segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

Web leva exame da ambulância ao hospital

Governos investem em sistemas para acelerar diagnóstico, principalmente de doenças cardíacas

Cibelle Bouças, de São Paulo
22/02/2010

Davilym Dourado/Valor

Disritmia cardíaca, dor no peito, nos braços e pescoço, tontura, enjoo, suor, falta de ar... Sintomas de problemas cardíacos preocupam a todos, principalmente porque podem aparecer a qualquer momento, às vezes longe de um hospital. Dados do Ministério da Saúde revelam que em torno de 300 mil pessoas morrem a cada ano em decorrência de doenças cardiovasculares. Do total de óbitos, 50% ocorrem no trajeto entre a residência e o hospital, seja pela demora nos primeiros socorros, seja pela falta de um diagnóstico preciso.

Para reduzir esses índices, órgãos públicos estão apostando na telemedicina para tornar mais eficaz o diagnóstico de doenças do coração. Municípios dos Estados de São Paulo e do Paraná estudam adotar tecnologias de telemedicina nos próximos meses, seguindo um caminho trilhado pela Prefeitura de São Paulo, a primeira a investir em aparelhos de tele-eletrocardiografia digital, em 2008. O governo federal também já anunciou que vai equipar 3,8 mil ambulâncias no país nos próximos três anos, com os aparelhos para eletrocardiograma a distância. A tecnologia é importada, mas existem iniciativas para que a produção seja feita no Brasil.

Hoje, a principal tecnologia visada pelo serviço público é a tele-cardiografia digital. O aparelho que registra as variações dos batimentos cardíacos é produzido pela israelense Card Guard Scientific Survival e pode ser conectado a telefones comuns, celulares ou computadores. É dessa maneira que os dados são transmitidos via internet, independentemente de onde seja feito o exame. O resultado é, então, acessado na central hospitalar por meio de um software desenvolvido por empresas nacionais, como a Epeople e a ITMS do Brasil.

A expectativa é de que, em breve, toda a tecnologia usada seja nacional. A Epeople e a Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) obtiveram, em novembro, R$ 1,2 milhão em recursos da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) para desenvolver dois projetos: um protótipo de tele-eletrocardiógrafo digital brasileiro e um sistema para realização de ultrassonografia digital a distância.

O protótipo em desenvolvimento será semelhante ao aparelho importado já usado no Brasil, mas terá algumas inovações. O sistema, diz o diretor-presidente da Epeople, Euclides Barros Júnior, terá tecnologia de comunicação de terceira geração (3G) e poderá enviar os dados por conexão sem fio. "O software está quase pronto e a modelagem do protótipo está em andamento", afirma o executivo. A expectativa da empresa é de que o projeto seja colocado no mercado até 2011.

A Epeople foi a empresa contratada pela Prefeitura de São Paulo para implantar o sistema de cardiografia a distância, há um ano e meio. À época, a empresa, que produz software para a área médica, optou pelo eletrocardiógrafo importado por ser o único que permite a conexão por telefone fixo. "Existe um similar nacional, mas que é acoplado a um celular. Nas regiões onde não há sinal, ele não é tão útil", observa Barros Júnior.

Outro projeto em andamento é o desenvolvimento de todo o sistema para ultrassonografia a distância, incluindo o aparelho que faz o exame. A solução segue os mesmos moldes da telecardiografia digital e incluirá a criptografia para o envio das imagens, preservando o sigilo do paciente. A Epeople já possui um software para gerenciar as imagens e seu tráfego na internet, que será modernizado com os recursos da Finep. O sistema é usado em hospitais públicos e privados em oito Estados. "No momento, a empresa negocia contratos com 15 prefeituras no Paraná e em São Paulo para a implantação da radiologia a distância ainda neste ano", afirma o executivo.

O Hospital do Coração (HCor) também desenvolve um protótipo de aparelho para a realização da tele-eletrocardiografia digital. Responsável pelo serviço de arritmias do HCor, o cardiologista José Carlos Pachón diz que a primeira experiência foi a criação de um aparelho para monitorar marca-passos por telefone, desenvolvido pela área de tecnologia do hospital na década de 80, quando a telefonia no Brasil ainda era analógica. Mas o aparelho apresentava problemas na transmissão. Nos anos seguintes foi desenvolvido o chamado weblooper, aparelho portátil que registra e envia em tempo real, via internet, os sinais dos batimentos cardíacos. "A partir do ano 2000, com a adoção das linhas digitais no país, desenvolvemos um sistema mais moderno. Esse trabalho deu origem ao projeto do Samu [Serviço de Atendimento Móvel de Urgência]", conta.

Pachón observa que o aparelho desenvolvido pela equipe de tecnologia do HCor possui um celular acoplado e, por isso, as informações só podem ser enviadas onde há sinal de transmissão. Para desenvolver o projeto de inclusão dos tele-eletrocardiógrafos digitais nos Samus de todo o país também foi escolhido o equipamento importado de Israel. O sistema que gerencia as informações ficou a cargo da ITMS do Brasil.

A parceria entre o HCor e o Ministério da Saúde foi anunciado no fim de janeiro e tem por meta atender 1.347 municípios em três anos, alcançando um universo de 106 milhões de pessoas no país. O investimento será de R$ 6,9 milhões em equipamentos e treinamento. Para a primeira fase, foram adquiridos 450 kits (com o eletrocardiógrafo e um celular), distribuídos em 37 cidades de dez Estados. O Ministério da Saúde dispõe de 1.445 ambulâncias em funcionamento e pretende colocar nas ruas mais 1.850 unidades neste ano. O objetivo é equipar todas as ambulâncias com esse serviço.

"O projeto abre espaço para a adoção, no futuro, de outras tecnologias de telemedicina", afirma o coordenador geral do serviço de urgência e emergência do Ministério da Saúde, Clésio Mello, que visualiza a inclusão, em médio prazo, de exames de sangue e ultrassom nos mesmos moldes. Hoje, os exames feitos nas ambulâncias são analisados em tempo real por uma equipe de 16 médicos do laboratório de telemedicina do HCor. O tempo entre o exame e o diagnóstico varia de 5 a 10 minutos. Até o fim do ano, equipes em outros hospitais de referência no país devem aderir ao projeto - entre eles, Albert Einstein, Oswaldo Cruz, Moinhos de Vento, Sírio-Libanês e Samaritano.

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