terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

"O Verdadeiro Poder" - Vicente Falconi.

Tudo começa com um olhar honesto para os fatos

Edson Pinto de Almeida, para o Valor, de São Paulo
09/02/2010

"O Verdadeiro Poder" - Vicente Falconi.

Eugenio Savio/Valor

Duas grandes falhas na produção, tornadas públicas no final de 2009 e no início deste ano, arranharam a imagem de quase perfeição construída ao longo de sete décadas pela Toyota, a maior fabricante de carros do mundo. O gesto de seu presidente, Akyo Toyoda, neto do fundador da empresa, vindo a público pedir perdão pelos defeitos que resultaram em "recall" para milhares de carros, é emblemático para o mundo da administração. Imitado por outras indústrias manufatureiras em todo o mundo, o modelo Toyota de produção tem como base uma linha enxuta que elimina desperdícios e atende exatamente a demanda, sem criar estoques desnecessários, e tudo sob o primado da qualidade. Constrangimentos à parte, a questão que fica é: por que falhou? Encontrar resposta para essa pergunta no sentido amplo de um sistema empresarial é a proposta do livro de Vicente Falconi, um dos mais influentes consultores do mercado. Sua especialidade é gestão e no seu currículo de trabalhos perfilam-se grandes grupos, como AB Inbev, Gerdau, Suzano Papel e Celulose, entre outros.

A analogia com a Toyota é meramente casual e por simples coincidência. O livro começa com essa pergunta : "Por que falhamos?" O conteúdo que vem a seguir, resultado de 15 anos de experiência sobre o que deu certo em várias empresas, tem por objetivo mostrar o que está ao alcance das organizações para não errarem e construirem modelos eficazes de gestão. Além de circunstâncias que estão fora de controle, o autor alinha três razões para explicar falhas no gerenciamento: não há definição do problema de forma correta, o plano de ação é ruim, seja por falta de conhecimento técnico ou por desconhecimento dos métodos de análise de informações, ou o plano de ação não foi executado a tempo e completamente.

Numa época de modismos empresariais e manuais de auto-ajuda, Falconi escolheu o caminho do conhecimento. "Escrevi o livro de forma muito densa", para que seja "uma referência para o líder em seu dia a dia, lendo, relendo, discutindo". O livro "contém tudo que eu e meus amigos citados, e que foram meus 20 revisores, vimos como importante para se construir uma empresa excepcional". Dentre eles estão vários executivos e empresários, como Antonio Maciel Neto, presidente da Suzano, Jorge Gerdau Johannpeter, do grupo Gerdau, Carlos Alberto Sicupira, do conselho da AB-Inbev, e Pedro Moreira Salles, do Itaú-Unibanco.

Falconi rejeita nomes comerciais para modelos de gestão e mostra que nada se viu de novo em matéria de método, além daquele criado por René Descartes (1596-1650), com suas regras básicas de verificar, analisar, sintetizar e enumerar. O processo de análise cartesiano prescreve dividir ao máximo as coisas em suas unidades mais simples e estudar essas coisas mais simples. "O livro não dá fórmula para ninguém, mostra os fatores importantes que ajudaram várias empresas a se tornarem excepcionais. São princípios fundamentais, importantes no século XXI, quando a informação é abundante e a essência da competitividade é a capacidade da organização em absorver conhecimento".

A questão do aprendizado é um dos pontos destacados pelo autor. Estabelecer uma cultura empresarial com lideranças consolidadas, processos definidos e um patamar de rotinas que possam ser constantemente aferidos e aprimorados é algo que leva no mínimo cinco anos. "O processo de aprendizado é lento, existem ilhas de excelência e ilhas de resistência dentro das empresas, e pessoas que jamais a aceitarão." Falconi observa que esse é um esforço cumulativo, que exige um nível baixo de rotatividade de pessoal ("turn over"). "É preciso reter as pessoas que detêm o conhecimento." Por essa razão, uma empresa que sai na frente nesse processo dificilmente é alcançada, porque seus concorrentes precisarão levar o mesmo tempo para implantar um sistema de gestão eficiente.

Como, então, conciliar o tempo necessário para que uma cultura seja sedimentada com a urgência de se obter resultados? Para Falconi, as duas coisas devem caminhar juntas. "A cultura é implementada pelo líder no dia a dia, por meio de seus exemplos, da cobrança, do treinamento, entre outros, sem que haja necessidade de maior esforço ou desvios de conduta."

Falconi observa que somente a boa liderança pode alterar significativamente a curva de aprendizado e, consequentemente, os resultados. Para ele, a única definição de liderança que interessa às organizações é: liderar é bater metas consistentemente, com o time e fazendo certo.

Da agenda do líder, dois itens guardam relação com a questão de administrar problemas quando eles surgem. O primeiro é tomar decisões com base em fatos e dados. "Valorize a honestidade intelectual e a busca da verdade contida nos fatos e dados." O outro é promover a cultura de enfrentamento dos fatos, que valoriza a verdade e não tem medo de ver os fatos como são. Espera-se "que os gerentes comuniquem, para o time e para cima, não somente os bons resultados, mas também o que não está indo bem e precisa ser encarado como é, de tal modo que possa ser consertado."

Carisma e liderança são coisas que podem funcionar num primeiro momento de mudanças numa organização. Mas não é o ideal a ser perseguido. "Líderes carismáticos sempre existirão, sempre que houver a necessidade de tê-los. Empresas maduras e estabilizadas não precisam de líderes carismáticos porque se organizam para recrutar, selecionar, avaliar e classificar líderes de tal maneira que tenham sempre pessoas prontas a ocupar o lugar dos que saem, com total competência comprovada."

Para Falconi, o verdadeiro poder está em alinhar todas as pessoas de uma empresa numa só direção e com os mesmos interesses. Isso ocorre, segundo ele, com metas bem colocadas para todos, com uma equipe bem selecionada e treinada ao longo dos anos e uma cultura homogênea, voltada para o enfrentamento dos problemas - seja um "bom" problema, aquele cujo enfrentamento pode levar a uma melhoria, ou um problema "ruim", como parece ser o caso da Toyota: um produto que saiu das especificações ou uma máquina que deixou de funcionar. Como ensina o livro, os problemas ruins levam esse adjetivo porque não avisam hora para acontecer e precisam ser resolvidos imediatamente. "É impossível eliminá-los, mas dá para reduzi-los substancialmente."

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