segunda-feira, 5 de julho de 2010

Globex tem R$ 600 milhões para expansão

Aporte do Pão de Açúcar para selar união com Casas Bahia será usado para ampliar rede de mil lojas

Daniele Madureira, de São Paulo
Valor Econômico
05/07/2010

Nos seis meses em que o Grupo Pão de Açúcar (GPA) e a Casas Bahia renegociaram a fusão das suas redes, muita coisa mudou no mapa do varejo nacional de móveis, eletroeletrônicos e eletrodomésticos. Surgiu a Máquina de Vendas, união de Ricardo Eletro com Insinuante, que acaba de englobar uma terceira rede, a City Lar, somando 750 lojas em 23 Estados e no Distrito Federal. Já a Lojas Americanas, que tem cerca de 20% das vendas na categoria eletro, aproxima-se da Casa & Video, que planeja faturar R$ 1,3 bilhão este ano no mercado fluminense. Para tirar o atraso, o Pão de Açúcar e a Casas Bahia prometem contra-atacar.

Para selar a fusão com a família Klein, controladora da Casas Bahia, o Pão de Açúcar precisou fazer um aporte de R$ 600 milhões na Globex, a nova empresa que vai unir os ativos das três redes - Ponto Frio, Extra Eletro e Casas Bahia. Esse valor não estava nos planos do GPA em um primeiro momento. "Para crescer, a Globex vai precisar de caixa de qualquer jeito", disse ao Valor um interlocutor que participou das negociações. "Há um plano agressivo de expansão de lojas e a nova empresa vai conseguir preços mais competitivos [na negociação com fornecedores]", diz.

As 518 lojas da Casas Bahia vão se somar às 436 do Ponto Frio e às 44 de Extra Eletro. Apenas a bandeira dessa última, restrita ao Estado de São Paulo, deve desaparecer. Ao todo, serão 998 pontos de venda presentes em 11 Estados e no Distrito Federal. As novas lojas deverão ser inauguradas como Ponto Frio e Casas Bahia, que em 2008 registraram um faturamento conjunto de R$ 18 bilhões. O tamanho confere à nova empresa uma liderança folgada em relação à segunda colocada, a Máquina de Vendas, que faturou com as suas três redes R$ 5 bilhões no ano passado.

O valor que precisou ser aportado pelo Pão de Açúcar representou menos da metade da geração de caixa anual do grupo, de R$ 1,5 bilhão. É consenso entre analistas que o GPA é uma empresa pouco alavancada, com espaço para endividamento. "Talvez o grupo precise se endividar um pouco no começo, mas nada que comprometa os seus resultados", diz a fonte.

Na Globex, o Pão de Açúcar aportou R$ 250 milhões em certificados de depósito bancário (CDBs) e R$ 350 milhões de créditos do grupo junto a empresas controladas ou subsidiárias. Também entraram na conta R$ 89,8 milhões que se referem ao valor contábil da rede Extra Eletro. Esse montante, porém, já estava previsto quando foi anunciado o primeiro acordo, em dezembro. O controle da Globex, onde foi injetado todo este capital de R$ 689,8 milhões, continua com o Pão de Açúcar, que elevou em dois pontos percentuais a sua participação - de 51% para 53%.

Os demais 47% estão com a família Klein, que aportou na empresa 100% dos ativos da Nova Casas Bahia - resultado da cisão da "antiga" Casas Bahia. A nova empresa reuniu todos os ativos operacionais que entram na fusão, somando R$ 1,47 bilhão. Na "velha" Casas Bahia, ficaram os imóveis das lojas e dos centros de distribuição (cujo aluguel para a Globex subiu de R$ 130 milhões para R$ 140 milhões) e 75% da fábrica de móveis Bartira (os demais 25% estão na Nova Casas Bahia). A Bartira tem contrato de exclusividade com a Globex.

Do lado do Pão de Açúcar, as redes Extra Eletro e Ponto Frio somaram cerca de R$ 1 bilhão em valor contábil, daí o aporte de R$ 689,8 milhões para o grupo obter 53% das ações da Globex. A disparidade do valor contábil dos ativos era um dos pontos que mais incomodavam a família Klein. Na primeira negociação, a Casas Bahia considerou que seus ativos haviam sido mal avaliados: o valor contábil da empresa era de R$ 2,7 bilhões, mas foi equiparado ao valor de bolsa do Ponto Frio, de R$ 1,3 bilhão.

