com mais qualidade. A Fnac Brasil iniciou neste mês o processo gradual de troca das sacolas grandes por um modelo mais resistente. Só que diferentemente do que fazem alguns supermercados, para utilizá-la, o cliente vai ter que pagar R$ 3.

A estratégia está sendo adotada nas lojas da empresa em todo o mundo. A partir de agora, a rede só fornecerá de graça as sacolas plásticas descartáveis médias e pequenas. "Esta é uma sacola que dobra e pode ficar com um tamanho menor. Isso permite que também substitua as embalagens convencionais pequenas e médias", explica Frederico Pabst, diretor de comunicação e marketing da Fnac Brasil.

Hoje, cerca de 40% das sacolas fornecidas pela Fnac são grandes e 60% médias e pequenas.

A decisão pela cobrança das sacolas grandes foi tomada a partir de uma pesquisa de opinião realizada em lojas da empresa na França. Mas de acordo com Pabst, os clientes brasileiros devem aderir à ideia. "Na semana passada, estavam vendendo cerca de mil sacolas novas em cada loja da Fnac na França. Tornou-se uma febre lá. Esperamos um resultado parecido no Brasil", diz Pabst.

A rede Wal-Mart também vende suas sacolas retornáveis mais resistentes ao preço de R$ 2,50, mas a estratégia está integrada a outras ações, como o oferecimento de caixas de papelão para os clientes, e ainda a descontos para quem não usar nenhuma sacola plástica. O desconto corresponde a R$ 0,03 reais a cada cinco itens. Segundo Felipe Antunes, consultor de sustentabilidade do Wal-Mart, o programa já existe nas lojas das regiões Nordeste e Sul e será implantado no Sudeste ao longo de 2010.

"A empresa também incentiva os clientes a retornarem os materiais recicláveis, inclusive as sacolas, para as estações de reciclagem implantadas nas lojas, a fim de garantir o tratamento e uma destinação final mais adequados para estes materiais", explica Antunes.

Do ponto de vista dos consumidores e à despeito dessas iniciativas pontuais, ainda é raro encontrar mercados que oferecem automaticamente alternativas às sacolas plásticas tradicionais. Na maioria das vezes, as opções pelas caixas ou por menos sacolas precisa partir de um pedido explícito do cliente.(A.F.)

Excesso de projetos de lei retarda definição sobre sacolas plásticas

Andreia Fanzeres, para o Valor, de São Paulo
22/02/2010
Paulo Pinto/AE

Em dois anos, três das seis maiores redes de supermercados já aderiram ao programa e receberam uma certificação.

Oito meses atrás, o Ministério do Meio Ambiente (MMA) lançou uma campanha pela redução do uso de sacolas plásticas em todo o país, a fim de incentivar novos comportamentos por parte dos consumidores, além de influenciar Estados, municípios e empresas. A cada dia uma nova empresa estampa sua própria sacola de pano para venda ou então produtos confeccionados em plástico mais resistente. Sem falar nos projetos de lei que asseguram o banimento das sacolas plásticas tradicionais dentro de poucos anos. Difícil é encontrar quem monitore essas propostas e avalie seus resultados para a economia e o meio ambiente.

Para Fernanda Daltro, coordenadora técnica da Campanha "Saco é um saco", do MMA, por mais que seja difícil mensurar a redução de sacolas no país, a iniciativa federal teve o mérito de mexer com grandes redes varejistas, indústrias e imprensa. "Nosso sucesso está em ter fomentado o debate", considera. A parceria com o governo federal é voluntária e as empresas que aderem recebem materiais de divulgação, orientação e devem apresentar metas de redução de sacolas plásticas e informações para o acompanhamento das ações.

De acordo com a campanha, a rede Walmart trabalha com 50% de diminuição até 2013, e o Carrefour com redução de 100% para o mesmo período.





Mas o próprio governo admite que tentar banir o uso das sacolas plásticas é inviável num país que ainda não sabe lidar com seu próprio lixo. Segundo o MMA, menos de 10% dos municípios brasileiros dispõem de coleta seletiva (o que reduz a necessidade do consumo de sacolas plásticas) e apenas 3% têm sistemas de compostagem de resíduos orgânicos em operação. "No momento em que Estados e municípios dizem que vão banir as sacolas plásticas, precisam dar ao cidadão um sistema de coleta que o faça não depender tanto delas para destinar o lixo em casa, senão as pessoas vão continuar precisando das sacolas dos supermercados", diz Fernanda Daltro.

