Betania Tanure é doutora, professora da PUC Minas e consultora
15/10/2010
Os programas de "coach" estão na ordem do dia. Eles aparecem no vocabulário da maioria dos executivos e nos programas de desenvolvimento de grandes e bem-sucedidas empresas brasileiras. Mas o que, afinal, se esconde por trás da proliferação dessa e de outras estratégias semelhantes de desenvolvimento individual, que aqui denominaremos genericamente de "coach"?
Por um lado, a carência de líderes para os projetos de crescimento das organizações é evidente, como resultado da falta de investimento sistemático em gente e da interrupção de estratégias e políticas de desenvolvimento humano.
O pensamento geral é que desenvolver líderes e "revitalizar as pessoas" significa mudar a atitude de cada um. Mas como ficamos quando ações individuais não resolvem? Todos devem ter um "coach"? A solução desse dilema, na verdade, está em reconhecer que é possível mudar comportamentos sem necessariamente alterar atitudes básicas. Esse desafio tem total relação com o contexto criado pelos executivos em torno das pessoas e, portanto, com a cultura da empresa.
Existem ainda, essencialmente, no ambiente interno - ou seja, na cultura- da maioria das empresas brasileiras cinco aspectos que comprometem o desenvolvimento dos líderes e dos dirigentes, por maior que seja o número de ações de treinamento ou de programas de "coach".
Um desses aspectos é a limitação. Os dirigentes tomam todas as decisões na empresa, assumindo um estilo autoritário-paternalista. Ao fazer isso, acabam limitando a iniciativa própria dos funcionários, bem como a criatividade e o raciocínio de muitos deles.
Outro é a obediência. Criam-se vários tipos de sistema: de recursos humanos, de planejamento, orçamentário... Cada um deles tem sua justificativa para existir, mas coletivamente eles geram nos funcionários a sensação de obediência.
O controle é a terceira característica. O chefe e toda a infraestrutura gerencial existem para controlar os indivíduos e assegurar que eles não façam coisas erradas.
Há ainda o contrato. Na maioria das empresas, todas as relações são reguladas por contratos: o emprego (contrato entre a empresa e o funcionário), o orçamento, assim como o relacionamento entre colegas, departamentos e divisões.
Os resultados econômico-financeiros representam o último aspecto. São eles, basicamente, que orientam boa parte das empresas, funcionando como motor da performance e sendo, portanto, a principal ferramenta de avaliação dessa performance.
Em um ambiente movido por essas cinco forças, provavelmente os programas de "coach" terão alguma efetividade para acalmar a consciência do topo ou das áreas de recursos humanos, mas dificilmente terão um efeito real na vitalização e revitalização das pessoas e no desenvolvimento sistemático de líderes. Para que esse processo floresça, é preciso fazer movimentos de outra natureza.
Contra a limitação deve-se cultivar a ambição. Com isso, cada indivíduo vai procurar dar o melhor de si em tudo o que realizar e levará os que estão ao seu redor a fazer o mesmo.
Também é preciso ir da obediência para a disciplina. As pessoas obedecem a algo que vem de fora; já a disciplina é interna, incutida no comportamento cotidiano dos indivíduos e em todos os processos de gestão.
A terceira mudança é a substituição do controle pelo apoio, como se vê em empresas de alto desempenho. Com isso, os funcionários passam a acreditar que seus chefes - e não indivíduos de fora, terceirizados - existem para apoiá-los e orientá-los por meio do monitoramento pessoal e do acesso aos recursos da organização.
O próximo desafio é passar do contrato à confiança. A verdadeira sensação de confiança se traduz em: "Somos parte da mesma organização". As pessoas têm de sentir que a empresa é justa em seu modo de conduzir os processos. Se isso ocorre, ela pode contar com o comprometimento maior da equipe.
Finalmente, deve haver a ampliação do significado de boa performance, que se traduz em resultados empresariais. Nas organizações em que predomina o conceito de resultados econômico-financeiros, o desenvolvimento de líderes e a revitalização de pessoas estará no discurso, nas palestras, na terceirização de responsabilidades de desenvolvimento, mas não na prática cotidiana.
Ferramentas como o "coach" são importantes e efetivas para situações ou casos específicos. Mas esse não é o modelo mais adequado para a formação sistemática de líderes - tarefa que tem de estar atrelada à cultura e depende da decisão vigorosa dos dirigentes. O desenvolvimento não é uma atividade isolada e terceirizada. Em vez disso, pede ação contínua e precisa estar na alma da empresa. Ele está, de fato, na sua alma?
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