quarta-feira, 6 de janeiro de 2010

Análise da compra da Casas Bahia vai demorar

SDE já pode receber manifestações de concorrentes e fornecedores

Juliano Basile e Claudia Facchini | De Brasília e São Paulo
06/01/2010
Texto: A-

A Secretaria de Direito Econômico (SDE) do Ministério da Justiça deu a largada para que concorrentes, fornecedores e clientes da Casas Bahia e do Pão de Açúcar se manifestem sobre a união entre as duas empresas. O negócio foi notificado às autoridades antitruste na véspera do Natal. A convocatória para manifestações de qualquer interessado na fusão foi publicada na edição de segunda-feira do "Diário Oficial".

A SDE definiu genericamente o mercado da operação como o de varejo de bens duráveis. Até ontem, não havia no Ministério da Justiça notícia de nenhuma empresa se opondo ao negócio.

Com a publicação no "Diário Oficial", o caso passou para a Secretaria de Acompanhamento Econômico (Seae) do Ministério da Fazenda, que fará o primeiro parecer sobre o assunto.

Antes de ser julgada pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), a compra da Casas Bahia terá de atravessar um longo caminho pelas autoridades do governo. O primeiro passo é justamente o parecer da Seae. Depois, o caso será encaminhado para a SDE. De lá, para o Cade.

No Cade, será feito um parecer da Procuradoria-Geral cujo objetivo é a análise dos aspectos jurídicos do negócio. Antes do julgamento, o Cade receberá parecer do Ministério Público Federal. De posse das avaliações, o conselheiro-relator do processo coloca o processo na pauta de julgamentos, o que pode levar pelo menos um ano.

A expectativa inicial é a de que a Seae terá na compra das Casas Bahia o seu processo mais trabalhoso. A secretaria sequer conseguiu definir um padrão de análise para um caso mais simples envolvendo a empresa: a compra da Romelsa.

A Romelsa é uma rede de móveis de Salvador que foi adquirida pelas Casas Bahia em junho do ano passado. A rede possui 17 lojas na capital baiana e em municípios vizinhos. O problema é que a Seae ainda não conseguiu definir se os impactos desse negócio devem ser calculados em cada cidade onde há lojas, nos bairros, ou mesmo levando em consideração o Estado como um todo.

Essa delimitação geográfica é importante para as autoridades antitruste saberem se terão de impor condições locais, como mandar vender determinada loja num bairro, ou num shopping center. No caso Pão de Açúcar/Casas Bahia, a secretaria terá de verificar esse impacto local em diversas regiões do Brasil. Terá de ver como se dá a concentração entre as lojas do Pão de Açúcar, da Casas Bahia, do Ponto Frio e do Extra em cada bairro e em cada shopping center.

"Esses casos são complicados porque as autoridades têm que definir a zona de influência de cada loja", afirmou o professor de economia da UFRJ Luiz Carlos Delorme Prado, ex-conselheiro do Cade.

Para ele, as vendas pela internet favorecem a aprovação do negócio. Prado acredita que um eventual aumento de preços de eletrodomésticos pelas companhias pode ser facilmente derrubado pelas rivais no varejo virtual . As concorrentes poderiam ofertar produtos semelhantes a preços melhores.

Porém, após quatro anos no Cade, Prado sabe que, mesmo com a competição via internet, não há como fugir da análise geográfica que envolve justamente o poder local de cada loja. "E essa análise é muito trabalhosa", completou.

Se o caso Romelsa está há seis meses sem um parecer final, a expectativa é a de que o caso Pão de Açúcar/Casas Bahia demore mais ainda. Advogados especialistas em direito concorrencial avaliam que são grandes os riscos de que a análise da aquisição da Casas Bahia pelo Grupo Pão de Açúcar se arraste por um ano ou mais na Seae devido à complexidade da operação.

A demora na aprovação do negócio seria prejudicial para o Pão de Açúcar pois pode retardar o processo de integração das operações das lojas da Casas Bahia e do Ponto Frio, que foi comprada pelo grupo em junho.

O Pão de Açúcar também vai transferir para a nova empresa que será criada a sua própria rede de eletroeletrônicos, o Extra Eletro. Como a consolidação dos negócios dependerá do sinal verde do Cade, o atraso na aprovação pode impedir os ganhos de sinergias previstos - para este ano, pelo menos.

Ainda não está claro também se as autoridades antitruste vão levar em conta o grau de competição nas principais categorias de produto comercializadas pelas Casas Bahia, Ponto Frio e pelo Grupo Pão de Açúcar, como televisores e eletrodomésticos. No caso dos televisores de LCD, por exemplo, o produto é vendido por lojas que não necessariamente oferecem geladeiras e fogões, como a Fnac e redes especializadas em informática.

O presidente da Confederação Nacional dos Dirigentes Lojistas (CNDL), Roque Pellizzaro, afirmou que a entidade vê com bons olhos a aquisição da Casas Bahia e do Ponto Frio pelo Grupo Pão de Açúcar. "A fusão entre empresas nacionais é a saída para enfrentar os concorrentes estrangeiros", afirma Pellizzaro. "O Walmart (multinacional americana) anunciou que vai abrir mais de 100 lojas no Brasil em 2010", argumenta o empresário. Segundo ele, diferentemente das indústrias, que trazem tecnologia para Brasil, as varejistas estrangeiras "apenas remetem recursos e deixam muito pouco no Brasil".

O presidente do Sindicato dos Comerciários de São Paulo, Ricardo Patah, afirmou que levará à SDE a preocupação com a manutenção dos empregos, não apenas pelo Pão de Açúcar, mas pelo comércio que está em volta das lojas. Há o temor de que os pequenos varejistas instalados nas proximidades não sobrevivam ao poder de barganha do novo grupo varejista.

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