É exatamente isso que têm comprovado pesquisas de opinião encomendadas ao Ibope pelo setor de plásticos, em 2007 e 2009. "75% das pessoas consideram a sacolinha a melhor maneira de transportar seus produtos e 100% dos entrevistados responderam que usam sacolas plásticas dos mercados para o lixo em casa", disse Paulo da Colina, diretor do Instituto Nacional do Plástico (INP). A solução para o MMA é a implantação da Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), que está pronta e se arrasta há 18 anos em tramitação no Congresso.

Entre outros pontos, a PNRS institui a obrigatoriedade de coleta seletiva e a compostagem como gestão de resíduos sólidos no Brasil, tirando das prefeituras a escolha sobre o modo mais conveniente de destinação do lixo. Além disso, determina a implantação da logística reversa, em que os fornecedores sejam responsáveis por seus produtos e embalagens, reincorporando-os ao ciclo de produção, começando de imediato com itens como pilhas, baterias, pneus, lâmpadas e eletroeletrônicos e agrotóxicos.

"No médio prazo vejo que precisaremos usar incineradores de resíduos que produzem energia elétrica com auxílio do plástico como combustível. Os gases são tratados nesse processo, que já existe em países como Alemanha, Japão e EUA", diz Paulo da Colina, do INP. Por enquanto, apesar dos números apresentados pela iniciativa privada na redução do uso de sacolas, não existe monitoramento dos aterros e lixões para avaliar os impactos dessas medidas.

Para o setor industrial, não é o plástico o vilão dessa história. Por isso, em 2007, foi lançada uma campanha para que as sacolas plásticas continuem sendo usadas, mas sejam mais resistentes e passíveis de reutilização. A iniciativa é fruto da parceria do INP com a Associação Brasileira da Indústria de Embalagens Plásticas Flexíveis (Abief) e a Plastivida Instituto Sócio-Ambiental dos Plásticos. Em dois anos o programa reduziu em cerca de 16,6% a quantidade de sacolas plásticas nos supermercados.

Respeitando a norma 14.937 da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), as sacolas que tiverem espessura mínima de 0,027 milímetros poderão receber um selo de qualidade do INP. "A nossa sacola carrega 3 garrafas de pet de 2 litros cada uma", exemplifica da Colina.

Segundo ele, em dois anos, três das seis maiores redes de supermercados do Brasil já aderiram ao programa e receberam uma certificação. Antes de trocar as sacolas tradicionais pelas mais resistentes, o INP desenvolve projetos piloto e fornece treinamento para os funcionários dos mercados como estratégia de conscientização dos clientes sobre os benefícios da nova sacola. Só com comunicação, a campanha estima gastar mais de R$ 19,6 milhões até o ano que vem.

Dezenas de municípios já instituíram por lei a obrigatoriedade do banimento das sacolas plásticas tradicionais, admitindo, entretanto, sacolas dos tipos biodegradáveis e oxibiodegradáveis. "Sacola oxibiodegradável é balela. É uma aberração técnica e mostramos com base em dados científicos que isso pode trazer impactos ambientais ao longo do tempo", afirma da Colina. Ele explica que este tipo de plástico se transforma em pó por causa da oxidação, produzindo uma poluição invisível na água, no solo e no ar, não podendo ser reciclado e tampouco rastreado devidamente no ambiente.

Ao contrário disso, a Fundação Verde, do Paraná, defende as oxibiodegradáveis enquanto não se usam sacolas retornáveis, por agredirem menos o ambiente e poderem se degradar em 18 meses, enquanto outros tipos de plásticos demoram cerca de 500 anos para desaparecer. "Quem faz críticas é quem defende o direito de continuar produzindo o plástico e não quer resolver o problema da poluição. Começamos a divulgar os benefícios das sacolas oxibiodegradáveis em 2005, com base em laudos científicos e diversos estudos", diz Ana Domingues, fundadora da instituição.