Na nova conta, a família Klein deve ficar com uma parcela maior dos recebíveis. O valor do previsto no primeiro contrato, de R$ 1,067 bilhão, será acrescido de R$ 100 milhões a R$ 150 milhões ao ano.

A família também conseguiu elevar a sua participação direta na Nova.com, como foi chamada a empresa de comércio eletrônico que reúne a venda on-line das três redes, a operação de atacado (B2B) do Ponto Frio e uma empresa de soluções de e-commerce, a e-Hub. Na nova configuração, em que a Globex é majoritária da Nova.com, a família detém 24% das ações da empresa (contra 17% na versão anterior). "Os Klein temiam a concorrência predatória da loja on-line com os seus pontos da rede física", diz outra fonte. A direção da Nova.com continua com os executivos Eduardo Chalita e German Quiroga, entre outros, que vieram da Americanas.com.

Garantir liquidez à Globex era uma das preocupações dos Klein para garantir aos acionistas uma "porta de saída". Pelo novo acordo, tanto a família quanto o Pão de Açúcar precisam manter as ações (lock-up) por dois anos. Mas a partir do 11º mês será possível fazer uma oferta pública (primária e secundária) de ações da Globex, que deve atingir um mínimo de 20% de free float dentro de seis anos. A governança, outro ponto em aberto, não mudou muito em relação à primeira versão. Os Klein terão direito veto em questões como aquisição, conferido a minoritários.

"Eu e o Raphael [Klein] estamos loucos para que termine logo o call e a gente possa trabalhar na integração (...) e correr atrás do tempo perdido", disse na sexta-feira o presidente do Pão de Açúcar, Enéas Pestana, durante teleconferência com analistas de mercado para explicar os novos termos da fusão. Na ocasião, estavam presentes o presidente do conselho do Pão de Açúcar, Abilio Diniz, e o presidente da Globex, Raphael Klein - neto de Samuel Klein, fundador da Casas Bahia, e responsável por ir buscar na tarde de quinta-feira a assinatura do avô, em Angra dos Reis (RJ), para consolidar o negócio.

Tanto na nova quanto na "velha" Casas Bahia, Samuel Klein detém mais de 50% do controle. Mas o ex-mascate que nos anos 50 começou a maior rede de eletromóvel do país não está presente no organograma da Globex. Pelo menos não oficialmente.

No alvo, redes regionais de alimentos

Crescer em alimentos deve ser a meta do Grupo Pão de Açúcar de agora em diante. Especialmente no Nordeste e no Sul do país, áreas em que as suas bandeiras não têm forte presença. "Faz mais sentido neste momento reforçar a presença no varejo alimentar, uma vez que a liderança em móveis e eletroeletrônicos está consolidada, depois do novo acordo com a Casas Bahia", diz um especialista que assessora o grupo de Abilio Diniz.

Na opinião de uma fonte do setor supermercadista, o movimento faria sentido para barrar a expansão do Walmart. O grupo americano garantiu espaço no Nordeste e no Sul do país com a compra das redes Bom Preço e Sonae, respectivamente. "Há redes importantes que estão nas mãos de famílias nessas regiões", diz a fonte.

Entre elas, o Yamada, do Pará, o Grupo Mateus, do Maranhão, o Grupo Carvalho, do Piauí, o Bonanza Supermercados, de Pernambuco, e o Nordestão, no Rio Grande do Norte. Já no sul as opções seriam as gaúchas Zaffari e Unidão Supermercados, e os catarinenses Grupo Angeloni e Supermercados Imperatriz. "Nos anos 80, o Pão de Açúcar vendeu suas lojas em Santa Catarina, onde não teve sucesso", diz a fonte. "Para os supermercadistas em geral, é mais fácil explorar o Nordeste, chegando a um novo consumidor, do que tentar o Sul, mercado já consolidado, em que a concorrência é mais pesada", diz. No varejo alimentício, o Pão de Açúcar está em oito Estados e no Distrito Federal. No Sul, tem lojas só no Paraná.

Durante o GPA Day, encontro dos diretores do grupo com analistas e investidores, em maio, o presidente do GPA, Enéas Pestana, demonstrou interesse em reforçar a presença da empresa em alimentos. Citou o canal de "atacarejo", onde tem a bandeira Assai. "O atacarejo é a forma mais barata de expansão em varejo alimentício, porque requer menos investimentos", diz uma fonte.

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