segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Contratos que impedem executivos de atuar na concorrência ganham força

Com o aumento da disputa por talentos no mercado de trabalho, aumenta a preocupação das companhias em preservar as informações confidenciais e estratégicas do negócio.

Contratos que impedem executivos de atuar na concorrência ganham força
Por Vívian Soares - de São Paulo

A advogada Adriana Calvo diz que prática não é regulamentada e se baseia nas experiências de outros paísesO aquecimento do mercado e a movimentação de executivos têm aumentado a preocupação das empresas com a segurança de suas informações estratégicas. No alto escalão, tem ganhado força a inclusão de cláusulas no contrato de trabalho em que o executivo se compromete a não trabalhar em uma concorrente direta por um determinado período.

Apesar de não estar contemplada na CLT, a chamada cláusula de não concorrência tem sido considerada válida pela Justiça do Trabalho e é bem vista por especialistas da área, desde que tenha critérios de compensação do profissional pelo tempo em que ficará fora do seu segmento de atuação. Na visão dos executivos, porém, ela desperta desconfiança: o medo de "enterrar" a carreira é frequente e a estratégia pode ser entendida como coerciva por parte do empregador.

A cláusula começou a aparecer com mais frequência no Brasil com o aumento da vinda de executivos expatriados. De acordo com a advogada trabalhista Adriana Calvo, é comum a sua exigência em contratos de empresas americanas e europeias. "Como não está regulamentada, esta prática tem base no direito comparado, levando em conta as experiências de outros países."

Segundo a advogada, esse tipo de acordo não era considerado válido pela Justiça, mas se popularizou graças a medidas de proteção tomadas pelas empresas. Os requisitos mais comuns para que o contrato seja visto como legal são a duração compatível com o período em que o executivo permaneceu na empresa e a indenização sobre o tempo em que ele é impedido de trabalhar. Segundo Adriana, o valor normalmente equivale ao salário do executivo e ao tempo em que ele fica fora do mercado. Caso quebre a quarentena, o profissional deverá pagar uma multa.

De acordo com Cláudio Garcia, presidente da consultoria DBM, pagar indenização durante o período em que o profissional está impedido de atuar na concorrência não é a maior preocupação das empresas. Segundo ele, a prioridade é preservar as informações da companhia, principalmente em áreas de segredos industriais, patentes e no segmento financeiro. "Existe também o receio de perder talentos para o concorrente", diz.

Marcelo Braga, sócio da empresa de recrutamento Search, ressalta que as áreas de pesquisa e desenvolvimento, marketing e comercial são as mais sensíveis nesse processo. "O executivo muitas vezes leva sua carteira de clientes para a nova companhia e tenta desenvolver negócios com os antigos parceiros. Como são áreas ligadas a relacionamento, o risco é maior", afirma.

A existência do contrato de não concorrência, porém, pode não intimidar as empresas que buscam um profissional de destaque. Segundo Garcia, da DBM, muitas concorrentes aceitam pagar a multa rescisória para atrair executivos de destaque. Mas essa contratação pode ser arriscada. "Um executivo que revele informações confidenciais da antiga empresa pode comprometer a relação de confiança com o mercado."

Na opinião de Braga, da Search, as concorrentes têm em vista não os segredos das empresas, mas as habilidades do profissional. "Elas querem alguém que conheça o negócio e o mercado, não um espião com informações privilegiadas", diz.

A necessidade das empresas de proteger suas informações pode gerar cláusulas com itens abusivos como afastamento do executivo do mercado por um tempo excessivo e não pagamento de indenização. O tema é tão controverso que, por medo de prejudicarem a carreira, os executivos entrevistados pelo Valor não quiseram se identificar ao contar suas experiências no assunto.

É o caso de um profissional de média gerência que ficou três anos desempregado depois de cumprir a cláusula de não concorrência. Após trabalhar durante sete anos em uma indústria química, ele foi demitido em uma reestruturação e foi obrigado a ficar seis meses sem atuar nas concorrentes. Mesmo recebendo uma indenização equivalente ao seu salário, o executivo encontrou dificuldades para voltar ao trabalho após o fim da quarentena. "Eu era extremamente especializado no meu setor e fiquei tempo demais longe da área", afirma.