Segundo ela, pesquisas nacionais e internacionais comprovam que esse tipo de sacola não faz mal e consegue se degradar no ambiente em qualquer situação, não apenas em condições específicas, o que é a base da maioria das críticas que recebe. "Nós temos que confiar na tecnologia, sair da Idade Média e ter responsabilidade", completa ela. Segundo a Fundação Verde, 20% de toda sujeira gerada no país é plástico e metade disso vem das sacolas. Ainda de acordo com a fundação, somente as redes Carrefour, Walmart e Pão de Açúcar produzem 450 milhões de sacolas plásticas por mês.

A Associação Paranaense de Supermercados (Apras) afirma que entre 50% e 70% de todas as sacolas comercializadas no Paraná são hoje oxibiodegradáveis, graças a um termo de cooperação firmado entre os cerca de mil associados com a secretaria estadual de meio ambiente, em 2005, recomendando o uso desse tipo de sacola. Empresas como C&A e rede Atacadão, também aderiram a esta ideia.

O sindicato das indústrias de plástico tem entrado com ações de inconstitucionalidade contra as leis que defendem as sacolas oxibiodegradáveis e biodegradáveis. Só no Estado de São Paulo, 80% das leis que saíram sobre o tema tiveram por liminar a sua aplicação suspensa, de acordo com Colina, do INP. Segundo um levantamento entregue ao MMA em 2009, há pelo menos 41 projetos de lei em tramitação no Congresso para regular o uso de sacolas reutilizáveis, biodegradáveis e oxibiodegradáveis no mercado. E outras 26 leis em vigor sobre este assunto no país.

Universidades e centros de pesquisa têm desenvolvido plásticos biodegradáveis com sucesso, mas em escala experimental. "Não há no mundo resina biodegradável que já atenda à demanda de produção de sacolas plásticas, usando amido e derivados vegetais, por exemplo. A produção é pequena e o custo é alto. Nenhuma prefeitura pode fazer uma lei que obriga o mercado a usar um produto que não existe", afirma Colina.

STJ autoriza compensação com créditos de PIS e Cofins

Valores podem ser usados para pagar qualquer imposto federal

Laura Ignacio, de São Paulo
22/02/2010

Anna Carolina Negri/Valor

A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) pacificou o entendimento de que é possível fazer a compensação de créditos do PIS e da Cofins com débitos - vencidos e a vencer - de qualquer tributo federal, como o Imposto de Renda (IR). Por unanimidade, os ministros entenderam, no entanto, que a compensação só pode ser feita se na época do ajuizamento da ação estivesse em vigor lei que permitisse a operação. Para os ministros, não há importância o teor da lei em vigor na época em que foi gerado o crédito. Por ter efeito de recurso repetitivo, os tribunais regionais federais (TRFs) devem seguir o posicionamento da Corte. Com a decisão, as empresas com ações judiciais sobre o tema, de acordo com advogados, terão um desfecho mais rápido no Judiciário.

A discussão foi aberta por causa das inúmeras mudanças legislativas sobre os critérios para a compensação tributária. A Lei nº 8.383, de 1991, limitava a compensação entre tributos da mesma espécie - PIS com PIS, por exemplo. Depois, a Lei nº 9.430, de 1996, permitiu a compensação de tributos distintos, que dependia de autorização prévia da Receita Federal. Em 2002, a Lei nº 10.637 passou a possibilitar a compensação de tributos administrados pela Receita, mediante a entrega de uma declaração. Cinco anos depois, a Lei nº 11.457 vedou a compensação de créditos federais com débitos previdenciários.

A empresa que teve o recurso julgado pelo STJ é do setor imobiliário. Ela ajuizou a ação em 2005 para obter o direito à compensação. De acordo com o voto do ministro relator, Luiz Fux, na época do ajuizamento da demanda estava em vigor a Lei nº 9.430, com as alterações da Lei nº 10.637, "sendo admitida a compensação entre quaisquer tributos e contribuições administrados pela Secretaria da Receita Federal, independentemente do destino de suas respectivas arrecadações".

