terça-feira, 31 de maio de 2011

Custos em alta já influem no resultado das empresas

Gasto maior pressiona resultado
Levantamento mostra que pressão de custos e despesas reduziu margem operacional das companhias abertas, apesar do crescimento das vendas.

Marina Falcão e Fernando Torres - Valor Econômico - São Paulo
31/05/2011

A inflação nos custos de mão de obra e no preço das matérias-primas deixou as primeiras marcas nos balanços das empresas de capital aberto no Brasil no primeiro trimestre deste ano, o que pode ser um sinal de que ficou para trás o cenário cor-de-rosa visto até o fim de 2010, em que os números das grandes empresas pareciam imunes aos reveses da economia.

Levantamento realizado pelo Valor Data com dados das maiores companhias abertas do país mostra que embora as vendas continuem a aumentar de forma expressiva, com avanço de 16,1% na comparação entre o primeiro trimestre deste ano com o mesmo período de 2010, para R$ 181,96 bilhões, o lucro bruto subiu 10,7%, para R$ 53,31 bilhões, indicando que a pressão do lado dos gastos torna a vida dos gestores empresariais mais complicada.

A margem bruta, que é quanto sobra da receita após deduzidos os custos de produção, caiu 1,4 ponto percentual, para 29,3%. Embora aparentemente pequena, essa diferença representa R$ 2,6 bilhões a menos de lucro.

Contabilizadas as despesas gerais, com vendas e administrativas, o resultado operacional antes de juros e impostos teve alta de apenas 2,5% em relação a 2010, somando R$ 25,38 bilhões.

Como a despesa financeira líquida foi menos pesada entre janeiro e março deste ano, com ajuda do efeito da apreciação do real sobre as dívidas em moeda estrangeira, o lucro líquido cresceu mais do que o resultado operacional, com avanço de 12,1%, num total de R$ 14,75 bilhões.

O estudo foi feito com as 100 maiores empresas não financeiras do país, já com os dados no padrão internacional de contabilidade para os dois períodos.

Os dados acima excluem os resultados de Petrobras e Vale que, por conta do tamanho, distorcem algumas comparações. Ao colocar na conta os balanços das duas maiores empresas brasileiras, o cenário é melhor, especialmente por conta da disparada de 292% no lucro líquido da Vale.

Na amostra completa, o custo dos produtos e serviços cresce 18,1% na comparação com o primeiro trimestre de 2010, quase na mesma proporção da receita, que aumentou 18,2% no período, para R$ 259,75 bilhões.

Com isso, a margem bruta das companhias no conjunto se manteve praticamente estável, subindo apenas 0,1%.

O lucro líquido atribuído aos acionistas das 100 empresas somou R$ 37,03 bilhões, com alta de 55,8% na comparação anual. Antes do resultado financeiro e de impostos, o resultado 29,6%, para R$ 52,09 bilhões.

Para Pedro Martins, chefe da área de pesquisa do Bank of America Merrill Lynch, as margens operacionais (antes de juros, impostos, depreciação e amortização) das empresas dificilmente vão atingir neste ano o pico verificado no terceiro trimestre de 2010. Com base em dados do próprio banco, ele diz que as margens já caíram 2,5 pontos percentuais desde então, para 25,5%, e devem permanecer nesse nível até o fim de dezembro.

"Para as empresas exportadoras, a valorização do real frente ao dólar comprometeu a geração de caixa. Já as empresas mais focadas na economia doméstica sentiram o impacto da inflação no setor de serviços que pressionou o custo com funcionários", explica.

Com alta de 42% nos custos de produção e serviços, as empresas do setor de construção, por exemplo, tiveram a margem bruta reduzida de 32% para 28,5%.

No setor de siderurgia, que apresenta dificuldade para recompor os preços por conta da concorrência internacional e de estoques elevados, a margem bruta recuou de 25% para 19%.

No cenário de desaceleração que se desenha, Martins diz que o lucro líquido das companhias abertas deve crescer 17% este ano, depois de terem avançado 35% entre 2009 e 2010.

Renato Prado, analista da Fator Corretora para o setor de varejo e consumo, acredita que a diminuição do ritmo da economia brasileira vai aparecer com mais clareza nos resultados consolidados do segundo trimestre.

Segundo Prado, os diversos segmentos dentro de varejo apresentaram desempenhos bem diferentes no primeiro trimestre. Enquanto os setores de locação de veículos e de cigarros apresentaram resultados bastante fortes, os setores de vestuário e de cosméticos mostraram desempenhos abaixo do esperado. "Esses setores não conseguiram aumentar os preços para compensar a desaceleração no crescimento do volume de vendas. Com a restrição do crédito, o consumidor precisa fazer escolhas, e roupas e cosméticos são considerados itens mais supérfluos", explica.

A alta dos custos já começou a cobrar seu preço das companhias de capital aberto do país, um sinal de que o crescimento acelerado dos últimos meses talvez tenha chegado ao fim. As vendas das cem maiores empresas não financeiras com ações em bolsa continuaram crescendo no primeiro trimestre, em relação ao mesmo período do ano passado, mas o comportamento dos custos que incidem sobre essas vendas indica que não tem sido fácil a briga das empresas contra os aumentos das matérias-primas e mão de obra.

Os balanços compilados pelo Valor Data mostram uma receita líquida de R$ 259,7 bilhões, 18% acima do primeiro trimestre de 2010. No entanto, o efeito dos preços em alta fez com que a margem bruta - o quanto resta da receita após deduzidos os custos de produção - ficasse estagnada.

Se Petrobras e Vale forem tiradas da amostra, a situação fica ainda pior, com uma queda de 1,4 ponto percentual na margem, para 29,3%, uma diferença que representa R$ 2,6 bilhões a menos de lucro. Com o aperto, os resultados operacionais ficam também pressionados - o único alívio veio pelo lado financeiro, atenuado pela retração do dólar.

De acordo com Pedro Martins, chefe da área de pesquisa do Bank of America Merrill Lynch, as margens operacionais (antes de juros, impostos, depreciação e amortização) das empresas dificilmente vão atingir neste ano os picos verificados em 2010. "Para as empresas exportadoras, a valorização do real frente ao dólar comprometeu a geração de caixa. Já as empresas mais focadas na economia doméstica sentiram o impacto da inflação no setor de serviços, que pressionou os custos com funcionários", diz.

Depois de obter "um dos melhores resultados da história" no segundo semestre do ano passado, a tendência é de números mais modestos, na avaliação de Marco Melo, analista-chefe da corretora Ágora.

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