segunda-feira, 7 de junho de 2010

O caminho para o sucesso é pavimentado com mentiras

Lucy Kellaway
07/06/2010

Recentemente, vi na exposição de flores Chelsea Flower Show o ex-primeiro-ministro britânico conversando com um ex-editor de jornal. Ele estava sorridente e parecia empolgado com o encontro casual. Mesmo assim, cinco minutos antes ele havia sido visto dizendo coisas depreciativas sobre o ex-editor e tentando se esconder atrás de um grande vaso de flores para evitar uma conversa com ele.

O que isso diz a respeito dos políticos? Que eles são falsos e fingidos? Ou que, no caso de Gordon Brown, ele tem o charme educado que nós exigimos das pessoas mais bem sucedidas? Outro dia, ouvi a psicóloga australiana Dorothy Rowe falando no rádio sobre seu novo livro, "Why We Lie" ("Por que mentimos"). Até mesmo as pequenas mentiras inofensivas, dizia ela, são motivadas pelo temor de prejudicarmos a ideia que fazemos de nós mesmos enquanto pessoas, e vão acabar nos pegando no final.

Isso é complicado demais para mim. Mentir certamente é algo provocado tanto pelo pragmatismo quanto pelo medo. Pela experiência que tenho pode ser algo bastante útil. E testes têm mostrado que nem sempre você se dará mal por mentir.

Na "Harvard Business Review" há um artigo declarando que as pessoas poderosas são mentirosas mais competentes. Pesquisadores da Columbia Business School pediram a chefes e funcionários de empresas que roubassem uma nota de US$ 100 e então convencessem alguém de que eles não a haviam roubado- no que os chefes se saíram muito melhor que seus subordinados.

No começo de maio, outro estudo foi publicado por psicólogos da Universidade de Toronto, mostrando que as crianças que começam a mentir aos dois anos de idade têm uma probabilidade maior de serem bem sucedidas quando se tornarem adultas. Mentir é um estágio importante do desenvolvimento: significa que você pode manter a verdade em algum canto de sua mente enquanto diz outra coisa ao mesmo tempo.

Juntas, essas duas pesquisas parecem pintar um quadro bastante assustador. Os mais espertos são alçados ao topo em uma onda de mentiras. E quando estão com o poder são impelidas a mentir cada vez mais. Antes de você se dar conta, o mundo estará sendo conduzido por pessoas como Kenneth Lay (ex-executivo-chefe da Enron) e banqueiros mentirosos da pior estirpe.

Mas eu não acho que elas provam isso. Existe a mentira extrema que é sempre ruim. Mas há também a modesta, que não é ruim; na verdade, ela é absolutamente essencial à vida nos escritórios. O que é preciso mais do que ser econômico com a verdade é ser sofisticado com ela. As pessoas que prosperam, como o ex-primeiro-ministro britânico, atingiram o estágio de desenvolvimento em que a pessoa sabe até onde pode contar histórias diversas a pessoas diferentes, ao mesmo tempo em que ainda se atêm (pelo menos é o que se espera) a uma certa essência de honestidade. É necessário saber quais tipos de mentiras prejudicam e quais ajudam; entender essa verdade é um conceito flexível, e ele deve ser moldado da melhor forma possível dependendo da ocasião.

Somente as pessoas muito estúpidas, aquelas muito grossas e as muito jovens, nunca mentem dessa maneira. Na série de TV britânica "Outnumbered", a jovem filha Karen é engraçada porque nunca mente. Quando ela abre a porta de casa para uma mulher que lhe tenta vender algo e é perguntada onde está seu pai, ela encara a mulher com ar angelical e diz: "Ele está no banheiro."

Às vezes você encontra adultos que não progrediram mais que essa criança. Na semana passada, dei de cara com uma pessoa que havia convidado para o coquetel de lançamento de meu livro e que não apareceu. Uma pena você não ter ido, disse eu. "Tinha muitas festas para ir naquele dia e achei que poderia faltar na sua", explicou a pessoa.

Essas pessoas que se agarram compulsivamente à verdade não duram mais que cinco minutos em uma organização. As repartições são mantidas unidas com mentiras. Nós fingimos que gostamos das pessoas com quem trabalhamos. Precisamos fingir que estamos satisfeitos com nossos empregos. Precisamos fingir que achamos nossa empresa melhor que a concorrente. Ao aceitar um lugar em qualquer hierarquia, você está se dobrando às pressões.

Portanto, quando um editor ansioso me pergunta: "Como está a coluna?" Eu respondo: "Quase pronta. Entrego a você às 18h." A primeira parte é uma mentira. A verdade é que perdi tempo e mal comecei a escrever a coluna. A outra parte é verdade. Prazos precisam ser cumpridos. Tenho orgulho de minhas mentiras. Orgulho de minha habilidade em ajustar meu comportamento de acordo com as circunstâncias, e espero ter passado esse dom para meus filhos.

Na semana passada, perguntei à minha filha de 17 anos quantas mentiras ela havia contado naquele dia. Nenhuma, respondeu ela. Fiquei preocupada, pensando se a própria resposta não seria uma mentira. Ou, pior ainda, será que ela não está desenvolvida o suficiente para aprender como mentir? Mas então parei para pensar e vi que eram apenas 8h, ela mal havia saído da cama e "nenhuma" foi o primeiro pronunciamento que ela fez naquele dia.

Lucy Kellaway é colunista do "Financial Times". Sua coluna é publicada às segundas-feiras na editoria de Carreira

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