De acordo com o advogado Alexandre Siciliano, do escritório Lacaz Martins, Halembeck, Pereira Neto, Gurevich & Schoueri Advogados, que representa a empresa no processo, o STJ vinha decidindo nesse sentido repetidamente. "Com a decisão, os recursos especiais com essa discussão sequer subirão ao STJ, desafogando o tribunal e facilitando a vida das empresas", afirma. A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) informou que não recorre mais nesses casos.

Há quem discorde, no entanto, do entendimento do STJ. O advogado Adolpho Bergamini, do escritório Martins, Chamon e Franco Advogados e Consultores, por exemplo, defende que deveria valer a lei vigente na época da compensação. "Assim, sobrevindo nova legislação, valeria esta", argumenta. Mas há também quem usará a decisão para tentar compensar o crédito tributário com débito de contribuição previdenciária. Para a advogada Luciana Mazza, do escritório Mazza e Palópoli Advogados, como o relator fala em "independentemente da destinação", haveria a possibilidade de realizar a operação, apesar da vedação prevista na Lei nº 11.457. "Com a unificação, a contribuição previdenciária passou a ser também administrada pela Receita Federal", diz.

Para acelerar a compensação, o advogado Eduardo Botelho Kiralyhegy, do escritório Negreiro, Medeiros & Kiralyhegy Advogados, explica que a empresa, com o posicionamento do STJ, não precisa esperar por uma decisão judicial. O contribuinte pode quitar o que deixou de pagar e posteriormente exigir a compensação administrativamente. "Basta que, ao fazer a compensação, aplique a lei em vigor na época do ajuizamento da ação", afirma. Mas é preciso colocar tudo na ponta do lápis porque, nesse caso, o contribuinte deverá recolher, no ato, o que deixou de pagar acrescido de multa de 20%. "E se já tiver sido autuado, deverá pagar ainda a multa de ofício de 75%", diz Kiralyhegy.

Sadia foi primeira a revelar o uso de derivativos "tóxicos"

De São Paulo
22/02/2010

A Sadia foi a primeira a divulgar perdas de grande porte com contratos derivativos que, mais tarde, se mostraram disseminados pela economia. Era 25 de setembro de 2008, pouco mais de dez dias após a quebra do banco americano Lehman Brothers. A crise se instalava de vez. O dólar, que já vinha subindo, iniciou uma escalada e terminou 2008 a R$ 2,34. No dia seguinte, a Aracruz também comunicava ter sofrido perdas, que depois chegaram perto de R$ 5 bilhões.

Aos poucos, o mercado descobria que diversas companhias possuíam exposição a tais instrumentos, sendo grande parte delas de médio porte e de capital fechado.

Nunca houve um número oficial que contabilizasse todas as perdas, mas estima-se que no momento mais grave da crise o prejuízo potencial tenha alcançado R$ 30 bilhões. Por essa razão, tais contratos foram apelidados de "tóxicos".

Entre as companhias que também sofreram prejuízos estavam a Votorantim Industrial, com R$ 2,2 bilhões, a sucroalcooleira de capital fechado Santa Elisa , com cerca de R$ 380 milhões, e a varejista do setor têxtil Hering, que conseguiu renegociar as operações com baixo impacto no caixa. O setor sucroalcooleiro como um todo sofreu prejuízo estimado em R$ 4 bilhões.

Os bancos distribuíram essas operações e ofereceram a clientes que não tinham nenhuma exposição à variação cambial e, portanto, não tinham razão para se proteger da volatilidade da moeda. Muitas vezes, estavam vinculadas à concessão de crédito e vinham como forma de redução do custo do dinheiro, que chegava a ficar significativamente abaixo do CDI.

Os contratos que trouxeram perdas expressivas tinham, em sua maioria, um mecanismo que duplicava o compromisso cambial com o banco. Começaram a ser oferecidos em 2007 e se proliferaram em 2008.

O objetivo inicial das empresas que contratavam era ganhar ou se proteger da contínua queda do dólar. Daí a maior adoção por grandes exportadoras como Sadia e Aracruz, que tinham 50% e 95% das receitas atreladas ao dólar, respectivamente. A operação funcionava como uma banda cambial, mas com ganhos limitados e perdas imprevisíveis e ilimitadas.

Na prática, a companhia adquiria o direito de vender dólar ao banco por um preço acima do mercado. Assim, maximizava a receita de exportação, que vinha perdendo com a valorização do real.