Desempregado desde 2007, o executivo conseguiu voltar ao mercado somente este ano, com a ajuda de um MBA que atualizou seu currículo. Atualmente, trabalha como gerente comercial em uma indústria química.

Uma gerente de inteligência de mercado conta que, este ano, a empresa em que trabalha pediu para que os funcionários assinassem uma cláusula que impedia a atuação em concorrentes por dez anos. "O contrato não explicitava quem eram os concorrentes e não previa nenhum tipo de indenização. Se eu aceitasse, seria uma aposentadoria precoce e não remunerada", conta.

A executiva se negou a assinar o documento e propôs um novo modelo de contrato, em que o prazo de quarentena diminuísse para seis meses, mediante pagamento de indenização equivalente ao salário. A empresa desistiu da cláusula, mas o relacionamento com os chefes mudou. "Perdi projetos importantes e não vou mais sozinha para nenhum cliente", afirma.

A advogada trabalhista Adriana Calvo conta que, quando é comprovado o abuso, esse tipo de acordo é invalidado na Justiça. Ela cita o caso de um executivo que, após trabalhar 21 anos em uma empresa, foi coagido a assinar uma revisão de seu contrato de trabalho que continha a cláusula de não concorrência sem indenização. Três meses depois, o profissional foi demitido. O documento previa que ele ficasse dois anos sem atuar na concorrência. "A empresa mandou cópias do contrato para as três principais companhias do setor, que não o procuraram por medo da multa", conta a advogada.

Após recorrer à Justiça, o executivo teve a cláusula de seu contrato considerada ilegal.

O aumento das cláusulas de não concorrência nos contratos de altos executivos envolve, além da questão legal, a discussão sobre a ética de mercado. Na opinião dos especialistas, o bom senso sempre deve ser observado no momento em que se considera desobedecer a quarentena, mesmo sob pagamento de multa. Até quando a cláusula não existe, mudar para o concorrente e levar informações estratégicas é arriscado - o profissional pode ter a reputação manchada entre colegas e empresas do setor.

Para Adriana Calvo, advogada trabalhista, a cláusula de não concorrência está se tornando tão rotineira que os próprios executivos manifestam interesse por incluí-la no contrato. O objetivo é deixar a relação com a empresa mais ética e transparente, discutindo itens que podem ser vantajosos para ambas as partes. "Se o profissional vai ter acesso a informações confidenciais, é melhor perguntar se a empresa tem essa política". Segundo ela, é importante conversar sobre o tema no momento da contratação.

De acordo com Marcelo Braga, sócio da Search, quando o acordo envolve entendimento de ambas as partes, ele não deve ser quebrado. Mesmo quando a cláusula não está contemplada no contrato, é necessário estar atento. "Na nova empresa, o executivo precisa tomar decisões baseadas no conhecimento que acumulou, mas sem abrir informações confidenciais. É um limite ético que precisa ser observado o tempo todo", diz.

Cláudio Garcia, presidente da consultoria DBM, acredita que a mudança para a concorrência deve ser vista com naturalidade, mas que é importante ter em vista a mensagem que se vai passar para o mercado. "O lado mais fraco geralmente é o do profissional", afirma.

Um comentário:

  1. Eu era sócio de uma empresa, e vendi minha parte. Meu sócio, sob contrato, me impediu de atuar no mesmo segmento por 5 anos na cidade onde moro e nas rendondezas. Mas não há nenhuma cláusula que prevê o pagamento de valor de indenização por todo este tempo que não poderei atuar. Recebi apenas o valor da minha parte na empresa. Ele me impede de desenvolver, analisar e elaborar softwares. Porém, há uma cláusula anterior que diz que concordo que nunca fiz este tipo de coisa na empresa. Então porque não posso fazer algo que lá nunca fiz, já que está no contrato? Como fica meu caso?

    Provavelmente ele não quis pagar o valor pela ajuda no desenvolvimento do mesmo, na co-autoria. E ainda quer tirar meu direito de trabalhar no que sei, não pagando por isto.

    Se puder me inforar alguma coisa...

    Marco Borges
    marcoborges.f1@gmail.com

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