Mas havia um teto estabelecido para isso e, caso o dólar subisse e ficasse acima dessa faixa, a empresa era obrigada a vender duas vezes mais dólar ao banco por um preço preestabelecido. Nesse cenário, a companhia acabava tendo que comprar a moeda no mercado por um preço superior ao que venderia ao banco, o que resultava em perda de caixa - não só de marcação a mercado.

A ausência de um banco de dados transparente sobre essas operações gerou pânico no mercado após as perdas anunciadas por Sadia e Aracruz. O cenário motivou os dois principais reguladores do mercado a emitir normas novas.

A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) passou a exigir que as empresas detalhassem em nota explicativa, nos balanços, a exposição a diversos riscos, com um quadro de sensibilidade - mostrando como as operações se comportariam em três cenários.

Além disso, o Banco Central (BC) e a CVM começaram a exigir o registro desses contratos, principalmente na Cetip. (GV)

Caso da Sadia expõe riscos da profissão de conselheiro

Governança: Profissionais exercem pouco função de fiscalizar a administração executiva.

Por Graziella Valenti, de São Paulo
22/02/2010

Rogério Pallatta/ Valor

Desde que os episódios com derivativos começaram a pipocar, a atuação dos conselheiros de administração foi parar na vitrine. A discussão em torno das responsabilidades e dos riscos da profissão só aumentam. A expectativa é que a acusação da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) aos membros do colegiado, por conta das perdas financeiras, desperte ainda mais atenção para o tema.

"Os conselheiros são guardiões do patrimônio dos acionistas", afirma Alexandre Di Miceli, coordenador do Centro de Estudos em Governança (CEG). "Mas, infelizmente, ainda hoje vemos muita desinformação a respeito das responsabilidades envolvidas nessa atuação."

No Brasil, foi apenas nos últimos anos que cresceu o debate sobre o papel do conselho de fiscalizar a administração. Até então, a atuação desse profissional era de recomendações para as grandes linhas de estratégia do negócio.

Nos Estados Unidos, explica Di Miceli, a discussão ocorreu no compasso inverso. Até o fim da década de 90, o foco era totalmente de fiscalização. Foi a partir de 1997 que sugiram os primeiros debates de governança indicando que esses profissionais também deveriam agregar valor ao negócio.

Jairo Saddi, coordenador de direito societário do Insper (ex-Ibmec São Paulo), não é tão otimista quanto à mudança no cenário da profissão. "A formação de um conselho de administração ainda é, na maioria dos casos, uma ação entre amigos. As pessoas sentem-se honradas com um convite desses."

Ele vê questões culturais importantes a serem superadas, como a necessidade de se conviver com críticas e questionamentos mais profundos. "O diabo mora nos detalhes."

A despeito do resultado prático que o caso da Sadia possa gerar na atuação dos conselhos, os especialistas entendem que a atuação da CVM é procedente.

Para Di Miceli, é muito importante que o regulador exponha a situação. Saddi, por sua vez, avalia tratar-se de discussão a respeito de uma possível culpa extra-contratual dos conselheiros, já que o dever de diligência é previsto pela Lei das Sociedades por Ações.

O especialista em direito vê, inclusive, riscos de que o debate continue no Judiciário, após se encerrar na CVM - que cuida da esfera administrativa do problema. "Caso vá para a Justiça, há chance de que os conselheiros sejam solicitados por acionistas minoritários a reparar o prejuízo. A maneira de consertar a culpa nesses casos é por reparação."

Vale destacar, porém, que o Brasil não tem tradição de questionamentos judiciais por minoritários, como há nos Estados Unidos.

Roberto Faldini, um dos ex-conselheiros da Sadia acusado pela CVM, entende que o órgão está cumprindo seu papel. "A gente vai aprendendo." Quando questionado sobre a receita para atuar em conselhos, não titubeia: "Vigilância, vigilância, vigilância."

"Tudo deu perfeitamente errado ao mesmo tempo", afirma ele, sobre o episódio dos derivativos. Faldini não acredita que a profissão ficou mais arriscada. Para ele, os deveres continuam os mesmos.

Alcides Tápias, que está na lista da CVM apesar de ter encerrado sua participação na companhia em dezembro, também não sente maior pressão sobre a profissão. "Só precisamos que a gestão das empresas esteja preparada para fornecer o que é necessário."

A ação de fiscalização do conselho de administração está prevista, inclusive, na Lei das Sociedades por Ações. O colegiado por fiscalizar a gestão dos diretores, examinar os livros e solicitar informações sobre contratos celebrados.

Uma das bandeiras mais recentes do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC) é o desenvolvimento de ferramentas que permitam a avaliação da atuação dos conselheiros. Para o instituto, deve haver um acompanhamento anual desse tipo.

Di Miceli pondera que os ganhos que a Sadia apresentava na linha financeira deveriam ter despertado a atenção dos conselheiros para esse tema.

Ainda que nunca tivessem ouvido falar nos derivativos, deveriam ter questionado o cumprimento da política e a quais riscos a empresa estava exposta se o cenário econômico se modificasse drasticamente.

O especialista em governança destaca que mesmo a existência de comitês específicos não diminuem a responsabilidade de fiscalização do conselho.

No caso da Sadia, havia um comitê financeiro e um de auditoria, para assessorar o colegiado. Cassio Casseb, Everaldo Nigro dos Santos, Walter Fontana Filho e Roberto Faldini compunham o órgão dedicado às finanças. Francisco Céspede, Roberto Faldini e José Marcos Konder Comparato formam o núcleo dedicado à auditoria.

Para especialistas, esses profissionais responderão à CVM duplamente, já que os membros de tais órgãos, quando previstos pelo estatuto da empresa, respondem como administradores.

Conselho da Sadia na fogueira

Inquérito da CVM conclui que conselheiros e ex-diretor financeiro faltaram com dever de diligência.

Por Graziella Valenti, de São Paulo
22/02/2010

O episódio dos derivativos da Sadia, que gerou perdas financeiras de R$ 2,6 bilhões em 2008, ainda não terminou apesar de a empresa ter sido comprada pela Perdigão. No começo deste ano, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) abriu processo contra 14 pessoas da companhia por não terem cumprido com seu dever de diligência. Foram acusados todos aqueles que atuaram no conselho de administração em 2007 e 2008, além do então diretor financeiro, Adriano Ferreira.

O regulador começou a investigar os fatos em 6 de outubro de 2008, logo após a companhia ter divulgado em 25 de setembro a existência do problema.

Em 12 de dezembro daquele ano, a autarquia abriu um inquérito administrativo e iniciou uma investigação mais aprofundada.

As acusações foram distribuídas no começo do ano. Os apontados pela CVM pediram mais tempo para defesa. O prazo para os argumentos, que acabaria em 5 de março, foi estendido até 22 de abril.

O caso pode ir a julgamento ou os acusados, que já estão representados por seus advogados, podem propor um termo de compromisso à CVM - que, por sua vez, pode aceitá-lo ou não. A proposta de termo de compromisso deve ser apresentada junto com a defesa ou, no máximo, até 30 dias depois.

Em julgamento, infrações consideradas graves podem ser punidas pela CVM com pena de inabilitação - por até 20 anos - e/ou multa máxima de R$ 500 mil.

A Lei das Sociedades por Ações prevê, em seu artigo 153, que "todo administrador de companhia deve empregar, no exercício de suas funções, o cuidado e diligência que todo homem ativo e probo costuma empregar na administração dos seus próprios negócios". Pela acusação da CVM, todos os conselheiros e o próprio diretor financeiro faltaram com esse dever.

Embora nunca tenha sido demonstrado que o conselho conhecesse e aprovasse as operações, o entendimento é que não houve fiscalização. Já Adriano Ferreira teria colocado a companhia em risco com suas escolhas.

O conselho da Sadia era composto por 11 membros em 2008: Walter Fontana Filho na presidência, ao lado de Diva Helena Furlan e Eduardo Fontana D'Ávila, e dos independentes Cassio Casseb, Everaldo Nigro dos Santos, Francisco Silvério Morales Céspede, José Marcos Konder Comparato, Luiza Helena Trajano, Norberto Fatio, Roberto Faldini e Vicente Falconi. Também receberam termo de acusação Alcides Tápias e Marcelo Fontana, que atuaram no conselho até dezembro de 2007.

A CVM também está apurando as responsabilidades em inquérito sobre o caso da Aracruz, que sofreu perdas próximas de R$ 5 bilhões com contratos semelhantes. No entanto, ainda não houve abertura do processo administrativo contra dirigentes da empresa, como ocorreu na Sadia. O Valor procurou os conselheiros da Sadia ou seus respectivos advogados. Luiz Leonardo Cantidiano, que representa Walter Fontana Filho, não comentou o caso. Nelson Eizirik, à frente da defesa de dez dos 14 acusados, também não se pronunciou.

Alcides Tápias destacou que sua atuação na empresa se encerrou em dezembro de 2007, embora seu sucessor só tenha sido eleito pela assembleia em abril. "Não há nenhum documento meu assinado na empresa em 2008, quando essas operações foram fechadas." Casseb, que assumiu a vaga de Tápias, também preferiu não falar do processo, mas lembrou que iniciou sua atividade em maio de 2008 - quando parte dos contratos já estava em curso e apenas quatro meses antes da eclosão dos problemas financeiros.

Ao longo de um ano e meio acompanhando o caso, o Valor teve acesso a diversos documentos, conversou com os envolvidos e participou da assembleia da Sadia que decidiu pela abertura de um processo contra o ex-diretor financeiro, após apresentação do relatório feito pela firma de auditoria BDO sobre as operações.

A Sadia possuía uma estrutura peculiar desde 2005, quando Gilberto Tomazzoni assumiu a presidência da empresa. À época o principal executivo fora das famílias controladoras era Luiz Gonzaga Murat, que foi preterido na escolha, mas, como prêmio de consolação, ganhou a condição diferenciada de se reportar diretamente ao conselho de administração, ou, mais especificamente, a seu presidente, Walter Fontana.

Em nota sobre o atual processo, o ex-executivo da Sadia afirma considerar sua acusação fruto da estrutura hierárquica da empresa, pois era o único que se reportava ao conselho. "Eu era subordinado ao presidente do conselho na Sadia." Tal estrutura - e o acúmulo de funções por Ferreira, que também era responsável por fusões e aquisições e desenvolvimento corporativo - acabou criando um ambiente favorável para que o departamento financeiro fosse menos fiscalizado. As análises de risco e os relatórios eram todos produzidos internamente e quase sempre a cadeia de comunicação terminava no próprio diretor financeiro.

Vale lembrar que a Sadia sempre demonstrou vocação para explorar a área financeira, ao ponto de em 2007 ter decidido que a corretora Concórdia deveria expandir sua atuação e se tornar um banco. A companhia estava trabalhando nesse projeto quando veio a crise. Em outros momentos da última década, a empresa já tinha apresentado ora perdas ora ganhos financeiros significativos com uma gestão arrojada de seu caixa. Mas, em nenhum momento, a continuidade do negócio esteve em risco como no caso dos derivativos.

O próprio Adriano Ferreira, em sua primeira manifestação pública após a demissão, disse que 80% do lucro do primeiro semestre de 2008 - R$ 337 milhões - vieram dos ganhos com os derivativos de risco. A nota explicativa do balanço de junho, a última disponível antes do anúncio do prejuízo, já mostrava uma posição vendida em dólares líquida de US$ 2,9 bilhões.

Mais de uma vez, conselheiros manifestaram seu desconhecimento a respeito do risco de as operações dobrarem de tamanho. Pessoas próximas à investigação dizem que não há provas de que o colegiado conhecesse a real exposição da companhia. As apresentações de Adriano Ferreira ao conselho e ao comitê financeiro costumavam ser breves, em torno de 15 minutos. Ferreira afirmou nunca ter sido questionado a respeito da condução da política financeira.

A BDO, contratada após a crise, afirmou, em assembleia de acionistas de abril de 2009, que havia 133 contratos de derivativos de risco na empresa. Desses, 28 foram fechados sem respeito às alçadas dos diretores e gerentes financeiros. Além disso, o modelo de derivativo que passou a ser usado a partir de meados de 2007 nunca foi submetido ao conselho porque não havia esse tipo de prática dentro da companhia.